Escreva-me, comentários e sugestões são bem-vindos



 
 
Rimini é uma conhecida e agradabilíssima estação de veraneio à margem do mar Adriático, com calçadas cobertas por maravilhosas alamedas de plátanos. A enorme quantidade de bares e restaurantes não surpreende, em se tratando de uma cidade turística, mas a quantidade de livrarias é surpreendentemente grande para seus 120 mil habitantes. Entre as curiosidades em torno desta cidade, uma é que ela é a terra natal, a Amacord de Fillini. Além disso, sua secular história é repleta de fatos curiosos. A família Malatesta, que dominou a cidade lá pelos idos do século 13, tinha entre seus membros gente que se distinguia pela crueldade, gente do mais refinado trato, e gente que se comportava de um extremo ao outro. Por exemplo, em A Divina Comédia, Dante conta como Gianni Malatesta matou sua esposa Francesca da Rimini e seu irmão Paolo Malatesta. A propósito, Tchaikovski escreveu uma famosa fantasia sinfônica intitulada Francesca da Rimini. Mais tarde, Sigismond Malatesta, que protegia os humanistas e encorajava as artes, mata suas três primeiras mulheres antes de se casar com a amante.

Depois de cinco cansativos dias de congresso parti para Ravena, a 50 quilômetros de Rimini, e a meia distância entre esta e Bolonha. Com menos de 150 mil habitantes, Ravena tem traços históricos romanos e bizantinos a cada esquina. Não sei como ela fica durante os meses de inverno, mas naquele fim do verão estava uma maravilha; botando gente pelo ladrão. Uma animação que dava gosto! Mais conhecida pelos seus mosaicos (considerados os mais espetaculares da Europa), esta cidade guarda na sua história um fato da maior importância: aqui, há mais de seiscentos anos, morreu Dante Alighieri, o famoso poeta italiano, autor de A Divina Comédia.

Traços do Império Romano vêm lá do ano 404 dessa era cristã, quando Honorius abandona definitivamente Roma e decide instalar o Império em Ravena. Em seguida, Galla Placidia, irmã de Honorius, governa com todo a pompa romana, até que em 476, o rei godo Odoacre toma-lhe a cidade. Do ponto de vista estético, dois monumentos chamaram-me a atenção: a basílica de San Vitale e o mausoléu de Galla Placidia. Do ponto de vista histórico, emocionou-me chegar próximo ao túmulo de Dante, e visitar, ao lado, o Museu Dantesco, onde encontram-se belíssimas e antigas edições das suas obras.

A basílica de São Vital é um exuberante monumento arquitetônico, onde a pompa e a engenhosidade nos oferecem um momento de êxtase. Construída sob a forma octogonal, essa igreja guarda parte da magnífica arquitetura bizantina, e uma esfuziante coleção de mosaicos coloridos. Próximo à basílica, o mausoléu de Galla Placidia é igualmente inebriante. Trata-se de uma pequena construção em forma de cruz, com aparência externa simples, mas que guarda no seu interior uma maravilhosa coleção de mosaicos. A cena do bom pastor é de uma beleza emocionante.

Depois desse banho cultural fui até um café na praça do povo saborear um cappuccino, que na Itália tem um sabor todo especial. Eles não colocam creme de chantilly, como no Brasil; apenas a gordura do leite, depois de passar na máquina de café expresso, fornece a aspecto e o sabor cremoso. Aliás, para quem não sabe, o café expresso na Itália é fortíssimo, ocupando um terço de uma xícara de cafezinho. Muita gente coloca água; é o que eles chamam de café americano, ou café com acqua calda.

Fiquei perambulando e curtindo as surpresas a cada quarteirão. Entrei numa ruela e vi um quarteto (duas jovens com flautas transversa, um jovem com oboé, e um outro jovem com um órgão elétrico) executando algo ao estilo de Bach. Três números depois eles foram substituídos por outro jovem conjunto (quatro rapazes): uma flauta transversa, dois violinos e um violoncelo. Tocaram algo ao estilo de Mozart. Logo descobri que se tratava de um projeto cultural. Os dois conjuntos pertencem ao Istituto Verdi. Ao longo da semana, em vários locais da cidade, em vários horários, há algum tipo de manifestação artística. Em determinado momento, sentei-me numa mesa de bar ao ar livre, pedi uma cerveja (birra, no mais legítimo italiano) e fiquei assistindo um espetáculo de fantoche. Não entendi niente, mas a criançada se divertia. Em frente, um belo edifício renascentista.

Extenuado, após um dia de caminhadas e mais caminhadas, volto ao hotel. No trajeto, já depois das dezenove horas, admiro a beleza daquele tardio crepúsculo de fim de verão. No dia seguinte estarei de partida para Bolonha.


Voltar à página-portal de C.A. dos Santos
Veja outras crônicas