Pós-escrito

M.A Moreira

        O uso de mapas conceituais como recurso instrucional não é mais novidade. Trata-se de uma estratégia originalmente desenvolvida pelo Professor Joseph Novak e seus estudantes de pós-graduação, em meados dos anos setenta na Universidade de Cornell, que hoje se utiliza com alunos de qualquer idade em qualquer disciplina. (Alguns dos exemplos apresentados no artigo são de 1977 e algumas das referências são também desse época. )
        Contudo, o amplo uso dos mapas conceituais que se observa atualmente trouxe consigo algumas distorções que tentarei discutir neste pós-escrito, redigido dez anos após a primeira versão do artigo.
        Mapas conceituais tipo "guarda-chuva", como o da figura P.S.1 (que segue o modelo da figura 1 e está bem ilustrado nas figuras 2,4,5 e outras), são muito parecidos com quadros-sinóticos de conceitos. Quadros-sinóticos são úteis para uma vista conjunta de um todo e suas partes com fins instrucionais, mas é difícil considerá-los uma inovação didática ou uma estratégia metacognitiva como pretende-se que sejam os mapas conceituais.


        Esse tipo de mapa conceitual é muito comum. É também usual encontrar professores dizendo que já usavam mapas conceituais muito antes de terem ouvido falar neles. Na verdade, o que eles utilizavam eram quadros-sinóticos e este conhecimento prévio serviu de idéia-âncora (subsunçor) para dar significado ao conceito de mapa conceitual, de tal maneira que o interpretaram apenas como um novo tipo de quadro-sinótico (um caso de aprendizagem significativa subordinada derivativa!).
           Já fiz muitos desse mapas e inclui vários deles neste artigo, mas hoje sou crítico desse modelo na medida em que tais mapas são confundidos com simples quadro-sinóticos classificatórios. Mapas conceituais não são quadros-sinóticos. Em um mapa conceitual não se busca apresentar em um diagrama as "partes"de um conceito. (Conceitos têm significados, não partes.) também não se trata de classificar conceitos. Se trata, isso sim, de identificar os conceitos-chave de um certo conhecimento, de organizá-los em um diagrama com algum tipo de hierarquia (quer dizer, diferenciando, de alguma maneira, entre conceitos subordinado, superordenados, inclusivos, específicos, exemplos) e de relacioná-los explicitamente (através de linhas conectando conceitos e de palavras-chave sobre tais linhas dando significados às relações).
        Além disso, mapas conceituais tipo quadro-sinótico tendem a enfatizar apenas relações (geralmente pobres) de subordinação, omitindo importantes relações horizontais e outras relações cruzadas que são cruciais para a reconciliação integrativa e para a aprendizagem significativa superordenada. As relações conceituais e a estrutura conceitual de um certo corpo de conhecimento são muito mais complexas do que o que se pode obter através de um mapa conceitual, em particular do tipo quadro-sinótico.
        Outra interpretação errônea acerca dos mapas conceituais é pensá-los ou construí-los como diagrama de fluxo. Muita gente utiliza várias setas em seus mapas conceituais, de tal modo que se possa "ler"cada ramificação que aparece no mapa.
        Por exemplo, em um mapa conceitual do tipo "guarda-chuva", não seria raro encontrar uma ramificação como a sugerida na figura P.S.2.
        Ora, será preciso um mapa conceitual para expressas esta seqüência proposicional de conceitos? Certamente não! Uma perda de tempo!



        Ao fazer um mapa conceitual de um artigo de pesquisa, por exemplo, muitas pessoas tentam traçá-lo de tal maneira que o mapa possa ser "lido" através do mapa. Ou seja, o mapa parece uma visão esquemática do trabalho, cheia de direções preferenciais indicadas por meio de setas. Isso é uma distorção da idéia de mapa conceitual e um desperdício de seu potencial para facilitar a aprendizagem significativa. Mapas conceituais são úteis para desvelar a estrutura conceitual do artigo que, geralmente, está implícita, subjacente, subentendida, e que não tem nada a ver com um diagrama de fluxo: conceitos não são passos em uma seqüência de operações. O mapa conceitual de um artigo, ou de outro texto qualquer, não é uma leitura, uma estilização, ou uma compactação do artigo ou texto em um diagrama de fluxo. É unicamente um diagrama dos principais conceitos embebidos no trabalho e das relações entre eles. "Materiais e métodos", "resultados", "hipóteses" não aparecem no mapa conceitual de uma pesquisa.
        Mapas conceituais também não são organogramas conceituais. Conceitos em uma estrutura não têm posições bem definidas e suas relações não são de poder. As hierarquias de conceitos são contextuais: um conceito-chave em uma hierarquia pode ser secundário em outra.
        Além destas confusões com quadros-sinóticos, diagramas de fluxo e organogramas, outra crítica que tenho aos mapas conceituais, tala como comumente utilizados por professores e alunos, se refere às palavras-chave que devem ser colocadas sobre as linhas a fim de explicitar as relações.
        Não é fácil achar uma palavra-chave que expresse uma relação significativa entre dois conceitos. Então,a tendência é cair no uso dos verbos e proposições que , na melhor das hipóteses, sugerem relações muito pobres e jogam fora a grande potencialidade oferecida ao para uma negociação de significados. Palavras como "é", "são", "pode ser", "pertence", "depende", "tem", "ou", "de", "da" aparecem freqüentemente em mapas conceituais, mas a rigor não dizem nada sobre as relações entre os conceitos. Por exemplo, o verbo "é" poderia ser usado como palavra-chave (ou palavra de enlace, ou ainda, conectivo) em um mapa conceitual para ligar os conceitos "céu"e "azul", formando a proposição "céu é azul" que não diria nada sobre a relação entre o céu e sua coloração azulada.
        No começo, as linhas que apareciam nos mapas conceituais não eram rotuladas. Muitos dos exemplos dados neste artigo, não têm nada escrito sobre as linhas. Posteriormente, introduziu-se a rotulação das linhas com palavras-chave a fim de aumentar a potencialidade instrucional dos mapas. Foi uma evolução, mas muitos dos usuários não exploram essa potencialidade e ficam satisfeitos com relações triviais expressas através de conceitos muito pobres.
        A título de conclusão destes comentários, vou listar algumas perguntas, que geralmente são feitas em "workshops" ou palestras sobre mapas conceituais, e dar minhas respostas.

                O mapa tem que ser hierárquico? É necessário seguir o modelo ausubeliano?

                Pode-se, ou deve-se usar setas?

                Pode-se usar equações ao invés de palavras-chave?

                Pode-se incluir processos nos mapas?

        Creio que os conceitos incluídos em mapa conceitual devem estar hierarquizados de alguma maneira. É preciso evidenciar, de algum modo, quais são os conceitos subordinados, ou superordenados (ou sobre-ordenados), os inclusivos, os específicos, os mais relacionados, os frouxamente vinculados. O modelo ausubeliano faz essa hierarquização de maneira clara, até mesmo rígida, mas tem o problema de sugerir quadro-sinótico ou organograma.

           A questão das setas já foi abordada. Claro que ordem ser usadas. O problema é que elas tendem a dar direcionalidade ao mapa conceitual e, conseqüentemente, lembrar diagrama de fluxo.

        Não é recomendável usar equações em substituição às palavras-chave (conectivos) porque podem mascarar o desconhecimento da relação entre os conceitos. Um aluno, por exemplo, pode usar uma fórmula matemática como conexão entre dois conceitos simplesmente porque os dois aparecem nessa fórmula e não ter a menor idéia sobre uma relação mais significativa entre eles.

        Processos, em princípio, não devem ser incluídos, uma vez que o mapa é de conceitos e somente conceitos.

        Neste pós-escrito tentei fazer uma (auto) crítica ao mau uso dos mapas conceituais. Sem defender regras rígidas e proibições na confecção de mapas conceituais conceituais, minha críticas resultam na seguinte mensagem ao usuário de mapas conceituais:

        Veja o mapa conceitual com outros olhos, imagine-o como uma coisa nova. desprenda-se das idéias de quadro-sinótico, diagrama de fluxo e organograma. Hierarquize os conceitos de uma maneira que faça sentido contextualmente. Não se conforme com relações pobres, apenas de cima para baixo e com conectivos triviais para as relações conceituais. Busque relações cruzadas.
        Encare o mapa conceitual como um instrumento para negociar significados, para facilitar a aprendizagem significativa. Como tal, ele é um diagrama que muda à medida que ocorre a aprendizagem significativa. Mapas conceituais não são definitivos, são instrumentos para representar e aprender a estrutura conceitual de um corpo de conhecimento. 
        Fazendo isso, você certamente se dará conta da enorme potencialidade dos mapas conceituais como recurso instrucional. (escrevi este pós-escrito para tentar evitar que você leve tanto tempo quanto levei para perceber isso).

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Última atualização: 25/6/2002
por Bruna Griebeler
Contato: Silvio L. S. Cunha