Image
Image
Métodos Computacionais no Ensino da Física
Planilha I
Planilha II
Modellus I
Modellus II
HotPotatoes
CMapTools
5 HotPotatoes

5.2 Problema exemplo

Da mesma maneira que nos módulos didáticos anteriores desta disciplina, como ilustração na apresentação do programa HotPotatoes será utilizado um assunto específico de Física. Esse programa permite a criação de exercícios interativos em todo e qualquer assunto. Portanto, será escolhido como exemplo para abordar o uso do HotPotatoes a descrição dos resultados obtidos e dos conceitos envolvidos em um dos experimentos típicos dos primórdios da Física Quântica.

É comum quando se introduz os conceitos básicos da Física Quântica, como o tratamento das propriedades ondulatórias e corpusculares da luz, o estudo de vários experimentos e seus resultados, entre estes o efeito fotoelétrico, o experimento de fenda dupla de Young, o efeito Compton. Escolher-se-á como conteúdo para o exemplo de uso do software HotPotatoes o efeito Compton, que evidencia diretamente as propriedades corpusculares da luz, em sua interação com a matéria, e esse tratamento é adequado ao escopo desse curso.

Arthur A. Compton, por volta de 1920, observou o espalhamento de raios X, de comprimento de onda λ0 = 7,0 nm (=7,0 x 10-9 m), por um alvo de grafite (que é uma forma de carbono). Como a energia dos raios X incidentes é muito maior que a energia de ligação dos elétrons ao átomo de carbono (sobretudo os mais externos), sua energia de ligação pode ser desprezada e eles considerados como elétrons livres. Compton supôs, então, que os raios X pudessem ser espalhados pelos elétrons do átomo, e que cada elétron se comportaria como se estivesse livre.

O alvo de grafite espalha a radiação eletromagnética incidente em todas as direções. Compton analisou a radiação espalhada em diversos ângulos usando um espectrômetro para raios X.

Como resultado do espalhamento de raios X por elétrons livres, foram observados:

Compton propôs que o deslocamento de Compton, ou seja, a diferença entre os comprimentos de onda espalhado e incidente, Δλ=(λ- λ0), pudesse ser completamente determinado pelo ângulo de espalhamento θ.

Para explicar esses resultados, Compton tratou os raios X como fótons - partículas de energia dada pela relação E = , onde ν é sua frequência e h é a constante de Planck (h= 6,63 x 10-34 J.s= 4,14 x 10-15 eV.s). Além da energia, a radiação eletromagnética carrega um momentum linear, ou quantidade de movimento.

Na Figura 5.2.1 são apresentados um esquema do experimento de Compton e um diagrama do espalhamento.

Image Image
(a) (b)

Figura 5.2.1: Em (a) é apresentado um esquema do experimento de Compton; e em (b), um diagrama do espalhamento, onde são mostradas as energias e os momenta lineares do fóton incidente, do elétron e do fóton espalhado; θ é o ângulo de espalhamento entre as direções das radiações espalhada e incidente.

O módulo p do vetor momentum linear de um fóton depende de sua energia, E, e de sua velocidade, c (a velocidade da luz) através da relação:

.
(5.2.1)

Compton descreveu o espalhamento como uma colisão entre um fóton, de energia E0 e momentum linear de módulo p0, e um elétron livre, inicialmente em repouso. Foi observado que, após a colisão e devido ao recúo do elétron, o fóton espalhado tem energia menor, E<E0, o que é equivalente a ter um maior comprimento de onda λ>λ0.

Para obter a dependência de λ com o ângulo de espalhamento θ, é necessário aplicar as leis de conservação de energia e de momentum linear à colisão. Como o fóton é uma partícula relativística e o elétron espalhado neste experimento atinge velocidades próximas da velocidade da luz, deve-se usar a forma relativística das leis de conservação.

  1. Princípio de conservação do momentum linear

Seja o momentum linear do fóton incidente, com módulo dado por:

;
(5.2.2)
seja o momentum linear do fóton espalhado, com módulo dado por:
;
(5.2.3)

seja o momentum linear do elétron após a colisão. (O momentum inicial do elétron é nulo.)

Como resultado da conservação do momentum linear total, obtém-se (ver o gráfico da direita da Figura 5.2.1.b):

.
(5.2.4)
Sustituindo-se as Equações 5.2.2 e 5.2.3 na Equação 5.2.4, obtém-se a expressão:
.
(5.2.5)

  1. Princípio de conservação da energia

A energia do fóton incidente é

;
(5.2.6)
a energia do fóton espalhado é
.
(5.2.7)
A energia cinética do elétron após a colisão não pode ser escrita simplesmente como (me v2) / 2, pois o elétron que recua alcança velocidades próximas da velocidade da luz e deve ser tratado, também, como uma partícula relativística:
,
(5.2.8)
onde me (=9,1 x 10-31 kg) é a massa de repouso do elétron e pe é o módulo do seu momentum linear.

O princípio de conservação da energia pode, então, ser escrito como (ver o gráfico da esquerda da Figura 5.2.1.b):

,
(5.2.9)

ou:

.
(5.2.10)
Elevando-se a Equação 5.2.10 ao quadrado e isolando (pe)2, encontra-se:
.
(5.2.11)
Expandindo o termo (...)2 na Equação 5.2.11 e, então, igualando-se as relações para (pe)2 fornecidas pelas Equações 5.2.5 e 5.2.11, obtém-se:
. (5.2.12)
Isto resulta em:
.
(5.2.13)
Ou ainda,
.
(5.2.14)

Finalmente, usando-se as Equações 5.2.2 e 5.2.3 na Equação 5.2.14, obtém-se o resultado:

,    (5.2.15)
que nada mais é do que o deslocamento de Compton,
.
(5.2.16)
Nesta expressão, o coeficiente de proporcionalidade é chamado de comprimento de onda Compton do elétron, e vale λC=2,426x10-12 m. A expressão para o deslocamento de Compton fica:
.
(5.2.17)

Como conclusão, pode-se explicar o espalhamento da radiação eletromagnética pelos elétrons livres como uma colisão elástica entre partículas relativísticas - a colisão elástica entre um fóton e um elétron em repouso no referencial do observador. Para tal, a partir das equações relativísticas de conservação da energia e do momentum linear, obtém-se a equação que relaciona o comprimento de onda da radiação incidente λ0 com o comprimento de onda da radiação espalhada λ e com o ângulo de espalhamento θ. Observe que Δλ, o deslocamento de Compton, depende apenas do ângulo de espalhamento θ e não depende do comprimento de onda inicial do fóton λ0.

A Figura 5.2.2 mostra o resultado obtido por Compton para a intensidade dos raios X espalhados, para diversos ângulos de espalhamento, como função do comprimento de onda do fóton espalhado.

Image
Figura 5.2.2: São apresentados os resultados obtidos por Compton para a intensidade dos raios X espalhados como função do comprimento de onda do fóton espalhado, medido em pm(=10-12 m), para o mesmo valor de λ0 e para quatro ângulos de espalhamento. No topo da figura, à esquerda: θ=0°, à direita: θ=45°; na base da figura, à esquerda: θ=90°, à direita: θ=135°.[Fonte: Halliday,D.; Resnick, R. Fundamentos de Física, V.4, Figura 38.4]

[Observação: um dos picos que aparecem nos gráficos da Figura 5.2.2 corresponde à situação quando o comprimento de onda do fóton não muda após o espalhamento. Isto pode ser explicado da seguinte forma: supõe-se que o elétron com o qual o fóton colide está livre; essa suposição é válida, pois mesmo que o elétron esteja ligado ao átomo antes da colisão, se a energia cinética recebida pelo elétron na colisão for muito maior do que a sua energia de ligação, ele pode ser considerado como um elétron livre. Porém, para elétrons fortemente ligados ao átomo ou se a energia E0 do fóton for comparável à energia de ligação do elétron ao átomo, é possível que o elétron não seja retirado do átomo e a colisão se dá entre o fóton e o átomo como um todo, o qual recua. Sendo assim e considerando-se a massa do átomo (Mátomo >> me), o Δλ será muito pequeno para ser detectado, e o comprimento de onda do fóton espalhado é praticamente o mesmo que aquele do fóton incidente, , como obtido no experimento e mostrado na Figura 5.2.2 - ver o pico na posição do menor comprimento de onda (λ ~ 71,3 pm).]

Pode-se, agora, usar o HotPotatoes para verificar a compreensão dos conceitos envolvidos no estudo do efeito Compton através da elaboração de exercícios interativos!