Aglomerados de Galáxias (continuação)
Com base no livro de Peter Schneider
Profa. Thaisa Storchi Bergmann
Classificação morfológica
Embora hajam várias classificações, as que têm algum sentido físico são, por exemplo, a classificação de regular e irregular, havendo também os intermediários.
Diferenças físicas
Os regulares são mais compactos e mais simétricos, com densidade central alta, são dominados por galáxias early-type, e muitas vezes têm uma galáxia gigante cD no centro e têm mais galáxias.
Os irregulares são mais dispersos e assimétricos, apresentando por vezes subestruturas; não têm um centro muito denso, têm menos galáxias e dentre elas a proporção de galáxias espirais (late-type) é quase a mesma que em galáxias do “campo”.
Podemos dizer que os aglomerados regulares estão num estado “relaxado” (“termalizado”), enquanto que os irregulares ainda estão evoluindo
Distribuição espacial de galáxias num aglomerado regular
Aproximando a distribuição de galáxias como centro esfericamente simétrica, a densidade numérica de galáxias projetada no céu N(R) se relaciona com a densidade tri-dimensional através de:
(1)
onde:
(2)
é o raio tri-dimensional, e:
(3)
A função N(R) não é contínua, pois são galáxias individuais que são “contadas” e para obter uma função é preciso “suavizar” as contagens. Alternativamente, utiliza-se formas parametrizadas, ajustando os parâmetros à distribuição observada. Em geral, 5 parâmetros são necessários: 2 para descrever a posição do centro do aglomerado no céu; 1 para descrever a amplitude da densidade, em geral a densidade central N(0); 1 para caracterizar uma escala característica, em geral o raio de core rc, definido de forma que para R = rc, N(rc) = N(0) / 2; e finalmente o último descreve onde termina o aglomerado (por exemplo o raio de Abell).
Distribuição isotérmica de galáxias num aglomerado
Esta distribuição considera que a distribuição de velocidades das galáxias (ou das partículas de matéria escura) é maxweliana, ou seja, as partículas (galáxias) estão “termalizadas”. Assumindo que o perfil de massa corresponde ao perfil observado da distribuição de galáxias e que a “temperatura” ou dispersão de velocidades não depende do raio, temos então uma “esfera isotérmica”. Assumindo equilíbrio dinâmico, a pressão é contrabalançada pela gravidade:
(4)
Diferenciando a primeira equação:
(5)
Relação entre pressão e densidade:
(6)
Relação entre temperatura e dispersão de velocidades das partículas:
(7)
Onde <v2> é a velocidade quadrática média, que é igual à dispersão de velocidade (ao quadrado) desde que a velocidade média seja zero (o que deve ocorrer se o aglomerado não está rotando, ou contraindo ou em expansão). Assumindo que T e <v2> não dependem de r:
(8)
onde:
(9)
é a dispersão de velocidades (ao quadrado) unidimensional, que é 1/3 da dispersão de velocidades tridimensional, o que vale se a distribuição de velocidades é isotrópica (maxweliana).
Substituindo dP/dr na equação diferencial acima:
(10)
Soluções da equação acima:
Exercício 2.9: (a) Mostre que a expressão analítica abaixo para a densidade é uma solução da equação acima. Esta solução é chamada de “Solução Isotérmica Singular” porque ela diverge para r tendendo a zero e uma massa total tendendo ao infinito, já que resulta em M(r) proporcional a r. (b) Mostre que esta solução para a densidade leva a uma curva de rotação plana para galáxias para raios grandes.
(11)
Se adotarmos como condição de contorno que ρ(0) = ρ0 (finita), e que a derivada da densidade para r = 0 é nula, de forma que o perfil de densidade seja plano no centro (“flat core”), resulta que:
(12)
Então seria uma solução que não diverge para r = 0, mas ainda leva a uma massa total que diverge porque ρ é ainda proporcional a r-2 e M(r) continua proporcional a r.
Modelos de King
Modelos dinâmicos de estruturas auto gravitantes mas cuja massa total não diverge. Aproximação analítica para a densidade da região central:
(13)
Exercício 2.10: Mostre que a densidade superficial resultante dessa densidade espacial fica:
(14)
onde:
(15)
Um valor típico de rc é 0.25 h-1 Mpc.
Massa dinâmica dos aglomerados
Exercício 2.11: Mostre que a escala de tempo dinâmico, que é o tempo necessário para uma galáxia atravessar o aglomerado tcross ~ RA/σv ~ 1.5 h-1 x 109 anos para uma velocidade típica de 1000 km/s.
Como esta escala de tempo é menor que a idade do Universo, se conclui que os aglomerados são estruturas ligadas gravitacionalmente, e devem estar em equilíbrio virial.
Então:
(16)
Onde o fator 1/2 na expressão da energia potencial se deve ao fato de que cada par de galáxias aparece duas vezes no somatório.
Define-se a massa total do aglomerado como:
(17)
E a dispersão de velocidades pesada pela massa:
(18)
E o raio gravitacional:
(19)
Exercício 2.12: Mostre que com estas definições, resulta:
(20)
Usando o teorema do virial, resulta:
(21)
Efeitos de projeção
As quantidades acima são tridimensionais, mas não temos acesso a elas, somete às suas projeções. Se a distribuição de velocidades é isotrópica, podemos usar:
(22)
(Se considerarmos que o RG é uma projeção do rG, através de um cosseno, resulta que o valor médio do cosseno é 2/π)
(23)
onde Rij é a separação entre as galáxias projetada no plano do céu.
Assim, o valor da massa do aglomerado, a partir de observáveis fica:
(24)
Exercício 2.13: Demonstre a expressão acima.
Note que a espressão acima não depende da massa individual das galáxias!
O problema da “Massa Faltante” dos aglomerados de galáxias
A partir dos valores de massa obtidos a partir da dispersão de velocidades, RG e luminosidade das galáxias observados, c resulta tipicamente:
(25)
que é muito alto, excedendo a razão M/L de galáxias early-type por pelo menos um fator 10. Fritz Zwicky já se dado conta disso em 1933. Atualmente sabemos que as estrelas visíveis contribuem com menos de 5% da massa total de aglomerados de galáxias.
Colisões entre galáxias num aglomerado
Exercício 2.14: Demonstre que colisões entre galáxias não são importantes num aglomerado. Assim, o movimento das galáxias dentro do aglomerado é governado pelo potencial gravitacional coletivo do mesmo (ver pág. 235 do livro).
Exercício 2.15: Descreva os processos de relaxação violenta (que leva ao equilíbrio virial) e de fricção dinâmica com base na discussão da pág. 25 do livro.
A fricção dinâmica causa uma segregação de massas na distribuição de galáxias nos aglomerados, de forma que as mais massivas tendem a “cair” para o centro do aglomerado podendo sofrer “mergers” dando origem a galáxias cD.
Também pode haver remoção de estrelas e mais frequentemente do meio interestelar, dando origem a nuvens de gás extragalácticas, como observadas no Aglomerado de Virgem. a partir da emissão em 21cm.
A relação morfologia x densidade
70% das galáxias de campo são espirais, enquanto que nos aglomerados de galáxias dominam as galáxias early-type. Além disso, a segregação e “striping” do gás faz com que as espirais encontradas em aglomerados estejam mais para as bordas do aglomerado.
Resultados do SDSS (Sloan Digital Sky Survey)
Mencionados na aula anterior (ver figuras lá)
Fração de galáxias de diferentes classes (early-type E, intermediate type -S0, early disc -Sa, late disc -Sc) em função da densidade superficial de galáxias: as duas primeiras crescem, a terceira fica constante e a última diminui.
Galáxias E+A: Linhas de absorção da série de Balmer do H intensas, características de estrelas tipo A, ou uma população estelar de idade ~1 Gano, superposta a uma população velha característica de galáxias elípticas.Também são chamadas de galáxias “post-starburst”. Foram primeiramente vistas em aglomerados de galáxias, e assim a primeira interpretação é que seriam galáxias em que um starburst teria sido interrompido abruptamente por ter o meio interestelar sido arrancado por interação dentro do aglomerado. Depois foram vistas em outros ambientes, e parecem estar relacionadas com uma interação com uma galáxia vizinha próxima (distância menor do que ~100kpc).
Galáxias espirais em aglomerados: apresentam em média menor taxa de formação estelar do que galáxias no campo.