Buracos negros

Autores:

Thaisa Storchi Bergmann
Fausto Kuhn Berenguer Barbosa
Rodrigo S. Nemmen
Leonardo Sehn Alves

Atualizado em: 22/07/2011

No Universo, observamos galáxias, como a abaixo, emitindo espetaculares quantidades de energia.

Imagem ótica (em branco) da galáxia 3C219 superposta ao seu mapa rádio (em vermelho)

Dimensões:
No ótico: mais extensa do que a Via Láctea ~ 100 000 anos-luz
Em rádio: ~ 1 milhão anos-luz!

Distância:
z = 0.1745
v = 0.16 c
D = 500 Mpc ou ~ 3 x 500 x 106 a.l. ou ~ 1.5 bilhões a.l.

O que causa esta emissão de energia? Dentre os possíveis mecanismos propostos, o único aparentemente viável é a transformação da energia gravitacional da acresção de matéria a um buraco negro central supermassivo.

Concepção artística de um disco de acresção alimentando um buraco negro central e produzindo jatos

Conteúdo

  1. Definição Geral
    1. Buracos Negros de Schwarzschild
    2. Buracos Negros de Kerr
    3. Buraco Negro Carregado
  2. Efeitos Gravitacionais dos BNs
    1. Velocidade de Escape
    2. O Raio de Schwarzschild
    3. O Horizonte de Eventos
    4. O Raio de Maré
    5. Distorção do Espaço
  3. Efeito dos BNs Sobre a Radiação
    1. A Esfera de Fótons
    2. O Desvio para o Vermelho (redshift) causado pelo Campo Gravitacional
  4. Discos de Acreção
  5. Como encontrar Buracos Negros
  6. Tipos de Buracos Negros
    1. Estelares
    2. Supermassivos
    3. Intermediários
    4. Primordiais
  7. Buracos Negros Estelares
    1. Como se formam
    2. Evidências Observacionais de Buracos Negros Estelares
    3. Gamma Ray Burst
  8. Buracos Negros Supermassivos
  9. Buracos Negros em Núcleos de Galáxias Ativas
    1. Tipos de AGN
    2. Radiação emitia em AGNs
    3. Modelo Unificado em AGNs
    4. Evidências Observacionais de Buracos Negros Supermassivos nas AGNs
    5. Massa de Buracos Negros e a Luminosidade de Eddington
  10. NGC 1097
  11. Notícias
  12. Bibliografia

1. Definição Geral

Quando um corpo não possui mais pressão suficiente para produzir uma força para fora que contrabalance o peso de suas camadas externas (Fig.1.1), o corpo colapsa matematicamente a um ponto! Este ponto é chamado de singularidade, onde a densidade tende ao infinito. O campo gravitacional é tão forte que nem mesmo a luz é capaz de escapar e por isso tal corpo é chamado de Buraco Negro (BN).

Fig. 1.1 – Forças internas se equilibrando
(em uma estrela).

Assim sendo, o nome “Buraco Negro” é devido ao fato de ele não emitir radiação e não por uma coloração escura.

Um conceito equivocado é de que um BN suga a matéria ao seu redor. Isto somente acontece se a matéria chegar muito próxima ao BN, a uma distância menor do que o seu raio de maré (seção 2.4). Neste sentido o nome Buraco Negro transmite o conceito corretamente, pois não vemos buracos sugando as coisas. Entretanto, tudo que é atirado contra ele fica retido em seu interior e é irrecuperável.

Características fascinantes dos BNs são fenômenos físicos extremos – preditos na relatividade geral – observados, na natureza, devido ao forte campo gravitacional, como distorções do tempo e do espaço ao seu redor. Embora existam muitos aspectos que diferenciem BNs de corpos normais, eles possuem algumas propriedades que muitos corpos celestes possuem, como: massa, carga elétrica e momentum angular.

Desconsiderando a carga elétrica, os Buracos Negros podem ser descritos por dois tipos de modelos: de Schwarzschild e de Kerr.

1.1 – Buracos Negros de Schwarzschild

Esse é o modelo mais simples, por não considerar rotação, sendo caracterizado somente pela massa, a singularidade central e o horizonte de eventos (seção 2.3).

Fig. 4.5 – Representação da “estrutura” de um BN de Schwarzschild.

O BN de Schwarzschild tem este nome porque sua teoria foi desenvolvida pelo astrofísico alemão Karl Schwarzschild na hipótese de ausência de rotação. Alguns indícios (indiretos) da presença ou não de rotação em um buraco negro podem ser observados. No caso de buracos negros supermassivos, a potência dos jatos emanados do núcleo de galáxias ativas pode ser usada como um indicador de rotação, uma vez que ela é muito maior para buracos negros em rotação.

1.2 – Buracos Negros de Kerr

São assim chamados pelo fato de que a teoria que os descrevem (uma solução das equações de Einstein da Relatividade Geral) ter sido desenvolvida pelo matemático Roy Patrick Kerr, e a diferença em relação ao buraco negro de Schwarschild é o fato de apresentar rotação. Como a rotação deve ser comum na matéria que colapsa para formar um Buraco Negro pela conservação de momento angular, é provável que a maioria dos BNs apresente rotação. Além da singularidade e do horizonte de eventos, é caracterizado pela presença da ergosfera, região que circunda o horizonte de eventos, em que o espaço é arrastado pela rotação do BN. É possível extrair energia da ergosfera, como acontece com jatos emitidos por BNs supermassivos, que são gerados nas bordas internas do disco de acreção que podem estar já dentro da ergosfera.

Fig. 4.6 – Buraco Negro de Kerr, caracterizado pela massa e pelo spin (demonstrado em laranja).
Fig. 4.6 – Buraco Negro de Kerr, caracterizado pela massa e pelo spin (demonstrado em laranja).

Finalmente, há modelos de BNs que consideram a presença de carga elétrica:

1.3 – Buraco negro carregado

Este modelo de Buraco Negro foi obtido a partir da solução das Equações de Einstein da Relatividade Geral pelos físicos Hans Reissner e Gunnar Nordström. Não leva em consideração a rotação mas considera o colapso de um objeto eletricamente carregado. Mais tarde, foi teorizado o modelo de Buraco Negro Kerr-Newman. Esse buraco negro possui, além da carga elétrica, momentum angular, como é o caso do Buraco negro de Kerr, descrito acima. Devido à enorme velocidade rotacional do buraco negro e ao fato deste ser eletricamente carregado, um intenso campo magnético é gerado, que é responsável por causar uma ruptura no horizonte de eventos, criando dois horizontes de eventos e entre eles um fluxo de matéria intenso que, devido a sua interação violenta, expulsa fótons na forma de raios gama.


2. Efeitos Gravitacionais dos Buracos Negros

2.1 – Velocidade de Escape

Para que um corpo de massa m1 escape do campo gravitacional de um corpo de massa m2, estando a uma distância R do centro deste corpo, a sua energia cinética deve atingir ou superar sua energia potencial:

(1)   \begin{equation*}  \setlength{\jot}{10pt} \begin{gathered}    \frac{1}{2}m_1v_e^2=\frac{m_1m_2G}{R} \\    v_e=\sqrt{\frac{2Gm_2}{R}} \end{gathered} \end{equation*}

onde ve é a velocidade de escape e G é a constante gravitacional. Veja abaixo o valor da velocidade de escape para alguns corpos conhecidos:

  • Para a superfície da Terra ve = 11,2 km/s
  • Para a Lua ve = 2,4 km/s
  • Para o Sol ve = 618 km/s
  • Para uma estrela de nêutrons ve = 0,5c onde c = 300.000 km/s (a velocidade da luz)

2.2 – O Raio de Schwarzschild

Partindo da equação 1, que define a velocidade de escape, podemos impor a condição para que nem a luz escape de um corpo de massa m2. Isolando o raio R, e substituindo ve por c, obtemos uma distância ao corpo de massa m2 para a qual nem a luz consegue escapar. Essa distância é denominada Raio de Schwarzschild:

(2)   \begin{equation*}     R_{sch}=\frac{2Gm_2}{c^2} \end{equation*}

Obs.: Embora a derivação do raio de Schwarzschild pela mecânica newtoniana dê o valor correto, uma derivação rigorosa deve ser feita utilizando a teoria da Relatividade Geral.

2.3 – O Horizonte de Eventos

O raio de Schwarzschild caracteriza uma região limite, que é o horizonte de eventos, a partir da qual nada consegue escapar, por isto sem comunicação com o meio externo. Todo corpo que for comprimido a um raio menor do que o do seu horizonte de eventos (RSch) vai colapsar a um ponto no qual a densidade é infinita (singularidade). Esta é possivelmente a melhor definição de um Buraco Negro.

Como o raio de Schwarzschild depende apenas da massa, sendo proporcional à ela; é fácil calcular seu valor para corpos de massa conhecida:

Se para um corpo com a massa do Sol (Mʘ) RSch = 3 km, então para um corpo com 2 vezes a massa do Sol Mʘ RSch = 6 km. Para a Terra, RSch = 8.9 mm e para o buraco negro supermassivo no centro da galáxia RSch fica entre 10 e 15 milhões de km.

Esta simulação ilustra o que acontece ao horizonte de eventos quando ocorre uma colisão entre dois buracos negros iguais. (159 k).

O desparecimento de matéria através do horizonte de eventos foi observado com o telescópio espacial Hubble na observação de um sistema binário de estrelas, chamado Cygnus X-1. Neste sistema, uma estrela de 30Mʘ está tendo sua atmosfera capturada por um buraco negro. Conclui-se isto a partir da observação do enfraquecimento na emissão ultravioleta do gás, sugerindo que o mesmo está sendo engolido pelo Buraco Negro (seção 6.2).

2.4 – O Raio de Maré

Fig. 2.1 – Demonstração da deformação sofrida por uma estrela que excede o limite de Roche.

O raio de maré, também chamado raio de Roche, é a distância limite para um corpo se aproximar do buraco negro sem ser destruído. Isto ocorre porque a força de maré supera a força gravitacional interna do corpo que se aproxima. Se levarmos em consideração a igualdade entre a força gravitacional e a força de maré encontramos este raio limite de aproximação do corpo em relação ao buraco negro dado por:

(3)   \begin{equation*}     R_M=R_{Sch}\sqrt[3]{\frac{\rho_M}{\rho_E}} \end{equation*}

Onde RM é o raio de maré, ρE é a densidade do corpo que se aproxima, RSch é o raio de Scharzschild e ρM é a densidade do Buraco Negro, dado pela razão da massa do Buraco Negro pelo volume do mesmo, obtido considerando o vloume do Buraco Negro como sendo o de uma esfera de raio RSch.

A figura ao lado mostra o que acontece com uma estrela que se aproxima de um Buraco Negro, chegando a uma distância menor do que o raio de maré (limite de Roche): seu volume esférico se modifica para o de um charuto, depois de uma panqueca, voltando ao de um charuto maior.

2.5 – Distorção do Espaço

Nas proximidades de um campo gravitacional forte, o espaço-tempo sofre uma deformação que provoca um aumento da distância radial à massa central, à medida que nos aproximamos da mesma. Para campos gravitacionais fracos esta distorção é desprezível. O efeito fica mais evidente nas proximidades de objetos com campo gravitacional forte, como é o caso de estrelas compactas (anãs brancas, estrelas de nêutrons), buracos negros ou galáxias massivas. A distorção acontece ao longo da direção radial, de forma que podemos determinar o comprimento de uma circunferência ao redor do buraco negro e calcular a área da esfera à qual ela pertence mas não podemos determinar com o mesmo tipo de geometria (Euclidiana), o raio da circunferência.

Por exemplo: Você está a bordo de um foguete orbitando (circulando) um buraco negro com RSch = 3 km; você mede a circunferência da órbita e então calcula (usando a geometria euclidiana) a distância (o raio da circunferência) até o buraco negro como sendo 30 km. Então você anda 21,92 km em direção ao buraco negro e mede o raio da órbita. Você determina, dessa forma, que sua distância ao buraco negro é de 10 km e não 8,08 km (30 – 21,92) como a geometria Euclidiana prevê. Agora você se move em direção ao buraco negro 28,52 km a partir da posição original. Pode parecer que você ultrapassará o horizonte de eventos (que tem RSch = 3 km) mas isso não acontece. Então você determina o raio novamente e verifica que você ainda está a 5 km do buraco negro e não 1,68 km (30 – 28,52) como a geometria Euclidiana prevê. Conclui-se claramente que o forte campo gravitacional distorceu o espaço.

A figura abaixo ilustra a distorção do espaço. O fenômeno ilustrado é chamado de lente gravitacional, pois como uma lente óptica, esta lente gravitacional provoca uma deflexão no raio de luz que passa por ela.

Fig. 2.2 – Uma fonte emissora S que esteja localizada na direção de um corpo supermassivo porém mais distante do que ele, terá sua radiação desviada de um ângulo θ e parecerá estar posicionada em S’ para um observador que se encontra ao lado esquerdo da figura.

3. O Efeito dos Buracos Negros Sobre a Radiação

3.1 – A Esfera de Fótons

Acima verificamos que a radiação eletromagnética emitida nas imediações de um corpo massivo sofre um desvio devido ao forte campo gravitacional desse corpo. Esse desvio é devido à curvatura do espaço predita na Relatividade Geral.

Fig. 3.1 – A esfera de fótons é a externa, e o horizonte de eventos, a interna. Acima, o cone de saída.

Agora, vejamos o que aconteceria se nos posicionássemos a uma distância pequena, porém maior que 1,5 RSch do Buraco Negro e emitíssemos um feixe luminoso. Direcionando o feixe na direção radial, a luz não seria desviada; todavia, à medida que fôssemos inclinando o feixe, a partir de um determinado ângulo θ em relação à direção radial, a luz seria desviada; e, inclinando além de 90º, o feixe entraria em órbita ao redor do buraco negro. Caso inclinássemos ainda mais esse feixe, ele seria engolido pelo buraco negro.

À medida que nos aproximamos do horizonte de eventos, menor será o ângulo θ para o qual o feixe de luz entrará em órbita. A distância para a qual a luz entra em órbita a 90º define uma superfície chamada de esfera de fótons, com raio de 1,5RSch.

O ângulo θ então define a abertura de um cone, chamado de cone de saída da luz. À medida que nos aproximamos do Buraco Negro, menor será a abertura do cone de saída até chegar a uma distância imediatamente maior que a do horizonte de eventos, em que essa abertura será praticamente nula.

A esfera de fótons recebe este nome porque dentro de seu raio (1,5RSch) fótons emitidos fora do cone de saída orbitam o buraco negro. Dessa forma se estivéssemos sobre a esfera de fótons olhando em uma direção perpendicular à radial, veríamos a nossa nuca!

As simulações abaixo ilustram o que veríamos se nos aproximássemos de um buraco negro, até a esfera de fótons.

  • Aproximação a 10 RSch de um Buraco Negro. (182 k).
  • Aproximação à esfera de fótons. (140 k).
  • Circundando um Buraco Negro a 10 RSch. (820 k).
  • Circundando a esfera de fótons. (820 k).

A página Virtual Trips to Black Holes and Neutron Stars Page contém mais simulações.

3.2 – O Desvio para o Vermelho (redshift) Causado pelo Campo Gravitacional

Fig. 3.2 – Demonstração do efeito gravitacional do BN sobre a radiação.

Outro efeito interessante que fortes campos gravitacionais provocam sobre a radiação é a alteração de seu comprimento de onda. A radiação emitida nas proximidades de um campo gravitacional forte sofre um aumento do seu comprimento de onda (ou redução da frequência). Para a luz visível, isso significa que a radiação se encontra deslocada para o vermelho. Este efeito é chamado de “desvio para o vermelho” (ou “redshift”, em inglês).

Para calcular o desvio para o vermelho sofrido pela radiação emitida nas proximidades de um campo gravitacional podemos usar a equação 4 abaixo.

(4)   \begin{equation*}     z=\left(1-\frac{2GM}{Rc^2}\right)^{-\frac{1}{2}}-1 \end{equation*}

onde z é chamado de redshift gravitacional, M é a massa do objeto que gera o campo gravitacional e provoca o redshift, R é a distância entre a fonte emissora da radiação e a massa M e G é a constante gravitacional. Uma derivação aproximada desta expressão pode ser encontrada no link.


4. Discos de Acreção

Como se dá a acreção de matéria quando ela chega próxima ao horizonte de eventos? Como a matéria capturada pelo Buraco Negro (BN) tem momentum angular, ela acaba formando um disco que gira em torno do BN, para conservar o momentum angular. Este disco convenciona-se chamar Disco de Acreção, já que a matéria que o forma vai ser “acretada” pelo BN central.

Fig. 4.1 – Concepção artística da formação de um disco de acreção a partir da matéria capturada por um Buraco Negro estelar em interação com a estrela companheira num sistema binário. Observa-se a formação de jatos a partir da borda interna do Disco de Acreção.

A matéria na maior parte do disco consiste de gás ionizado ou plasma, formado principalmente por núcleos de hidrogênio e elétrons. A viscosidade deste gás permite que o momentum angular seja transferido para fora e que a matéria no disco vá aos poucos se movendo em direção ao centro. A presença deste disco é necessária também para colimar os jatos rádio. O cenário mais aceito para o processo de acreção é que parte da matéria é capturada pelo BN e a outra parte é ejetada formando os jatos de partículas observados nas rádio-galáxias. Se ignorarmos os efeitos relativísticos e supusermos um disco de acreção com raio interno de 5 RSch, este disco será o agente da transformação da energia gravitacional disponível em radiação, e que pode ser obtida através da expressão abaixo:

(5)   \begin{equation*}     U=\frac{GMm}{5R_{Sch}}=\frac{GMm}{\left(\frac{10GM}{c^2}\right)}=0,1 mc^2 \end{equation*}

O cálculo simplificado apresentado na Eq. 5 sugere um rendimento de 10% para o mecanismo de acreção de matéria (ou seja, para uma quantidade de massa m acretada, 10% se transforma em energia). Este rendimento é uma ordem de magnitude maior do que o da fusão do hidrogênio em hélio, para a qual se atinge 0,7% de rendimento. Este índice de 10% corresponde a uma estimativa ideal, pois quando falamos de discos de acreção devemos levar em consideração que a acreção pode ocorrer com diferentes taxas (massa acretada por unidade de tempo), o que leva a diferentes estruturas para o disco.

Discos formados com uma taxa de acreção da ordem ou um pouco menor que a chamada taxa de acreção de Eddington (seção 9) são finos, isto é, têm uma altura desprezível se comparada com o seu diâmetro. Essa estrutura fina do disco faz com que a taxa com a qual o calor é transferido para dentro seja desprezível se comparada com a taxa na qual é irradiada na direção vertical; nesse caso a eficiência se aproxima dos 10%. O espectro emitido é uma combinação de espectros de corpos negros caracterizados por uma sequência de temperaturas que decresce à medida que o raio do disco cresce. Emissão em raios-X é proeminente na parte mais quente e mais interna do disco, enquanto que a emissão no UV (ultravioleta) e óptico domina nas partes mais externas e frias.

A taxas de acreção muito baixas (<1% da taxa de Eddington) o disco se torna opticamente fino e é possível que uma estrutura de duas temperaturas se desenvolva pela incapacidade das regiões mais internas do disco de resfriarem-se eficientemente se os elétrons e íons estão termalmente desaclopados. Nesse caso, a temperatura dos íons pode atingir o valor dado pelo teorema do virial (2K + U = 0, onde K = 3kT/2), dando origem a uma estrutura toroidal, conhecida como um “Toróide de íons”. Acredita-se que estes toróides de íons tenham um papel importante na produção de jatos de partículas, frequentemente observados em núcleos ativos de galáxias. Como o campo magnético da fonte central fica congelado no toróide ionizado, cria um campo em rotação a alta velocidade com eixo paralelo ao vetor momento angular do disco. O forte campo magnético pode colimar a fluxo de partículas carregadas, dando origem aos jatos. Como as linhas de campo não podem ser ancoradas no Buraco Negro, o toróide de íons é fundamental para permitir a presença do campo magnético nas proximidades do BN.

Os Discos de Acreção são muito compactos, tendo dimensões de alguns milisegundos-luz para os buracos negros estelares e alguns dias-luz para os buracos negros supermassivos no centro das galáxias. Por isto não é possível observá-los diretamente, embora existam várias concepções artísticas dos mesmos como as mostradas nas figuras abaixo.

Fig. 4.2 – A figura acima ilustra um disco de acreção em que as partes externas são mais frias e as internas mais quentes. Na região mais interna, próxima ao horizonte de eventos, em que, pela pressão de radiação, o gás forma uma estrutura “inchada”, na forma de um toróide, que colima o jato rádio.
Fig. 4.3 – Comparação entre as dimensões de uma galáxia e de um disco de acreção.
Fig. 4.4 – A figura acima (crédito CXC/M. Weiss) ilustra, através das cores, a variação da temperatura ao longo do disco, mais fria na parte externa e mais quente na interna. O disco está girando, sendo que o lado direito se aproxima, e o lado esquerdo se afasta de nós. Por isto, na região interna, o lado direito aparece branco e o esquerdo avermelhado. Na região bem interna, que aparece ampliada, o disco aparece todo avermelhado, para ilustrar a presença do “redshift” gravitacional (seção 3).
Fig. 4.5 – A figura acima ilustra o surgimento de um vento na região interna do disco: à medida que o gás esquenta ao se aproximar do buraco negro central, parte do disco sofre um processo semelhante a uma evaporação. Este processo cria um vento de plasma acelerado pela pressão da radiação das regiões centrais. A velocidade do vento pode chegar a um décimo da velocidade da luz.

5. Como encontrar Buracos Negros

Não é possível observar um Buraco Negro (BN) diretamente porque ele não emite radiação. Entretanto, um BN exerce força gravitacional sobre os corpos ao seu redor e graças a isso podemos detectá-lo. Um modo de detectar um candidato a BN estelar é procurá-lo em sistemas binários (duas estrelas que orbitam uma ao redor da outra) onde uma das componentes do sistema tenha massa maior do que 3-6 Mꙩ, deveria ser visível se fosse uma estrela “normal” mas não é visível.

Fig. 5.1 – Concepção artística de uma estrela sendo “engolida” por um buraco negro num sistema duplo em que o buraco negro é um dos componentes. Ao redor do buraco negro vemos o disco de acreção característico.

Através do estudo da deflexão da órbita da estrela visível do sistema duplo pode-se decobrir a massa do objeto invisível e assim confrontar o resultado encontrado com o limite mínimo de massa para a existência de um buraco negro.

Outro indício de que o sistema possa conter um BN é a presença de um disco de acreção. Este se forma porque o BN captura matéria da companheira que perde o excesso de momentum angular via um processo de fricção que aquece o disco a cerca de 10⁷ K. Este aquecimento provoca uma forte emissão de raios-X.

Emissões de raios-X podem vir de outras fontes. Assim devem existir evidências mais específicas de que esta radiação seja mesmo originada em um disco de acreção. Para que um candidato seja realmente um disco de acreção ele deve ter dimensões pequenas (da ordem de milisegundos-luz para os estelares e dias-luz para os supermassivos no centro das galáxias) e apresentar período de variação da ordem de segundos ou dias, pois a escala de variabilidade deve ser mais longa do que o tempo qua a luz demora para percorrer a dimensão do disco, como está explicado abaixo.

Fig. 5.2 – Diagrama espaço-tempo para emissão da luz a partir de um Disco de Acreção.

A luz (linhas tracejadas na Fig. 5.2) viaja a 45o em relação aos eixos do espaço e tempo. Suponha que uma região de dimensão Δx (que pode ser um Disco de Acreção) varia a sua emissão de radiação. Imagine que a variação acontece primeiro no centro da região Δx no instante t = 0. A informação desta variação atinge primeiro o observador no instante t1. Enquanto isso, a causa da variação se propaga para os pontos extremos A e B da região emissora com velocidade menor ou igual à da luz (a propagação é indicada pelas linhas sólidas). Quando a causa da variação atinge os pontos A e B, estes também variam sua emissão de radiação. A informação destas variações atinge o observador nos instantes t2 e t3. Já que a luz nesse diagrama se propaga a 45o, o intervalo c(t3-t2) é igual a Δx. O tamanho da região que está variando (Δx) é, entretanto, menor do que c(t3-t1) = cΔt, onde Δt é o intervalo de tempo total no qual as variações são vistas pelo observador. Assim sabemos que variações percebidas num intervalo Δt só podem ter se originado numa região de dimensões Δx menores do que cΔt.

Fig. 5.3 – Disco de acresção orbitando um Buraco Negro

Outro indício da presença de discos de acresção é sua “assinatura” cinemática. Embora as pequenas dimensões do disco e a grande distância destes objetos a nós não permitam que eles sejam resolvidos espacialmente, o efeito Doppler na luz, descrito a seguir, permite que se resolva as velocidades do gás no disco. Se o disco estiver inclinado em relação ao observador, este verá um lado do disco se “aproximar” com uma certa velocidade (que é muito alta, da ordem de milhares de km/s para um disco de acresção orbitando um buraco negro) e verá o outro lado do disco se afastar com a mesma velocidade.

Devido ao efeito Doppler, a radiação (luz) que é emitida por um objeto movendo-se com velocidade v sofre um desvio no seu comprimento de onda (ou freqüência). Se o objeto se aproxima do observador, a radiação é observada com comprimento de onda menor (as cristas das ondas se aproximam); se o objeto se afasta, a radiação é observada com comprimento de onda maior (as cristas das ondas se afastam). Pode-se quantificar este efeito pela expressão do efeito Doppler como demonstrado a seguir. Se o objeto emite radiação de um certo comprimento de onda λo, este é observado como λ, e a partir das equações 6 ou 7 abaixo podemos determinar a velocidade do objeto emissor da radiação e o sentido do seu movimento. A equação 6 abaixo vale para velocidades bem menores (<1%) do que a velocidade da luz c, enquanto que as Eqs. 7 e 8 valem para qualquer velocidade.

(6)   \begin{equation*}     z=\frac{\lambda - \lambda_0}{\lambda_0}=\frac{v}{c} \end{equation*}

Assim:

  • Se o corpo se afasta: v < 0, logo λ > λo, ocorre redshift: desvio para o vermelho.
  • Se o corpo se aproxima: v < 0, logo λ > λo, ocorre blueshift: desvio para o azul.

(7)   \begin{equation*}     \lambda=\sqrt{\frac{1 + \sfrac{v}{c}}{1 - \sfrac{v}{c}}}\lambda_0 \end{equation*}

(8)   \begin{equation*}     z\equiv\frac{\Delta\lambda}{\lambda}=\frac{v}{c}cos\theta\left(\frac{1}{1-\frac{v^2}{c^2}}\right)^\sfrac{1}{2} \end{equation*}

Fig. 5.4 – Perfil (de duplo pico) de uma linha emitida por um disco de acreção em rotação kepleriana em função da velocidade do gás emissor.

Se um Disco de Acreção como o da Fig. 5.3 emitir radiação num comprimento de onda λo conhecido, a partir do λ observado, pode-se recuperar as velocidades do gás emissor do disco. Como explicado acima, observaremos velocidades negativas provenientes do lado do disco que se aproxima, e positivas do lado do disco que se afasta. Uma linha espectral proveniente de um disco em rotação inclinado fica então alargada e apresenta um perfil característico de duplo pico como ilustrado na Fig. 5.4. Usando a Eq. 8 transformamos os comprimentos de onda observados em velocidade.


6. Tipos de Buracos Negros

Podemos classificar os buracos negros de acordo com a sua massa:

6.1 Buracos Negros Estelares

São originados a partir de estrelas de alta massa (maior do que cerca de 10 vezes a massa do Sol), que, após passarem pelo estágio evolutivo da sequência principal e esgotarem seu combustível para fusão nuclear, passam pelo estágio de gigantes e supergigantes e depois explodem como supernovas.

Fig. 6.1 – Concepção artística do sistema binário Cygnus X-1 na constelação de Cisne, constituído de um BN estelar e uma estrela supergigante azul.

A explosão em supernovas ocorre após alguns milhares de anos, e, caso o “caroço” restante após a estrela ter ejetado as suas camadas externas tiver uma massa maior do que 3 massas solares (valor estimado como limite para estrelas de nêutrons colapsarem, ainda não comprovado), ele se tornará um Buraco Negro (BN) estelar.

Na Via Láctea, os BNs estelares são encontrados mais facilmente quando ocorrem em sistemas binários, ou seja, quando o BN tem uma estrela companheira. Embora não se observe radiação do BN, observa-se a radiação da estrela companheira, e verifica-se, pelo efeito Doppler da luz, que ela se movimenta em torno de uma outra estrela invisível. Se a massa calculada para esta outra estrela for maior do que 3 massas solares, conclui-se que ali se encontra um BN. Muitas vezes, as camadas mais externas da estrela companheira são capturadas pelo BN, formando um disco de acreção, como ilustrado na figura ao lado.

6.2 Buracos Negros Supermassivos

Encontrados no centro de galáxias, têm massas que variam de milhões a bilhões de massas solares.

Fig. 6.2 – Imagem composta da galáxia ativa Centaurus A, formada por imagens: em raios-X, no óptico e em rádio.

Os BNs supermassivos podem ter sido originados do colapso gravitacional de imensas nuvens de gás ou de aglomerados de milhões de estrelas no centro das galáxias, que se formaram quando o universo era mais jovem e bem mais denso. Estimativas atuais, obtidas de observações de Quasares, indicam que os primeiros BNs supermassivos se formaram quando o Universo tinha menos do que 1 bilhão de anos de idade (a idade atual do Universo é de cerca de 13,7 bilhões de anos).

A acreção de matéria ao BN supermassivo no centro das galáxias produz fenômenos de “feedback”, como por exemplo emissão de radiação e jatos relativísticos a partir do disco de acreção (seção 4), como ilustrado na figura ao lado para a galáxia ativa Centaurus A.

6.3 Buracos Negros de Massa Intermediária

Embora já exista comprovação observacional da existência de buracos negros estelares, que teriam massa de até algumas dezenas da massa do Sol, e de supermassivos, com massa maior do que 1 milhão de vezes a massa do Sol, há ainda pouca evidência observacional da existência de BNs com massa entre estes dois extremos, ou seja, da ordem de milhares de vezes a massa do Sol. Há alguns estudos que apontam para estes BNs como estando presentes no núcleo de aglomerados globulares de estrelas. Este é o caso do Aglomerado Globular Omega Centauri (ver Figura abaixo), ou de algumas fontes de raios-X, encontradas em outras galáxias (porém não exatamente no núcleo), conhecidas como ULXs (do inglês, Ultra-Luminous X-ray sources), as quais são muito luminosas para serem originadas em BNs estelares, mas pouco luminosas para serem originadas em BNs supermassivos.

Fig. 6.3 – Concepção artística do possível BN de massa intermediária no centro do aglomerado de Omega Centauri. Seu tamanho está exagerado para fins de ilustração e as linhas verdes ilustram as órbitas de estrelas próximas. Perto do BN as estrelas se movimentam mais rapidamente do que as estrelas mais distantes. A coloração amarela ilustra o fato da maioria das estrelas do aglomerado serem frias, e a cor azul identifica as poucas estrelas azuis mais quentes.
Fig. 6.4 – Objeto ultra-luminoso em raio-X (ULX) na galáxia elíptica NGC 1399.

6.4 Buracos Negros Primordiais

Preditos teoricamente, esses buracos negros podem ter se formado nos primórdios do universo quando, devido a um ambiente favorável com pressões e temperaturas extremamente altas, flutuações na densidade da matéria teriam dando origem a regiões de densidades extremas, onde esses buracos negros poderiam ter se formado. É possível que devido à expansão do universo essas regiões tenham se dispersado, mas algumas podem ter se mantido estáveis dando origem a buracos negros que durem até hoje. Esse tipo de buraco negro poderia ter qualquer massa. Assim, podem ter surgido o que os pesquisadores chamam de mini buracos negros, que teriam tamanhos micrométricos. Também se considera a possibilidade da formação de BNs primordiais maiores, que através de sua evaporação poderiam também dar orgiem a mini buracos negros.


7. Buracos Negros Estelares

7.1 – Como se formam

As estrelas evoluem, desde o seu “nascimento” até a sua “morte”: após a fase de sua formação, passam um período na chamada “sequência principal” – na qual a estrela se mantém estável produzindo energia por fusão nuclear – e depois de passar pela fase de gigante ou supergigante vermelha, chegam ao seu estágio final. O tempo que a estrela permanece na sequência principal, τSP, depende da massa da estrela, como podemos ver na equação a seguir:

(9)   \begin{equation*}     \tau_{SP}=\frac{1}{\left(\frac{M}{M_\odot}\right)^2}10^{10}anos \end{equation*}

A proporção de estrelas que se formam com diferentes massas é expressa através da equação chamada de “Função Inicial de Massa”:

(10)   \begin{equation*}     IMF=n(M) \sim M^{-2.35} \end{equation*}

Após a fase de gigante vermelha, existem três possibilidades de estágio final para a estrela, dependentes tanto da massa quanto de como se dá sua evolução, se isolada ou em um sistema binário fechado (em que as duas estrelas estão muito próximas entre si):

Fig. 7.1 – Nebulosa planetária Olho de Gato (NGC 6543) composta da imagem em raio-X do satélite Chandra (azul) e da imagem no visível do telescópio Hubble (vermelho).

Se a massa inicial é < 5 M, durante e depois da fase de gigante vermelha a estrela perde massa e forma uma Anã Branca, com M < 1.4 M.

A perda de massa dá origem a uma nebulosa de gás chamada de Nebulosa Planetária (este é um nome que tem origem histórica; como nebulosa tem algumas vezes uma forma esférica, se assemelhava a um planeta em imagens de baixa resolução). Uma imagem de Nebulosa Planetária pode ser vista ao lado. No seu centro resta uma Anã Branca que se caracteriza pela natureza da pressão que mantém o equilíbrio da estrela, que é devida à degenerescência eletrônica.

Fig. 7.2 – Resultado da explosão da supernova 1987A na Grande Nuvem de Magalhães, que provavelmente formou uma estrela de nêutrons no centro.

Se a massa inicial é M > 5 M, a estrela, após a fase de gigante vermelha, explode em uma supernova podendo ou não restar um “caroço” no centro.

Se a massa deste caroço é M < 2 M ele se tranforma em uma Estrela de Nêutrons, onde a pressão que sustenta a estrela é agora a degenerescência nuclear (elétron e prótons se fundem em nêutrons);

Fig. 7.3 – Concepção artística da evolução de uma estrela massiva até a sua morte com a explosão em supernova e a formação de um buraco negro.

Se a massa do caroço após a explosão de supernova tiver massa maior do que 2 Mꙩ, este colapsa a um buraco negro. A figura ao lado mostra que uma estrela massiva sintetiza no seu interior núcleos atômicos sucessivamente mais pesados até chegar à síntese do núcleo de Ferro. Após a síntese do Ferro não é possível mais gerar energia a partir das reações nucleares e a estrela colpasa implodindo seu núcleo e dando origem a uma supernova.

A implosão fornece energia suficiente para o “caroço” vencer a barreira de potencial que impediria o colapso. É como um grande impulso para dentro que fornece uma força suficiente para iniciar o processo de colapso até um Buraco Negro.

Fig. 7.4 – Concepção artística do sistema binário Cygnus X-1.

Podem ser criados Buracos Negros ou Estrelas de Nêutrons a partir de estrelas com massas menores do que as acima quando a supernova ocorre num sistema binário fechado (estrelas bem próximas uma da outra) como ilustrado na Fig. 7.4. Se a estrela evolui num sistema desses, há transferência de matéria de uma estrela “normal” para uma compacta de forma que esta última acumula uma grande massa que provoca sua explosão como supernova. O resultado mais provável é a formação de uma estrela de nêutrons a partir do caroço que sobra da explosão, mas existem sistemas duplos, como Cygnus X-1 em que a componente compacta parece ser um Buraco Negro.

7.2 – Evidências Observacionais de Buracos Negros Estelares

Cygnus X-1 é uma estrela na constelação do Cisne que varia em raios-X em escalas de tempo de milissegundos, indicando que a fonte emissora (que é provavelmente um Disco de Acreção em torno de um BN estelar) tem dimensões da ordem do diâmetro da Terra. Pelas velocidades calculadas a partir do desvio Doppler observado no espectro da estrela, concluiu-se que ela tem uma companheira com massa > 6M. Como esta companheira não é visível, conclui-se que ela só pode ser uma estrela compacta e pouco luminosa, ou seja, uma estrela anã branca, estrela de nêutrons ou buraco negro, pois se assim não fosse ela seria visível considerando a distância estimada ao sistema. Como não existem anãs brancas ou estrelas de nêutrons com esta massa, conclui-se que só pode ser um buraco negro.

Fig. 7.5 – Imagem do sistema binário LMC X-1 do extinto obeservatório em raios-X ROSAT, da NASA.

LMC X-1 é um sistema binário de raios-X descoberto na Grande Nuvem de Magalhães, galáxia satélite da Via Láctea. Esse sistema, que foi o primeiro sistema binário de raios-X observado, é composto por uma estrela de baixa massa e uma companheira compacta. A partir do movimento do sistema podemos inferir que a companheira compacta se trata de um buraco negro, devido à sua elevada massa (5 M).

Uma observação particularmente contundente foi a da fonte de raios-X galáctica GRS1915+105. Esta foi também a primeira fonte na galáxia na qual se observou jatos rádio superluminais, os quais são comuns em quasares. Devido às várias características comuns com quasares, porém em escalas milhões de vezes menores , Mirabel e Rodriguez (1994) chamaram esta fonte e outras depois descobertas de microquasares. Em 1997 e 1998, Eikenberry e colaboradores realizaram observações simultâneas de GRS1915+105 em raios-X (satélite XTE-NASA), infravermelho (IR) próximo (com o telescópio de 5m do Monte Palomar) e em rádio. Observaram flares periódicos em raios-X que se repetiam em intervalos de 30 minutos. Estes flares eram seguidos por flares no IR e em rádio (radiação síncrotron).

A interpretação mais plausível é que estamos observando um Disco de Acreção em torno de um buraco negro estelar. O disco interno se aquece devido à acresção de matéria de uma companheira e emite um flare em raios-X. Em seguida o disco se desmancha, sendo que parte da matéria é acretada e parte dá origem a um jato de plasma relativístico observado no IR e em rádio.O fenômeno se repete a cada 30 minutos, quando o disco é reabastecido por matéria proveniente da atmosfera da estrela companheira.A relevância desta observação se deve ao aparecimento da emissão IR e rádio logo após o flare em raios-X, constituindo-se numa evidência contundente de que o plasma dos jatos relativísticos provém do disco interno, como havia sido previsto em modelos para o sistema buraco negro + disco de acresção.

A figura abaixo ilustra o cenário proposto comparado com o de um quasar (ver próxima seção).

Fig. 7.6 – Analogia entre um mircoquasar e um quasar.
Fig. 7.7 – Formação de jatos provenientes de um disco de acresção. A figura ilustra as linhas do campo magnético ao longo dos jatos.

7.3 – Gamma Ray Bursts

As chamadas “Explosões de Raios Gama (tradução de Gamma Ray Bursts – GRBs)” estão entre os eventos mais energéticos do universo. O que sempre gerou dúvidas, e até hoje ainda causa discussões, é a origem desses fenômenos. Com diversas hipóteses levantadas, como colisões de estrelas de nêutrons, buracos negros em formação, uma coisa é certa: assim como estes dois tipos de objeto se originam da explosão de uma estrela supernova, os GRBs também.

Fig. 7.8 – Mapeamento das “explosões de raios gama” com a missão BATSE, lançada em 1991. A distribuição isotrópica, sem concentração no plano galáctico, comprova que os eventos são na sua maioria externos à Via Láctea.

Após a emissão de Raios Gamma, que têm duração curta — variando de uma fração de segundo a alguns minutos — as fontes dos GRBs têm uma emissão posterior em comprimentos de onda maiores, como raios-X e radiação visível, devido a interações entre esta radiação, bem como o material ejetado na explosão, e o material interestelar circundante. A primeira prova desta emissão posterior veio em 1997 com o satélite BeppoSax, que identificou a direção de um GRB e observou a fonte em raios-X e 20 horas mais tarde o telescópio William Herschel observou a emissão correspondente no óptico, possibilitando identificar, como fonte da emissão, uma galáxia tênue onde teria ocorrido a explosão.

A emissão na banda do visível tem permitido a identificação da fonte e a obtenção do seu resdhift, o que permite também a determinação de sua distância. Estas observações têm revelado que os GRBs ocorrem sempre em galáxias distantes (bilhões de anos-luz) com intensa formação estelar, conhecidas como galáxias “Starburst”, que são galáxias com grandes quantidades de gás e poeira (meio interestelar), necessários para a formação de novas estrelas. A associação dos GRBs com as galáxias Starburst reforça a associação dos GRBs com supernovas. Isto porque estas galáxias têm uma maior taxa de explosão de supernovas do que as demais porque as estrelas mais massivas, que terminam sua vida como supernovas, tem um tempo de evolução curto, da ordem de milhões de anos, explodindo quando a galáxia ainda pode ser identificada como Starburst (ou seja, quando ela tem ainda grandes quantidades de gás e poeira, bem como estrelas jovens).

Fig. 7.9 – Mapeamento de todos os GRBs detectados com a missão Swift, lançada em 2004. Destaque para a explosão do dia 12/02/2011.

Dada a alta energia produzida em supernovas, a qual pode ser facilmente medida, é possível verificar a viabilidade em termos energéticos da hipótese de que os GRBs se originam nestas explosões. A explicação para a variação na duração de cada explosão seria a seguinte: os GRBs mais curtos – de poucos milésimos de segundos – seriam de supernovas que formam estrelas de nêutrons, enquanto as explosões mais longas – cerca de alguns minutos – seriam originadas em supernovas de estrelas muito massivas, que formam buracos negros. De tão energéticos, a luz visível de alguns GRBs, mesmo distantes, são facilmente observáveis com telescópios.

Muitos instrumentos foram desenvolvidos e várias missões realizadas para observar e tentar explicar os GRBs. Um dos instrumentos mais efetivos foi o BATSE (Burst and Transient Source Explorer) do Compton Gamma Ray Observatory, que derrubou as hipóteses de que as explosões teriam origem em objetos ou fenômenos ocorrendo dentro da Via Láctea. O BATSE mapeou as explosões, revelando que as mesmas se dão isotropicamente, ou seja, provêm de todas as direções, descartando sua origem no plano galáctico.

Atualmente, o mais avançado satélite para estudo de GRBs é o Swift, da NASA. Lançado em 2004 e operando até hoje (07/2011), o Swift possui um detector de raios gama bem como um telescópio de raios-X e um óptico que permitem a observação da emissão nestas bandas e a localização imediata da fonte. O Swift manda também imediatamente a informação da localização dos GRBs tanto para telescópios terrestres quanto espaciais, possibilitando observar a emissão óptica e em outras bandas praticamente simultaneamente à explosão em raios gama. Pouco mais de 600 GRBs foram detectados pelo Swift de 2004 até o início de 2011. O mapa celeste dessas explosões pode ser visto na Fig. 7.6. Essas e outras informações podem ser conferidas no site do Swift: http://heasarc.nasa.gov/docs/swift/swiftsc.html.


Buracos Negros Supermassivos

O primeiro espectro de uma galáxia ativa foi obtido por E. A. Fath em 1908 no Observatório Lick nos Estados Unidos em seu trabalho de tese. O que ele notou foi a presença de fortes linhas de emissão no núcleo da galáxia NGC1068. Em 1943, Carl Seyfert identificou que haviam muitas galáxias com espectros nucleares semelhantes, e assim estas galáxias ficaram conhecidas como galáxias Seyfert. A proporção de galáxias Seyfert é de cerca de 1 em cada 100 galáxias, na maioria de tipo espiral. Mais tarde foram descobertos os Quasares, que, hoje em dia, sabemos que são também núcleos ativos de galáxias, só que muito mais luminosos do que um núcleo Seyfert: enquanto um núcleo Seyfert pode ter uma luminosidade que é da ordem de todas as estrelas da Via Láctea, num Quasar esta luminosidade atinge 100 a 1000 vezes a da Via Láctea.

A alta luminosidade destes núcleos mostrava que não poderia ser devida a estrelas, exigindo uma explicação alternativa. Mesmo com a máxima resolução espacial obtida com os maiores telescópios não era possível resolver espacialmente a região emissora, indicando somente limites superiories entre 1 e 100pc. Considerando estas dimensões e as velocidades típicas das estrelas no centro das galaxias, o teorema do virial indicava uma massa central entre entre 1 milhão e 1 bilhão de massas solares, o que significava que uma região com raio menor do que 100 pc continha toda esta massa e produzia energia a uma taxa nunca antes vista. A explicação encontrada foi a presença de um buraco negro supermassivo, sendo a energia emitida resultado da liberação da energia gravitacional de matéria capturada pelo Buraco Negro (BN) e que cai em direção ao mesmo. Isto se dá através de um disco de acreção que permite a conservação de momentum angular e sua transferência para fora, de forma que a matéria possa cair no BN. À medida que a matéria vai se transferindo para dentro, vai aumentando sua temperatura, por fricção, e o disco começa então a emitir radiação.

Este modelo parecia pertinente para galáxias ativas, mas para galáxias não-ativas, como a Via Láctea, ele era considerado desnecessário. Entretanto, nos últimos 25 anos, aperfeiçoaram-se detectores na faixa infravermelha do espectro, que permitem observar através da poeira. Tornou-se possível, então, medir velocidades e mapear as posições de estrelas individuais no centro da Via Láctea através de imagens (que revelam os chamados movimentos próprios) e espectroscopia (que permite a determinação das velocidades radiais). Assim como o movimento dos planetas permite o cálculo da massa do Sol, o movimento das estrelas permite calcular a massa existente da região nuclear da Via Láctea. Os astrônomos alemães Eckart & Genzel (1996-presente) têm acumulado medidas das velocidades das estrelas orbitando em torno do centro da galáxia. Já publicaram o resultado obtido ao juntar os dados de cerca de 200 estrelas observadas: as velocidades das estrelas crescem em direção ao núcleo da Via-Láctea de acordo com a Lei de Kepler (para o movimento de corpos em torno de uma massa central), até a mínima distância ao centro possível de ser resolvida (cerca de uma semana-luz). As velocidades observadas indicaram uma densidade central maior do que 2×1012 massas solares por parsec cúbico, que é muito mais alta do que a que permite a existência de um aglomerado estelar estável. A única conclusão possível é que existe no centro da Via Lácta um BN de massa 2.6×106 M.

Fig. 8.1 – Aumento da dispersão de velocidades das estrelas no centro da Via Láctea obtido a partir
do estudo de Eckart & Genzel.

Com a descoberta de evidências tão fortes da presença de um BN supermassivo na nossa galáxia, começou-se a questionar se outras galáxias inativas não teriam um BN central. Entretanto, era impossível verificar o movimento de estrelas individualmente a distâncias tão grandes como o núcleo de outras galáxias. Então, passou-se a observar a dispersão de velocidades das estrelas, uma medida da velocidade combinada de muitas estrelas, a partir do alargamento das linhas espectrais da galáxia (que é devido ao conjunto das diferentes velocidades das estrelas). Verificar a presença de um BN supermassivo só foi possível quando se pôde medir a dispersão de velocidades das estrelas em função da distância ao centro da galáxia com excelente resolução espacial, pois, mesmo para as galáxias mais próximas, o efeito de um BN central só pode ser observado dentro de uma distância de 1 a 2 segundos de arco. Tais observações puderam ser feitas com o telescópio espacial, que permite uma resolução angular melhor do que 0.1 segundo de arco ou com observatórios na Terra que utilizem ótica adaptativa. Estas observações indicaram que a dispersão de velocidades crescia fortemente dentro do raio de influência do BN, o que só poderia ser explicado com a presença do mesmo. Embora estas medidas constituam uma evidência mais indireta do que a medida do movimento individual das estrelas ao redor do núcleo, deram suporte à ideia de que existe um BN central em todas galáxias, o que tem sido comprovado desde então e amplamente aceito atualmente.

Com o Telescópio Espacial Hubble foi possível resolver p raio de influência de BN supermassivos para cerca de 30 galáxias próximas. Os astrônomos então verificaram que em todas elas a velocidade das estrelas não para de crescer à medida que nos aproximamos do centro da galáxia e modelos dinâmicos demonstram a necessidade de duas componentes para compor o campo gravitacional observado: uma componente estelar que chamamos bojo mais uma componente compacta que seria o BNS (buraco negro supermassivo). O bojo é a componente esférica que é característica das galáxias elípticas, que têm somente esta componente, e é a componente mais interna das galáxias espirais, as quais têm também uma outra componente, o disco.

O método de determinar massas a partir da dispersão de velocidade das estrelas já era anteriormente usado para determinar a massa do bojo das galáxias. Para isto não é necessário ter a resolução espacial do Hubble, pois pode-se observar o movimento integrado das estrelas do bojo, sem precisar medir suas velocidades em função da distância ao núcleo. Um resultado muito interessante foi obtido quando os astrônomos compararam as massas obtidas como o Hubble para os BNS com as massas determinadas para os seus bojos: elas eram proporcionais! Esta proporcionalidade pode ser observada nas Figs. 8.2 e 8.3 e sugere que a formação do Buraco Negro central está vinculada à formação do bojo, de forma que bojos mais massivos têm no seu centro BNS mais massivos. Uma extrapolação deste resultado é que todas as galáxias que têm bojo têm um BNS no seu centro, cuja massa pode ser determinada pela relação de proporcionalidade entre os dois. Esta relação, extraída do trabalho de Tremaine et al. (2002) é dada pela expressão:

(11)   \begin{equation*}     log\left(\frac{M_{BN}}{M_\odot}\right)=8.13 (\pm0.06) + 4.02 (\pm0.32)log\left(\frac{\sigma}{200 km s^{-1}}\right) \end{equation*}

Fig. 8.2 – Painel da esquerda: Relação entre a Massa do BN e a luminosidade do bojo. Painel da direita: Relação entre a Massa do BN e a dispersão de velocidade das estrelas do bojo.
Fig. 8.3 – Representação gráfica da relação entre a Massa do BN e a dispersão de velocidades das estrelas do bojo (Fig. 8.2), o que indica uma proporcionalidade entre a Massa do BN e a Massa do bojo da galáxia.

9. Buracos Negros em Núcleos de Galáxias Ativas

9.1 – Tipos de AGN

AGN é uma sigla em inglês para Active Galactic Nuclei, ou Núcleo Ativo de Galáxia. O núcleo destas galáxias emite energia que não pode ser explicada como sendo gerada unicamente em estrelas. Dentro do paradigma atual, a energia emitida por um AGN é gerada a partir da transformação da energia potencial gravitacional de matéria que é acretada a um Buraco Negro Supermassivo através de um Disco de Acreção. As galáxias que “hospedam” estes núcleos são chamadas de galáxias ativas, e são divididas em classes de acordo com suas propriedades (intrínsecas e aparentes) da seguinte forma:

Quasares ou Quasi-stelar radio sources

Os Quasares são os AGNs mais luminosos do Universo. Foram descobertos em comprimentos de onda de rádio. Quando os astrônomos procuraram as fontes ópticas correspondentes, ficaram surpresos porque essas fontes tinham aparência estelar. Outras características marcantes são o seu fluxo variável no tempo e suas grandes luminosidades no ultravioleta, rádio, raio-X e infravermelho (>1046 erg s-1). São luminosos em qualquer comprimento de onda, o que lhes confere a característica de uma distribuição espectral de energia bem “larga” (as galáxias não ativas têm uma distribuição espectral de energia mais “estreita”, centrada em comprimentos de onda na faixa óptica e infravermelha).

Com o tempo, vários outros métodos de detecção de quasares foram desenvolvidos, levando em conta várias das suas características. Uma delas foi particularmente reveladora, a do excesso de radiação na região ultravioleta do espectro quando comparados com outras fontes. Este método consistia em obter imagens com dois filtros diferentes, um no visível e outro no ultravioleta. Os quasares sempre apresentavam excesso (em relação a estrelas do tipo A) no ultravioleta. O surpreendente foi descobrir que existiam muito mais objetos do que o esperado, pois a maioria dos objetos identificados não possuía uma emissão forte em rádio. Esses são os chamados objetos quase estelares (QSOs), ou quasares rádio silenciosos. A emissão em rádio dos QSOs é 100 vezes menor, mas o seu número no Universo quando comparado ao de quasares emissores em rádio é entre 10 e 20 vezes maior.

O espectro nuclear de Quasares e QSOs mostra linhas de emissão alargadas, características de gás se movendo a velocidades de milhares de quilồmetros por segundo e contínuo de origem não-térmica (ou seja, que não é característico do produzido em estrelas) desde altas frequências (raios Gama e X) até as frequências baixas de rádio.

Outro aspecto importante de quasares e QSOs é o seu grande redshift (1 < z > 7), entre os maiores redshifts observados, indicando que são objetos muito distantes, cuja luz observada hoje foi emitida quando o Universo tinha até 1/20 de sua idade atual.

Fig. 9.1 – Imagens de quasares obtidas com o Hubble.

As figuras acima mostram imagens de quasares obtidas com o Telescópio Espacial Hubble. Devido à excelente qualidade de imagem do Hubble, pode-se observar a nebulosidade em torno de um núcleo brilhante que evidencia que os quasares são na realidade núcleos de galáxias emitindo enormes quantidades de energia. Imagens anteriores (da Terra) mostravam somente o núcleo brilhante, e por isto se pensou inicialmente que os quasares eram objetos estelares.

Rádio galáxias

Embora os AGNs emissores de ondas de rádio mais conhecidos sejam os quasares, as rádio galáxias são também caracterizadas por sua grande emissão em rádio. A diferença em relação aos Quasares é que nas rádio galáxias é possível observar com mais facilidade a galáxia “hospedeira”. Esta galáxia hospedeira é em geral uma gigante elíptica, que exibe uma rádio-estrutura na forma de jatos e dois lobos opostos, como mostram as figuras abaixo.

As rádio galáxias podem ser divididas em: galáxias emissoras de linhas largas (BLRGs) e galáxias emissoras de linhas estreitas de (NLGRs).

As BLRGs emitem tanto linhas largas (> 1000 kms-1) – indicando a presença de nuvens orbitando o Buraco Negro com velocidades maiores do que 1000 km s-1, como linhas estreitas (< 1000 km s-1). As NLRGs emitem somente linhas estreitas.

Fig. 9.2 – Rádio-galáxia 3C31.

A figura acima mostra imagens da rádio-galáxia 3C31. O mapa rádio (na cor vermelha), obtido com o VLA (Very Large Array, arranjo de antenas rádio que permite alta resolução angular, no caso 1.4 segundos de arco) é mostrado juntamente com uma imagem na banda V (visual, na cor branca), mostrando que os lobos se estendem por centenas de kiloparsecs, muito além da imagem ótica. (Gentileza de Alan Bridle, do National Radio Astronomy Observatories).

Objetos BL Lacertae

Normalmente os AGNs têm como característica a variação temporal da emissão em todos os comprimentos de onda, mas esse grupo é conhecido por sua variação no visível muito acentuada em períodos de tempo curtos. As galáxias hospedeiras são elípticas, tendo sido inicialmente confundidas com estrelas variáveis, possuem núcleo muito luminoso, e a luz nuclear, além de apresentar uma alta polarização, tem um contínuo sem linhas de absorção (características de estrelas) e raras linhas de emissão. Os mais luminosos são referidos também como blazares (o nome vem de BL Lac + quasar) e são fontes de rádio. A interpretação deste tipo de AGN é que estamos observando uma rádio galáxia de um ângulo de visada ao longo do jato rádio relativístico que emana do núcleo .

Galáxias Seyfert

É uma classe de AGN em que o núcleo emite uma luminosidade considerada intermediária (1042< L < 1045 erg s-1) , permitindo que se observe a galáxia hospedeira. Foram descobertas por possuírem linhas de emissão muito fortes e originadas em gás altamente ionizado (como as dos Quasares), tendo recebido o nome do cientista que as descobriu. Ocorrem majoritariamente em galáxias espirais. Assim como nos Quasares, sua radiação nuclear mostra linhas de emissão e contínuo de origem não-térmica (ou seja, que não é característico do produzido em estrelas) desde altas frequências (raios Gama e X) até as frequências baixas de rádio. São divididas em duas categorias: as Seyfert 1, que apresentam tanto linhas estreitas quanto linhas largas de emissão; e as Seyfert 2, que apresentam apenas linhas estreitas de emissão. A região emissora de linhas largas é conhecida como “Broad Line Region” (BLR) e a emissora de linhas estreitas é conhecida como “Narrow Line Region” (NLR).

Fig. 9.3 – A galáxia Seyfert 2 NGC 5728 em duas escalas distintas. À esquerda, uma imagem de toda galáxia, obtida da Terra. À direita, uma imagem obtida com o Telescópio Espacial isolando a emissão do gás ionizado pela fonte central, que acredita-se ser um buraco negro circundado por um disco de acreção e por um toro de poeira que colima a radiação na forma de um cone, e por isto o gás ionizado tem forma aproximadamente cônica.
Fig. 9.4 – Imagem composta da NGC 1068. Outro exemplo de galáxia Seyfert é a NGC 1068, ao lado. A imagem é uma composição da emissão em rádio captada pelo Very Large Array (em azul), no óptico pelo telescópio espacial Hubble (em verde), e em raio-X pelo observatório Chandra (em vermelho).
LINERs

São AGNs de baixa atividade, ou seja, a taxa de acreção de matéria pelo BN é muito baixa, e, consequentemente, sua luminosidade é bem fraca.

São galáxias quase normais nas quais se acredita existir um buraco negro quase quiescente (em baixa atividade). Pesquisas atuais mostram sinais de atividade nuclear semelhante porém menor do que a encontrada nas Seyferts, emitindo linhas mais fracas e com baixa ionização (ver seção 9.4).

Fig. 9.5 – Imagem composta da galáxia Sombrero.

A imagem acima é da galáxia próxima Sombrero, tendo ao fundo vários quasares. Também conhecida como NGC 4594, ou Messier 104, é mostrada como uma composição de imagens dos observatórios espaciais: Chandra em raio-X (em azul), do telescópio Hubble no óptico (em verde), e Spitzer no infravermelho (em vermelho). A figura deixa bem evidenciada a camada de poeira ao longo do disco da galáxia.

9.2 – Radiação emitida por AGNs

Nas rádio galáxias mais luminosas e nos quasares a energia liberada através dos jatos e depositada nos lobos é da ordem de 1061 erg, o que é equivalente à energia liberada na explosão de 1010 supernovas! Para que essa energia seja gerada a partir das formas convencionais de produção de energia estelar, necessitaríamos então que quase todas as estrelas de uma galáxia tivessem explodido em supernovas (energia por supernova é 1051 erg). Isto é devido ao fato de que a geração de energia devido às reações nucleares tem um rendimento relativamente baixo: somente 0,7% da massa das estrelas é transformada em energia (E = mc2). Como observamos a galáxia ainda “inteira” (ou seja, não pode ter acontecido que todas as estrelas tenham explodido como supernovas), temos que pensar, então, numa outra fonte que possa dar origem a toda a energia presente nos lobos das rádio-galáxias e quasares.

A ideia de que a fonte de energia seja a energia gravitacional liberada por matéria sendo acretada por um buraco negro central foi inicialmente proposta pelos astrônomos Edwin Salpeter e Donald Lynden-Bell. A conversão de matéria em energia no entorno de um buraco negro, tem uma eficiência muito maior do que as reações nucleares nas estrelas, chegando a 10%, ou seja, 10% da massa que está sendo “engolida” é convertida em energia (contra 0.7% nas reações nucleares).

Uma outra característica das galáxias com núcleo ativo que reforça a presença de um buraco negro central é a rápida variabilidade da radiação que chega destas galáxias. Esta variabilidade indica um tamanho muito pequeno para a fonte emissora (Fig. 5.2) o que leva ao modelo no qual existe um buraco negro central, liberando energia através da captura de matéria dentro de uma região de pequenas dimensões (dias a semanas-luz).

Em resumo, temos um “modelo” em que um buraco negro supermassivo está convertendo massa em energia de forma muito eficiente num volume extremamente pequeno, no núcleo das galáxias ativas.

Mas como se dá a acreção de matéria pelo buraco negro? O modelo mais aceito atualmente propõe a formação de um disco de acreção ao redor do buraco negro, para conservação do momentum angular. O centro do disco é mais quente, devido à fricção da matéria à medida que ela se desloca em direção ao buraco negro central e fica mais frio para fora. O disco tem um raio máximo a partir do qual se torna instável e verifica-se que nesta região se formam nuvens, que caracterizam a região chamada de Região de Linhas Largas, ou Broad-Line Region (BLR), em inglês. Mais para fora há evidências da presença de um gás mais frio, onde sobrevive a poeira, possivelmente tendo uma forma toroidal que colima a radiação emitida pela região central do disco. Assim, em grandes escalas, a luz é emitida anisotropicamente (ver, por exemplo, cone de ionização da galáxia NGC 5728 – Fig. 9.3).

Nas rádio galáxias, observa-se também a presença de jatos rádio, muitas vezes altamente colimados (Fig. 9.2). Neste caso a colimação é atribuída a campos magnéticos intensos associados ao disco. Acredita-se que o processo de formação dos jatos seja análogo ao observado no microquasar descrito anteriormente: enquanto parte da matéria do disco de acresção “cai” para dentro do buraco, uma outra parte da matéria é ejetada dando origem à emissão rádio. É um assunto de fronteira na pesquisa dos núcleos ativos de galáxias desvendar porque alguns núcleos ativos apresentam jatos rádio e outros não.

9.3 – Modelo Unificado dos AGNs

Várias evidências observacionais levaram a um modelo básico para os AGNs, que consite, além de um buraco negro supermassivo e seu disco de acreção, da região de linhas largas (BLR) externa ao disco de acreção, de um toróide molecular rico em poeira que circunda a BLR a cerca de 1 pc do BN, e da região de linhas estreitas (NLR), mais para fora e que pode atingir distâncias de centenas de pc. Este modelo ficou conhecido com o nome de Modelo Unificado, e uma versão do mesmo é esquematizado pela figura abaixo. Nesta figura, as estruturas – em particular o toróide de poeira – são representações idealizadas, pois as observações mais atuais sugerem que o toro é formado por nuvens e não tem bordas tão definidas.

Fig. 9.6 – O Modelo Unificado segundo Urry & Padovani (1995).

O Modelo Unificado preconiza que as galáxias ativas tipo 1 e tipo 2 (por exemplo, Seyfert 1 e Seyfert 2; BLRGs e NLRGs) são na verdade manifestações de um mesmo fenômeno, que parece diferente devido à orientação da fonte central em relação ao observador. De acordo com este modelo: (1) enquanto os objetos BL Lacertae seriam rádio galáxias observadas ao longo do eixo de emissão rádio, estas últimas seriam observadas de direções fora do cone de emissão (observadas “de lado”); (2) enquanto as galáxias Seyfert 1 são observadas através de uma linha de visada que não intercepta o toro de poeira, as Seyfert 2 são observadas atraveś de uma linha de visada que intercepta o toro.

Além da orientação, há um outro parâmetro que diferencia também os AGNs, que é sua luminosidade, que é resultante da taxa de acreção. Desta forma, os LINERs são AGNs que acretam matéria a uma taxa muito baixa, e por isto são pouco luminosos, enquanto que os Quasares são mais luminosos devido a uma maior taxa de acresção, e as galáxias Seyfert seriam casos intermediários entre estes dois extremos.

A simulação a seguir ilustra o cenário proposto (em particular para a rádio galáxia Centaurus A).

Jatos e disco de acresção no núcleo de Centaurus A. (4882 k).

9.4 – Evidências Observacionais de Buracos Negros Supermassivos nos AGNs

Evidências da presença de discos de gás em rotação nos núcleos ativos têm sido encontradas em diferentes bandas espectrais e a diferentes distâncias ao buraco negro. Podemos citar, em ordem crescente de distância:

  1. Em raios-X (observações por satélite) tem sido observada a linha de emissão Kα do Ferro em 6.4 eV, com duplo pico, indicando velocidades de rotação da ordem de 100 000 km/s, que se originaria na parte interna do disco de acresção, entre 6 e 20 RSch
  2. Na faixa ótica do espectro, observam-se linhas de recombinação do Hidrogênio também com duplo pico, correspondendo a velocidades de rotação de 10 000 km/s, que seriam formadas entre 102 e 104 RSch
  3. Na galáxia ativa NGC 4258 resolveu-se com interferometria rádio (VLBA), nuvens individuais emissoras de megamasers de H2O, a distâncias entre 0.13 e 0.26 parsecs (104 – 106RSch), movendo-se a velocidades da ordem de 1000 km/s. Esta observação constitui-se numa evidência mais forte da presença de um buraco negro central porque não é somente cinemática, como as acima (onde somente se observa o perfil de velocidades mas não se resolve espacialmente a região emissora), pois permite separar espacialmente as diferentes nuvens em rotação. Entretanto, somente em outros 3 casos foram encontrados resultados semelhantes ao desta galáxia;
  4. Discos de gás observados no ótico pelo telescópio espacial Hubble, que têm dimensões típicas de 100 pc; nos casos em que foi possível medir a cinemática destes discos, a mesma é consistente com movimento Kepleriano em torno de uma grande concentração central de massa. Um exemplo é o famoso caso de M87, ilustrado abaixo.

M87 é uma galáxia elíptica gigante no centro do aglomerado de Virgem. Ela é uma rádio-galáxia que possui um jato de gás ionizado (plasma) partindo do núcleo com velocidades relativísticas e que emite radiação sincrotrônica (radiação gerada por elétrons relativísiticos espiralando em torno de linhas de campo magnético).

Fig. 9.7 – Disco de Gás e Jato na galáxia ativa M87

A imagem acima, obtida com o telescópio espacial Hubble através de um filtro centrado na linha de emissão Hα mostra uma espiral de gás em torno do núcleo. Esta imagem mostra também o jato de radiação sincrotrônica. Os astrônomos do Instituto de Telescópio Espacial obtiveram espectros deste disco de gás e mediram velocidades de 550 km/s dentro de um raio de 18 parsecs do centro. Utilizando a Eq. 1, podemos obter a massa M do BN central para r = 18 pc e v = 550 km/s, que resulta M = 1.3 X 109M. Uma ilustração da observação espectroscópica é apresentada na Fig. 9.8, enquanto que a Fig. 9.9 mostra uma comparação entre observações em rádio e no óptico do jato de M87.

Fig. 9.8 – Os espectros do disco de gás mostram que de um lado do disco o gás se aproxima de nós (azul) e do outro o gás se afasta (vermelho).
Fig. 9.9 – Diferentes visões da galáxia M87: na faixa rádio e na faixa ótica do espectro.
Fig. 9.10 – NGC 4261.

A imagem acima, obtida com o Telescópio Espacial Hubble, ilustra um disco de poeira em grande escala em torno do AGN no centro da galáxia ativa NGC 4261. Este disco de poeira, que tem diâmetro da ordem de 400 anos-luz não é o toróide de poeira central que colima a radiação nas galáxias com cone de ionização. O toro é bem menor, mas este disco de 400 anos-luz deve ser a estrutura externa que é o reservatório de matéria para alimentar o AGN central.

Outras evidências do cenário proposto acima para os AGNs incluem os cones de ionização, que são regiões de gás ionizado de alta excitação com forma aproximadamente cônica que seriam originadas pela ionização de massas de gás por radiação da fonte central colimada pelo toro de poeira que circunda o disco de acreção. A Fig. 9.3 da galáxia Seyfert NGC 5728 ilustra um cone de ionização.

O toro de poeira esconde a fonte central nas galáxias Seyfert 2, enquanto que nas Seyfert 1, como nos quasares, podemos observar a fonte central pelo fato da nossa linha de visada não intercerptar o toro. Veja abaixo um cartoon representando um toro de poeira escondendo o “monstro central”.

9.5 – Massa de Buracos Negros e Luminosidade de Eddington

Uma das características mais importantes das galáxias com núcleo ativo é a massa do buraco negro central. Uma estimativa do seu valor pode ser obtida a partir de duas hipóteses: isotropia e estabilidade da fonte. Dessa forma, a força exercida pela radiação (nos elétrons, que dominam a pressão de radiação) não deve superar a força da gravidade (nos prótons, que dominam a força da gravidade). Igualando-se essa força de radiação e a força da gravidade, obtemos uma luminosidade máxima para que um corpo permaneça em equilíbrio, chamada de luminosidade Eddington (em homenagem ao astrofísico que a derivou), que é:

(12)   \begin{equation*}  	L_E=\frac{4\pi Gcm_pM}{\sigma_e}=1,26\times10^{38}\left(\frac{M}{M_\odot}\right)ergs/s \end{equation*}

Analogamente podemos definir uma massa mínima para o corpo permanecer em equilíbrio. Expressando L em unidades de 1044 ergs/s (L44), a massa de Eddington é definida como:

(13)   \begin{equation*}  	M_E=8\times10^5L_{44}M_\odot \end{equation*}

Também é possível estimar a massa do buraco negro central de forma mais direta através do teorema do Virial. Obtem-se, para isto, uma estimativa da velocidade de nuvens de gás ou de estrelas em torno do buraco negro. No caso da região de linhas largas (Broad Line Region – BLR), a largura das linhas de emissão dá uma medida desta velocidade. Estimando a distância entre a BLR and a fonte central (através, por exemplo, de mapas de reverberação entre a fonte central e a BLR) pode-se obter uma estimativa da massa do buraco negro.

Outro parâmetro importante de um AGN é a taxa de acreção de massa, que depende basicamente da eficiência da conversão de matéria em energia, que é muito maior que na fusão nuclear. A energia da acreção de matéria pode ser expressa como:

(14)   \begin{equation*}  	E=\eta mc^2 \end{equation*}

onde ƞ é um coeficiente que expressa a eficiência da conversão de matéria em energia. A luminosidade é originada da taxa de acreção de massa dm/dt, que é a massa acretada em função do tempo. Podemos dizer que a luminosidade L do AGN se origina da diminuição da energia potencial de uma massa m que é capturada pelo buraco negro. Expressando a variação de energia potencial como:

(15)   \begin{equation*}  	L\sim\frac{dU}{dT}=\frac{GM\frac{dm}{dt}}{r} \end{equation*}

Ignorando efeitos relativísticos, a energia potencial “liberada” por uma massa m caindo a 5RSch (que é aproximadamente até onde se espera que se origine a maioria da radiação emitida) é

(16)   \begin{equation*}  	U=\frac{GMm}{5R_{Sch}}=\frac{GMm}{\left(\frac{10GM}{c^2}\right)}=0,1mc^2 \end{equation*}

O que mostra como se obtem uma eficiência muito maior para acreção gravitacional do que para fusão nuclear.

Voltando à luminosidade de Eddington, podemos obter a taxa de acreção de massa que é necessária para sustentar essa luminosidade limite:

(17)   \begin{equation*}  	M_E=\frac{L_E}{\eta c^2} \end{equation*}

Esta é a taxa de acreção de Eddington.


10. NGC 1097

A NGC 1097 é uma galáxia espiral barrada com núcleo LINER e tipo SBbc.

Esta galáxia foi estudada por Thaisa Storchi Bergmann com o objetivo de investigar a cinemática do gás emissor na região central. Para isto, foram obtidos espectros em torno da linha Hα (esta é uma linha de emissão do hidrogênio e é gerada quando um elétron passa do terceiro para o segundo nível de energia deste átomo, correspondendo a um comprimento de onda de 6563 Ångstrons).

O espectro nuclear obtido mostrou um perfil da linha Hα com duplo pico e largura ~ 20 000 km/s. Analogamente aos casos anteriormente discutidos, esta observação foi interpretada como sendo devida a gás girando a alta velocidade (10 000 km/s ) em um disco de acresção.

A figura abaixo mostra uma imagem da galáxia juntamente com o perfil espectral da linha Hα no espaço de velocidades (ou seja, o comprimento de onda da radiação já foi transformado em velocidade do gás). Um modelo simplificado para explicar o perfil é também apresentado: um disco de gás girando em torno do buraco negro central.

Fig. 10.1 – Imagem da galáxia NGC 1097, perfil nuclear da linha Hα (abaixo à esquerda), indicando a presença de um disco de gás (representado por um esquema acima à esquerda) girando com velocidades entre 5 000 e 10000 km/s em torno de um buraco negro central supermassivo (10⁸ Mꙩ).

Para se avaliar o significado das velocidades observadas, podemos fazer uma comparação: as máximas velocidades registradas para gás em rotação no disco de uma galáxia, devido ao potencial gravitacional da sua região central são da ordem de 250 a 300 km/s. Velocidades de rotação de milhares de km por segundo só podem ser produzidas por concentrações centrais de milhões a bilhões de massas solares dentro de regiões muito pequenas (de dias a meses-luz).

Através de um modelamento detalhado para o perfil de duplo pico da linha Hα, verificou-se que o mesmo pode ser reproduzido por emissão de um gás ionizado localizado nas partes externas de um disco de acreção em torno de um buraco negro supermassivo. Como o perfil é gerado nas partes externas do disco, a estrutura emissora é na verdade um anel. Uma hipótese para a formação deste anel é: uma estrela teria passado a uma distância do BN menor do que seu raio de maré. A enorme força de maré do BN sobre a estrela a destrói, e parte da matéria da estrela entra em órbita em torno do BN, formando o disco de gás (disco de acreção). Um esquema da captura de uma estrela por um buraco negro central é apresentado na figura abaixo (a partir de Rees 1997). O raio de maré é rt.

Estes resultados foram publicados em vários artigos científicos no periódico Astrophysical Journal: Storchi-Bergmann et al. 1993, ApJ, 410L,11; 1995, 443,617S; 1997, 489,87. Em Storchi-Bergmann et al. 2003, 598, 956, os autores modelaram a evolução do perfil de duplo pico, onde chegaram à conclusão que o disco (ou anel) é circular mas tem uma assimetria na sua emissão produzida por um braço espiral presente no disco.

Desde da descoberta do perfil transiente no núcleo da NGC 1097, o mesmo tem sido monitorado por Storchi-Bergmann e colaboradores. De 1991 a 2001 fizeram-se observações anuais dos perfis, mas no final de 2010 e no ano de 2011 foram feitas observações semanais, e se descobriu que o perfil varia nestas escalas de tempo (uma semana), indicando que o raio médio do disco é da ordem de uma semana-luz. Além disso, através da variação das intensidades dos picos azul e vermelho do perfil de duplo pico, verificou-se também que o braço espiral dá uma volta completa num intervalo de tempo de 1 ano e meio ao invés de 5 anos e meio como tinha sido anteriormente encontrado a partir das observações anuais (1991-2001). Concluiu-se que o resultado anterior se deveu a uma amostragem muito esparsa das variações do perfil.


11. Notícias

Para Notícias sobre Buracos Negros consulte os sites:

Abaixo algumas notícias recentes que traduzímos para o português:

Dois estudos encontram uma estrela sendo “devorada” por um Buraco Negro Supermassivo

Dois estudos apontam a possibilidade de um incidente cósmico que vem emitindo raios-X na direção da Terra desde Março de 2011. O evento foi primeiramente detectado pelo satélite da Swift, da NASA, na forma de um aumento na emissão de alta energia vindo do núcleo da galáxia Draco. A partir da detecção, astrônomos resolveram a fonte como sendo o despertar da atividade de um Buraco Negro supermassivo no centro da galáxia devido à captura e destruição de uma estrela.

O primeiro estudo, chefiado por David Burrows (professor de astronomia de Penn State University), que incluiu cientistas da NASA, reporta observações em raios-X e gama com o Swift além de outros detectores. O segundo estudo foi realizado pelo pós-doutor Ashley Zauderer do Harvard-Smithsorian Center for Astrophysics, Massachusstes, que consistiu em observar a emissão correspondente em rádio, com instrumentos como o Extra Very Large Array (EVLA).

O Buraco Negro central na galáxia de Draco teria uma massa da ordem de 107 M, e a interpretação para o ocorrido seria de que a estrela ao ser atraída pelo campo gravitacional foi destruída ao chegar a uma distância menor do que o raio de Maré do BN. A matéria da estrela (gás) capturada teria formado um disco de acreção ao redor do Buraco Negro (BN), que rapidamente se aqueceu atingindo milhões de graus kelvin. O gás mais interno ao disco espirala em direção ao BN, onde o intenso campo magnético cria dois “funis” opostos que expulsam partículas, dando origem aos jatos. Estes jatos têm velocidades maiores que 90% da velocidade da luz e se formam ao longo do eixo de rotação do disco. No caso da fonte estudada um desses jatos estaria direcionado para a Terra. Normalmente a radiação originada da destruição de uma estrela por forças de maré de um BN seria observada no óptico e no ultravioleta. O fato de ser detectada uma forte emissão em raio-X é explicado pelo fenômeno “relativistic beaming”, pelo fato de um dos jatos estar direcionado para a Terra.

Quando descoberto (28 de Março), o evento foi interpretado com um gamma-ray burst (seção 7), mas como a fonte continuou brilhante e com novos picos de emissão, astrônomos perceberam que a explicação mais plauisível seria a captura e destruição de uma estrela por um BN. Em 30 de Março, observações da equipe de Zauderer com o EVLA encontraram uma fonte muito brilhante em rádio na galáxia Draco perto da posição da fonte em raio-X. Esses dados foram a primeira evidência de que a galáxia, a fonte em rádio e o evento do Swift estão conectados. Para mais informações visite o site: http://www.nasa.gov/mission_pages/swift/bursts/devoured-star.html.

Buracos Negros são observados com diferença de idade de apenas centenas de milhões de anos para o Big Bang

O satélite de raios-X Chandra obteve uma observação profunda de uma região conhecida como do Deep Field South (CDFS), apontando o Chandra por mais de 6 semanas para um mesmo lugar no espaço. Ao combinar estas imagens em raios-X com imagens profundas anteriores da mesma região, obtidas no óptico e no infravermelho com o telescópio espacial Hubble, astrônomos descobriram que Buracos Negros (BN) eram muito comuns no universo jovem, alguns datando de aproximadamente 800 milhões de anos após o Big Bang. Se antes não se tinha certeza da existência de BN tão antigos, as observações em raios-X revelam até características do comportamento dos mesmos, mostrando que eles crescem mais “violentamente”, ou seja, a taxas maiores do que se previa.

Esse crescimento super dimensionado significa que esses BNs seriam versões menos luminosas do que os conhecidos Quasares, sendo 100 vezes menos luminosos e com massas estimadas dos BNs mil vezes menor do que os BNs dos Quasares. Estes BNs jovens vão depois crescer para dar origem aos BNs mais massivos. Esta população de Jovens BNs tinha sido anteriormente prevista, mas jamais observada. A observação só foi possível porque os raios-X de mais alta energia conseguem atravessar as camadas de poeira que envolviam os BNs no primeiro bilhão de anos do Universo, enquanto que outros comprimentos de onda, como os da radiação visível, não conseguem atravessar.

Para mais informações acesse: http://www.nasa.gov/mission_pages/chandra/news/H-11-183.html.

Quasar mais distante de que se tem notícia foi descoberto por grupo de astrônomos. A emissão do objeto astronômico levou 12.9 bilhões de anos para chegar até a Terra, o que significa que foi emitida cerca de 770 milhões de anos após o Big Bang

A descoberta foi descrita na edição desta quinta-feira (30/06) da revista Nature. O quasar foi identificado por meio de alguns telescópios de grande porte, principalmente o Very Large Telescope (VLT) do European Southern Observatory (ESO ou Observatório Europeu do Sul), organização composta por 15 países, dos quais o Brasil é o único não europeu. O VLT está localizado em Cerro Paranal, no deserto de Atacama, no norte do Chile.

A emissão de luz do quasar, produzida por um buraco negro com massa 2 bilhões de vezes maior do que a do Sol, é de longe o objeto mais brilhante já identificado da infância do Universo.

“Esse quasar é uma marca fundamental do Universo inicial. Trata-se de um objeto muito raro que nos ajudará a compreender como os buracos negros supermassivos cresceram alguns milhões de anos após o Big Bang”, disse Stephen Warren, do Imperial College London, um dos coordenadores do estudo.

Quasares são formações astronômicas distantes – não se encontram na Via Láctea – que se acredita serem alimentados pelos discos de acreção de buracos negros supermassivos no centro de galáxias.

O quasar agora descoberto, denominado ULAS J1120+0641, não é o objeto mais distante já identificado – a explosão de raios gama denominada eso0917, por exemplo, ocorreu cerca de 170 milhões de anos antes –, mas é mais brilhante que qualquer outro desses objetos do Universo primordial.

A massa do buraco negro no centro do quasar é cerca de 2 bilhões de vezes a do Sol. Segundo o estudo, é difícil explicar a ocorrência de uma massa com tal dimensão tão pouco tempo após o Big Bang.

Teorias atuais para o crescimento de buracos negros supermassivos estimam um aumento lento na massa de objetos compactos, à medida que eles atraem matéria de seu entorno.

O artigo A luminous quasar at a redshift of z=7.085 (doi:10.1038/nature10159), de Stephen J. Warren e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em : http://www.nature.com/nature/journal/v474/n7353/full/nature10159.html

Observatório Chandra faz imagem em raio-X do fluxo de gás em direção a um Buraco Negro Supermassivo

O satélite de raios-X Chandra obteve imagens inéditas que contribuem para a resolução de duas questões de suma importância da Astrofísica: compreender como um Buraco Negro (BN) cresce no centro de uma galáxia e como a matéria se comporta sob seu intenso campo gravitacional. O BNS em questão se encontra na galáxia NGC 3115, localizada a 32 milhões de anos-luz. Outras imagens desse tipo já foram obtidas com o Chandra, mas nenhuma com uma assinatura tão clara do comportamento de gás quente no centro de uma galáxia. Observando o gás a diferentes distâncias do BNS é possível obter sua temperatura e derivar uma distância limite ao BNS dentro da qual o gás é dominado pelo campo gravitacional do BNS, conhecido como “raio de Bondi”. O gás existente na região central flui em direção ao BNS e se comprime, ficando mais brilhante e mais quente dentro do raio de Bondi. As observações em raios-X da região central de NGC 3115 mostraram que o aumento da temperatura ocorre a aproximadamente 700 anos-luz do BNS, revelando a localização do raio de Bondi. O raio de Bondi depende da massa do BNS e assim foi possível obter, a partir das observações, uma massa de 2 bilhões de vezes a do Sol. Este alto valor faz deste BNS mais próximo da Terra com uma massa tão grande. O estudo também mostra que o gás mais próximo ao BN é mais denso que o mais distante, como predito. Usando as propriedades observadas e predições teóricas, obteve-se a taxa de massa capturada pelo BNS dentro do raio de Bondi: cerca de 2% de uma massa solar por ano.

Fazendo algumas suposições de quanto da energia do gás se converte em radiação, os cientistas esperariam encontrar uma fonte 1 milhão de vezes maior do que a encontrada em NGC 3115. Existem pelo menos duas possibilidades de explicar essa discrepância: ou há muito menos material que cai no BNS do que o que cruza o raio de Bondi, ou a conversão de energia em radiação é muito menos eficaz do que o previsto.

Mais informações podem ser encontradas em: http://chandra.harvard.edu e http://www.nasa.gov/chandra.


12. Bibliografia

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