Antes de começar a falar propriamente da situação problema vou desenvolver um pouco as idéias de obstáculos e dificuldades que acho que será importante para o nosso assunto principal. É necessário que fique clara a diferença entre os dois, e na física é fácil achar a diferença.

        Dificuldades englobam uma série de coisas que muitas vezes ficam fora do nosso alcance, como por exemplo, alunos de uma escola que não têm perspectiva de fazer faculdade ou até mesmo alunos com deficiência de aprendizagem por causa de fome e infinidades de dificuldades que não precisam ser ligadas a matéria de física ou a qualquer conteúdo ou ainda dificuldades que estão ao nosso alcance como, por exemplo, alunos com séria deficiência em matemática, sem saber multiplicar ou dividir. É possível pensar em infinitos casos porque existem infinitas situações.

        Obstáculos são as barreiras que nós temos que fazer nossos alunos transpor para chegar ao conhecimento que, hoje em dia, é tido como válido na física. Todos nós, espero que não mais, já pensamos intuitivamente, o que significa dizer que, devido às experiências que vivemos ao longo da vida, fomos induzidos à algumas teorias que estariam absolutamente corretas se vivêssemos antes do século dezessete: são as concepções alternativas. Nosso papel é ajudar o aluno a ter uma consciência crítica a respeito da natureza e seus fenômenos. Um dos exemplos mais simples que me vem à cabeça é o fato de alunos que chegam ao primeiro ano do ensino médio, conforme presenciei este ano, acharem que a Terra está parada pois não se pode observar (sentir) que a Terra gira e, também que o dia e a noite se dão simplesmente o Sol gira em torno do Planeta. Pode-se dizer que esta é uma concepção que estaria correta sob análise de referenciais, mas é comum observar alunos que têm essa como verdade única e indiscutível.

        Imaginem vocês um professor de física que tem que dar uma manhã de aula, essa é a minha experiência, período natural de sonolência para alguns adolescentes, tendo por volta de quarenta alunos por turma, totalizando três turmas em média por manhã. Imaginem quarenta jovens com vidas diferentes e repletos de assuntos, em princípio mais interessantes do que a física, e eu diria que em determinadas situações isso é verdade, para serem contados aos colegas durante a aula. E lá vai o professor de física desenvolver um conteúdo do currículo, por exemplo, Movimento Retilíneo Uniforme que requer um mínimo de habilidade matemática, como fazer gráficos, que geralmente assustam a maioria dos estudantes. Fica assim caracterizada uma primeira dificuldade: conseguir a atenção dos quarenta alunos!

        A situação problema vem auxiliar o professor porque trata da formulação de problemas para serem levados à sala de aula. É mais ou menos como discutir diretamente a física na prática, levantando uma questão e, a partir dela, trabalhar conceitos a fim de alcançar um objetivo, ultrapassar obstáculos. Além de instigar a curiosidade, eles se tornam parcialmente responsáveis pelo desenvolvimento do conteúdo, já que o campo de discussões fica muito rico e o assunto pode tomar um caminho diferente do esperado. O aluno fica responsável, de certa forma, pelo seu crescimento, já que pode pesquisar e trabalhar o assunto proposto com uma certa liberdade. O professor tem que ser um bom formulador de problemas, que tenham a ver com a realidade, para que a física não fique desacreditada. Vem-me à cabeça um curso superior de alguma faculdade americana que começa com a seguinte questão: A luz é onda ou é partícula? O problema já é colocado no primeiro semestre, mesmo que os alunos não tenham noção de quântica ou óptica. Mas para que uma situação problema não se torne uma dificuldade para o professor ou para o curso, é necessário conhecimento e planejamento do que será desenvolvido para alcançar o objetivo. Na aula em que será introduzido o problema da Terra girando em torno do Sol, fica muito mais fácil e legal de trabalhar se iniciarmos a aula com a simples pergunta: O que vocês acham, o Sol gira em torno da Terra ou a Terra gira em torno do Sol? O professor tem que estar preparado para discutir assuntos que os levem à resposta da pergunta e também assuntos que surjam simplesmente por curiosidades de alunos que aproveitam a oportunidade para indagar sobre coisas dais quais já leram ou já ouviram falar, como por exemplo, podem surgir nessa discussão perguntas sobre o Sol, a natureza do calor, estações do ano, expansão do universo e diversos assuntos. O planejamento é importantíssimo para que não esqueçamos o objetivo. Se surgirem questões extras, será ótimo porque o primeiro passo para ser professor é despertar curiosidade sobre a natureza e procurar explicar seus fenômenos.

Gustavo Andrade