Da mesma maneira que nos módulos didáticos anteriores desta disciplina, como ilustração na apresentação do programa HotPotatoes será utilizado um assunto específico de Física. Esse programa permite a criação de exercícios interativos em todo e qualquer assunto. Portanto, será escolhido como exemplo para abordar o uso do HotPotatoes a descrição dos resultados obtidos e dos conceitos envolvidos em um dos experimentos típicos dos primórdios da Física Quântica.
É comum quando se introduz os conceitos básicos da Física Quântica, como o tratamento das propriedades ondulatórias e corpusculares da luz, o estudo de vários experimentos e seus resultados, entre estes o efeito fotoelétrico, o experimento de fenda dupla de Young, o efeito Compton. Escolher-se-á como conteúdo para o exemplo de uso do software HotPotatoes o efeito Compton, que evidencia diretamente as propriedades corpusculares da luz, em sua interação com a matéria, e esse tratamento é adequado ao escopo desse curso.
Arthur A. Compton, por volta de 1920, observou o espalhamento de raios X, de comprimento de onda
O alvo de grafite espalha a radiação eletromagnética incidente em todas as direções. Compton analisou a radiação espalhada em diversos ângulos usando um espectrômetro para raios X.
Como resultado do espalhamento de raios X por elétrons livres, foram observados:
Compton propôs que o deslocamento de Compton, ou seja, a diferença entre os comprimentos de onda espalhado e incidente, Δλ=(λ- λ0), pudesse ser completamente determinado pelo ângulo de espalhamento θ.
Para explicar esses resultados, Compton tratou os raios X como fótons - partículas de energia dada pela relação E = hν, onde ν é sua frequência e h é a constante de Planck (h= 6,63 x 10-34 J.s= 4,14 x 10-15 eV.s). Além da energia, a radiação eletromagnética carrega um momentum linear, ou quantidade de movimento.
Na Figura 5.2.1 são apresentados um esquema do experimento de Compton e um diagrama do espalhamento.
(a) | (b) |
O módulo p do vetor momentum linear de um fóton depende de sua energia, E, e de sua velocidade, c (a velocidade da luz) através da relação:
Compton descreveu o espalhamento como uma colisão entre um fóton, de energia E0 e momentum linear de módulo p0, e um elétron livre, inicialmente em repouso. Foi observado que, após a colisão e devido ao recúo do elétron, o fóton espalhado tem energia menor, E<E0, o que é equivalente a ter um maior comprimento de onda λ>λ0.
Para obter a dependência de λ com o ângulo de espalhamento θ, é necessário aplicar as leis de conservação de energia e de momentum linear à colisão. Como o fóton é uma partícula relativística e o elétron espalhado neste experimento atinge velocidades próximas da velocidade da luz, deve-se usar a forma relativística das leis de conservação.
Seja o momentum linear do fóton incidente, com módulo dado por:
seja o momentum linear do elétron após a colisão. (O momentum inicial do elétron é nulo.)
Como resultado da conservação do momentum linear total, obtém-se (ver o gráfico da direita da Figura 5.2.1.b):
A energia do fóton incidente é
O princípio de conservação da energia pode, então, ser escrito como (ver o gráfico da esquerda da Figura 5.2.1.b):
ou:
Finalmente, usando-se as Equações 5.2.2 e 5.2.3 na Equação 5.2.14, obtém-se o resultado:
Como conclusão, pode-se explicar o espalhamento da radiação eletromagnética pelos elétrons livres como uma colisão elástica entre partículas relativísticas - a colisão elástica entre um fóton e um elétron em repouso no referencial do observador. Para tal, a partir das equações relativísticas de conservação da energia e do momentum linear, obtém-se a equação que relaciona o comprimento de onda da radiação incidente λ0 com o comprimento de onda da radiação espalhada λ e com o ângulo de espalhamento θ. Observe que Δλ, o deslocamento de Compton, depende apenas do ângulo de espalhamento θ e não depende do comprimento de onda inicial do fóton λ0.
A Figura 5.2.2 mostra o resultado obtido por Compton para a intensidade dos raios X espalhados, para diversos ângulos de espalhamento, como função do comprimento de onda do fóton espalhado.
[Observação: um dos picos que aparecem nos gráficos da Figura 5.2.2 corresponde à situação quando o comprimento de onda do fóton não muda após o espalhamento. Isto pode ser explicado da seguinte forma: supõe-se que o elétron com o qual o fóton colide está livre; essa suposição é válida, pois mesmo que o elétron esteja ligado ao átomo antes da colisão, se a energia cinética recebida pelo elétron na colisão for muito maior do que a sua energia de ligação, ele pode ser considerado como um elétron livre. Porém, para elétrons fortemente ligados ao átomo ou se a energia E0 do fóton for comparável à energia de ligação do elétron ao átomo, é possível que o elétron não seja retirado do átomo e a colisão se dá entre o fóton e o átomo como um todo, o qual recua. Sendo assim e considerando-se a massa do átomo (Mátomo >> me), o Δλ será muito pequeno para ser detectado, e o comprimento de onda do fóton espalhado é praticamente o mesmo que aquele do fóton incidente, , como obtido no experimento e mostrado na Figura 5.2.2 - ver o pico na posição do menor comprimento de onda (λ ~ 71,3 pm).]
Pode-se, agora, usar o HotPotatoes para verificar a compreensão dos conceitos envolvidos no estudo do efeito Compton através da elaboração de exercícios interativos!