Determinação de Longitude: Método das Alturas Iguais

Sabemos que as estrelas atingem sua máxima altura no céu ao atravessarem o meridano astronômico de um observador em seu movimento diurno de leste para oeste. Vimos que é possível, conhecida a declinação δ de uma estrela, determinar a latitude φ de um local pela determinação de sua distância zenital na culminação, zmin. Discutimos métodos que permitem determinar zmin a partir de leituras verticais obtidas com um teodolito (LV) corrigidas para efeitos instrumentais e atmosféricos.

Métodos de determinação da longitude λ também existem. Analogamente à latitude, podemos determinar λ apenas pela observação da estrela durante a passagem meridiana. Como fazer isso? Lembrando que a longitude é dada simplesmente pela diferença de hora, sideral ou solar, entre o nosso meridiano e o de Greenwich em um dado instante físico no tempo:

λ = HoraG - Hora = SG - S = MG - M

Conhecidas, para um mesmo instante, as horas siderais local e em Greenwich, temos imediatamente a longitude. A hora sideral local em um dado instante é simplesmente a ascensão reta do círculo horário que coincide com o meridiano naquele instante. Assim, no instante em que uma estrela de ascensão reta α culmina para um dado observador sabemos que a hora sideral local é simplesmente:

S = α

Se pudermos determinar a hora sideral em Greenwich neste mesmo instante, saberemos então a longitude do local. A hora sideral em Greenwich, SG, pode ser determinada se anotarmos a hora legal em que se deu a culminação da estrela. Seja HL esta hora. Conhecido o fuso F do local, sabemos que a hora solar média em Greenwich (ou seja, o tempo universal TU) será:

TU = MG = HL - F

A hora sideral em Greenwich segue facilmente pela fórmula:

SG = S0 + MG(1+η) = S0 + (HL-F)(1 + η)

onde S0 é a hora sideral em Greenwich à 0h TU no dia da observação, que pode ser tirada das Efemérides e η = 0.00273790926. Tudo que precisamos portanto é determinar a hora legal HL exata em que uma dada estrela de ascensão reta conhecida culmine no nosso meridiano.

Um problema do método descrito acima é o de que necessitamos conhecer com bastante precisão o meridiano local, de forma a poder observar a estrela e anotar a hora legal no instante de sua culminação. Uma maneira de contornar este problema é usar o fato de que o movimento diurno de uma estrela é simétrico com relação à passagem meridiana. Ou seja, o intervalo de tempo entre o nascer e a passagem meridiana é igual ao intervalo decorrido entre esta última e o ocaso. O mesmo se aplica às passagens da estrela por um outro almucântar diferente de h = 0°. Podemos então escolher um determinado almucântar e observar a estrela cruzá-lo tanto a leste quanto a oeste do meridiano. Sabemos, pela simetria do movimento diurno, que a hora legal da culminação desta estrela será igual à média das horas legais correspondentes a estes dois instantes:

HL = (HLL + HLO)/2

onde, na expressão acima, HLL e HLO são, respectivamente, as horas legais em que a estrela atravessa o círculo de altura constante a leste e a oeste do meridiano. De resto, a determinação de λ é igual à descrita anteriormente.

Por envolver observações de uma mesma estrela ao cruzar por duas vezes um mesmo almucântar, este método de determinação da longitude é chamada de método das alturas iguais. A figura abaixo procura mostrar a essência do método, que consiste em anotar os valores de hora legal nos instantes em que a estrela atravessa os pontos P1 e P2, respectivamente a oeste e a leste do meridiano astronômico.

 

Procedimento Observacional

1 - Como de hábito, devemos escolher uma estrela que saibamos que vai estar próxima do meridiano no intervalo de hora legal disponível para as observações. Isso implica uma estimativa inicial e aproximada da longitude e a leitura de S0 das Efemérides. A primeira nos permite converter o intervalo de hora legal disponível para intervalo de hora solar média local. A segunda nos permite converte o intervalo de hora solar média local para intervalo de hora sideral. A estrela escolhida deve ter ascensão reta contida dentro deste último intervalo.

2 - Sabemos que a estrela culminará no instante em que a hora sideral local for igual à sua ascensão reta. Conhecida sua declinação δ (bem como a latitude do observador φ, podemos determinar a altura da estrela na culminação, hmax. Temos necessariamente que escolher um almucântar abaixo deste valor. Para não termos que esperar muito tempo entre a travessia do almucântar a leste e a travessia posterior a oeste do meridiano, convém escolher o almucântar de h = hmax - 2° ou algo assim. Quanto mais baixo o valor de h, maior o intervalo de tempo decorrido entre os dois instantes em que a estrela assume aquele valor de altura. Note que um intervalo grande de tempo pode implicar variações nas condições atmosféricas e, por conseguinte, erros na determinação da longitude causados por efeitos variáveis de refração atmosférica.

3 - Na noite de observação, como já sabido, deve-se proceder ao nivelamento e calibração do teodolito, bem como à estimativa aproximada do meridiano, materializado pelo valor de azimute de alguma mira fixa, suposto determinado anteriormente (ver, por exemplo, as práticas de determinação do azimute de uma mira usando a passagem meridiana ou a elongação de uma estrela). Fixa-se o teodolito no nível vertical desejado e mira-se aproximadamente na direção à estrela, até que ela entre no campo do teodolito e cruze o retículo horizontal. Anota-se então o valor de HLL. Mantendo sempre travada a vertical do teodolito, procura-se acompanhar a estrela em azimute. Eventualmente ela voltará a aparecer no campo do teodolito, desta vez em movimento descendente. Anota-se então o valor de HLO no instante em que a estrela cruza novamente o retículo horizontal.

Alternativamente à estratégia acima, pode-se simplesmente monitorar os valores de leitura vertical (LV) da estrela, anotando-os em uma tabela juntamente com os valores de hora legal (ou instante cronométrico I) em que foram feitas estas leituras. De posse destes dados, pode-se, como já foi feito em determinações anteriores, ajustar-se uma parábola aos pontos e determinar, a partir do ajuste, os valores de hora legal que correspondem a um determinado valor de leitura vertical. A figura abaixo mostra os pontos obtidos em experimento similar.

Pela figura, vemos que um valor de almucântar que poderia ser usado na determinação da longitude seria o correspondente a LV = 39.4°, por exemplo. Alternativamente, podemos usar o ajuste à parábola obtido para determinar diretamente o valor de hora legal correspondente à culminação, em procedimento semelhante ao que foi descrito para práticas anteriores. Note que medidas de instante cronométrico I têm que ser convertidas em valores de Hora Legal, o que exige conhecimento do estado do cronômetro (E) usado: HL = I + E. Outra consideração importante diz respeito à refração. Se as condições atmosféricas variarem entre a fase ascendente da estrela (a leste do meridiano) e a fase descendente (a oeste), correções para este efeito têm que ser aplicadas às medidas de LV. Já o erro zenital do teodolito não precisa ser corrigido, pois é uma constante, que não terá efeito sobre a determinação de HL.

4 - Conforme dito anteriormente, conhecida a hora legal da passagem meridiana, podemos determinar a hora sideral em Greenwich correspondente a este instante. Finalmente, teremos então λ = SG - S= SG - α.


Outras referências bibiliográficas: Determinações Astronômicas, F. Hatschbach; Geodésica Elementar e Astronomia de Campo, J. Haertel; Notas de Aula de J.M. Arana.



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Basilio Santiago, santiago@if.ufrgs.br