É natural abordar esta tarefa considerando o caso de um elétron apenas, que corresponde ao átomo de hidrogênio
Estas considerações apontam para a necessidade de se explicar as escalas de comprimento presentes na fenomenologia, quais sejam o tamanho atômico e o inverso da constante de Rydberg, que caracteriza o espectro de radiação. Neste respecto, vale notar que a física clássica - entendida como abrangendo a relatividade restrita - associa apenas uma escala de comprimento a um elétron submetido à força Coulombiana produzida por um próton, qual seja, a distância rC para a qual a energia potencial iguala em valor absoluto a energia de repouso do elétron. Sendo a energia potencial dada por
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Já sabemos que a teoria quântica associa a cada partícula massiva uma escala de comprimento, qual seja, o seu comprimento de onda de Compton. Por conveniência, utilizaremos a versão "racionalizada" desta quantidade, que difere por um fator 2p da definição anteriormente introduzida e vale para o elétron
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O surgimento na teoria quântica da constante adimensional pequena a abre novas perspectivas quanto à possibilidade de explicar o tamanho atômico e a escala do espectro de radiação. Dividindo-se qualquer uma das constantes dimensionais (8-3) ou (8-4) por potências adequadas de a, pode-se gerar escalas de comprimento nas faixas adequadas de Angströms e centenas de nanômetros. Num trabalho pioneiro, Niels Bohr4 apresentou um modelo que permite deduzir estas potências e demais fatores numéricos.
1] Mostra-se na teoria eletromagnética que deveria ser este o raio de uma distribuição esférica de carga para que a sua "auto-energia" - a resultante das energias potenciais de interação eletrostática entre elementos da distribuição - seja igual à energia de repouso do elétron.
2] Os níveis de energia do átomo - que vamos discutir logo em seguida - são na verdade separados em subníveis extremamente próximos. Este é o fenômeno de estrutura fina, e é no contexto da sua análise teórica que a constante a foi introduzida. Porém, deve-se reconhecer que o nome que lhe ficou atribuído por esta razão não faz jus à sua fundamental importância.
3] Este fato justifica o uso do procedimento de cálculo conhecido como teoria de perturbação na análise dos processos fundamentais regidos pelas interações eletromagnéticas. Por exemplo, por este método pode-se avaliar a intensidade relativa dos dois picos observados no efeito Compton.
4] Niels Henrik David Bohr, físico dinamarquês, 1885-1962.
Modelo de Bohr para órbitas circulares
Suposições
Pode-se caracterizar o modelo de Bohr como uma tentativa de conciliar o modelo clássico de Rutherford com as idéias quânticas de Planck e Einstein a respeito da emissão de radiação eletromagnética.
O modelo descreve um átomo no qual há apenas um elétron. Além do átomo de hidrogênio, cabem nesta categoria também átomos de elementos mais pesados mas que perderam por ionização todos os seus elétrons exceto um, por exemplo: hélio ionizado, lítio duplamemte ionizado, etc. Também inclui evidentemente os isótopos do hidrogênio, o deutério, cujo núcleo contém um próton e um neûtron, e o trítio, cujo núcleo contém um prótron e dois neûtrons. Por fim, o modelo pode também ser utilizado para descrever átomos exóticos, nos quais o elétron ou o núcleo é substituido por outra partícula. Por exemplo, substituindo-se o elétron por um múon1, obtem-se o hidrogênio muônico; substituindo-se o núcleo por um pósitron2, obtem-se o positrônio. A condição essencial para que o modelo possa ser utilizado é que o sistema seja composto de apenas duas partículas, de cargas opostas.
Apresentaremos o modelo na sua versão mais simples, na qual parte-se das seguintes suposições
A restrição às órbitas circulares permite um tratamento simples e revela-se adequada para deduzir as características essenciais do átomo. A extensão a órbitas elípticas introduz refinamentos interessantes, que foram estudados principalmente por Sommerfeld3, mas não serão considerados aqui.
A última suposição constitui a "parte quântica" do modelo, já que introduz a contante de Planck. Na presente abordagem, utilizaremos como guia na incorporação dos aspectos quânticos os dois elementos indicados, quais sejam, a fenomenologia do espectro de radiação, e a necessária compatibilidade da visão quântica com a visão clássica no domínio de validade desta. Há várias alternativas adotadas nos livros textos, mas a nossa escolha, além de manter-se próxima ao trabalho original do próprio Bohr, tem a vantagem de focalizar aspectos que permanecem válidos na mecânica quântica completa desenvolvida subsequentemente.
1] O múon é uma partícula semelhante ao elétron, mas cerca de 200 vezes mais pesada que este.
2] O pósitron é a antipartícula do elétron. Portanto, possui mesma massa, mas carga oposta (positiva).
3] Arnold Johannes Wilhelm Sommerfeld, físico alemão, 1868-1951.
Mecânica clássica
A energia potencial de interação Coulombiana entre o elétron e o núcleo é dada por
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Emissão de radiação
Como vimos, o espectro de emissão (ou de absorção) do átomo de hidrogênio é constituído de séries de linhas cujos comprimentos de onda associados são dados adequadamente pela fórmula fenomenológica de Rydberg-Ritz, qual seja
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Do outro lado, Einstein, inspirado pelo trabalho de Planck, postulou que a emissão de radiação eletromagnética se dá pela produção de um fóton de energia
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Até este ponto, a constante R é puramente fenomenológica, não possuindo nenhuma relação com as constantes fundamentais. Bohr estabeleceu tal relação atravês de vários argumentos, entre os quais destacaremos o princípio de correspondência. A nível qualititivo, este princípio simplesmente afirma que se a mecânica quântica é a teoria subjacente a todos os fenômenos físicos, ela deve reduzir-se em boa aproximação à fisica clássica nas situações nas quais é sabido que esta fornece uma descrição adequada. Mais especificamente, Bohr postulou que isto seria o caso no limite de grandes números quânticos. Para justificar esta conjectura no caso particular do átomo de um elétron, basta verificar que, seguindo a relação (8-17), os níveis de energia ficam muito próximos um do outro quando n fica grande. Pode-se notar também que de (8-11) e (8-17) segue que o raio do átomo aumenta com n. Assim, para n suficientemente grande, o sistema é de tamanho "macroscópico" e possui energia praticamente contínua. Neste limite, espera-se que ele possa ser descrito adequadamente pela física clássica.
Para explorarmos quantitativamente o princípio de correspondência, consideramos a relação entre as visões clássica e quântica da emissão de radiação pelo átomo. Na visão quântica, o átomo emite radiação ao "cair" de um nível de energia En para um nível de energia En-1, emitindo um fóton de freqüência angular
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Vale notar que, além de fornecer uma explicação do valor da constante para o hidrogênio, o modelo de Bohr também estipula que ela deve ser proporcional ao quadrado da carga do núcleo. Assim, o modelo prevê que o espectro do átomo do hélio ionizado uma vez deve ser semelhante ao do hidrogênio, afora uma mudança de escala que corresponde à multiplicação da constante de Rydberg por quatro. Na época em que Bohr realizou o seu trabalho, linhas observadas no espectro de certas estrelas eram atribuídas ao hidrogênio e interpretadas como associadas a valores semi-inteiros dos números m e n da fórmula fenomenológica. Bohr interpretou-as como indicando a presença de hélio, o que foi subsequentemente confirmado. Segundo Einstein, uma das mais convincentes evidências para a validade das idéias de Bohr.
1] A compatibilidade entre estas relações define a energia afora uma constante aditiva, que escolhemos nula.
O átomo quântico
Inserindo o resultado (8-23) na expressão (8-17), obtemos, em termos apenas das constantes fundamentais e do número quântico, a expressão das energias permitidas para os estados ligados do átomo:
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É costumeiro representar os valores possíveis da energia num "diagrama de níveis". Cada valor da energia é representado por uma linha horizontal. Muitas vezes, transições entre níveis estão representadas por setas. Na figura abaixo estão representadas as transições associadas às primeiras linhas das séries de Lyman, Balmer e Paschen.
No hidrogênio a temperatura ordinária, os átomos estão no seu estado fundamental (
Já no que diz respeito ao espectro de absorção, a temperatura ordinária, observa-se apenas a série de Lyman, na qual os átomos, que estão inicialmente no estado fundamental, são promovidos para um estado excitado pela absorção de um fóton. É possível observar a série de Balmer na absorção de radiação por hidrogênio a temperaturas muito altas, por exemplo no interior de certas estrelas. Isto se deve ao aumento da fração de átomos excitados com a temperatura, como pode ser facilmente deduzido da distribuição de Boltzmann.
As demais quandidades características do movimento do elétron no átomos podem ser facilmente deduzidas dos resultados anteriores. Utilizando (8-25), tiramos de (8-11) a expressão do raio da órbita de número quântico n:
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A velocidade do elétron na órbita de número quântico n segue imediatamente de (8-25) e (8-12):
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Para deduzir o momentum angular orbital do elétron, podemos usar (8-14) e (8-17), ou aproveitar as expressões já obtidas do raio (8-27) e da velocidade (8-29), obtendo
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