Jornal da Ciência (JC E-Mail)

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Edição 2729 - Notícias de C&T - Serviço da SBPC
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18 de março de 2005

Institutos do Milênio: novidades à vista

MCT e CNPq destinam R$ 90 milhões para novos Institutos do Milênio; seleção de áreas inclui setores da Política Industrial

Janaína Simões escreve para o 'Inovação Unicamp'

O Programa Institutos do Milênio sofreu alterações no seu relançamento, criando novas áreas para formação de redes, dando atenção aos setores relacionados à Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) e permitindo a continuidade das redes após os três anos de duração do programa.

O edital foi lançado no dia 2 de fevereiro. O orçamento de R$ 90 milhões, para três anos, agora é exclusivamente formado por recursos do MCT e sua agência de fomento, o CNPq. Na primeira edição do programa, os recursos vieram do Banco Mundial.

O Programa Institutos do Milênio se destina a projetos não atendidos por outros programas do CNPq - como os editais universais, para projetos de pesquisa de até R$ 50 mil, ou o Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex), de R$ 300 mil a R$ 500 mil.

Segundo a agência, seus objetivos são aumentar a competência brasileira em áreas estratégicas e nas ciências básicas, criar um ambiente favorável à inovação e executar projetos de pesquisa mais abrangentes, privilegiando a multidisciplinaridade, por meio da formação de redes virtuais de pesquisa.

Pretende auxiliar, ainda, no processo de capacitação científica regional, ao promover a interação entre pesquisadores estabelecidos em regiões mais e menos desenvolvidas, e promover a formação e fixação de jovens doutores.

Para o relançamento do programa, o MCT pediu uma avaliação dos 17 institutos formados na primeira edição. A análise foi feita pelos integrantes da comissão internacional que analisou as propostas apresentadas no primeiro edital do programa.

'A conclusão da comissão foi a de que os institutos foram bem-sucedidos e deveríamos continuar o programa', conta José Roberto Drugowich de Felício, diretor de programas horizontais e instrumentais do CNPq.

O financiamento para os primeiros institutos estava limitado a três anos, sem possibilidade de continuidade. Na nova edição, o CNPq optou por permitir que redes já formadas concorressem ao edital, ao lado das novas.

'Estamos garantindo a continuidade do programa, inclusive dando a possibilidade de prosseguimento das atividades da rede por um período mesmo depois que se passarem os três anos', explica Drugowich.

No entanto, segundo Drugowich, as redes que já participaram do Institutos do Milênio não terão uma vantagem maior do que as demais, por conta da experiência.

'É óbvio que desenvolveram uma expertise, mas as propostas deverão envolver outras pessoas, precisam ser inovadoras', afirma. O CNPq estima que possam ser formadas cerca de 30 redes de pesquisa a partir deste novo edital.

O CNPq determinou 19 áreas induzidas. Entre elas, algumas foram selecionadas seguindo as orientações da política industrial, caso de fármacos e produtos naturais, desenvolvimento de novas vacinas, exploração da biodiversidade na Amazônia, nanotecnologia, micro e nanoeletrônica e desenvolvimento de softwares.

No edital também é exigido que os pesquisadores indiquem os mecanismos de transferência do conhecimento ou resultado das pesquisas para os setores público e privado, se houver a possibilidade de aplicação.

A explicitação desse tipo de exigência é recente nos editais do CNPq. 'Já a fizemos nos dois editais voltados para nanotecnologia. O CNPq apóia a pesquisa básica, mas também se preocupa com o desenvolvimento tecnológico e essa exigência acompanha o novo arcabouço que estamos formando no Brasil', comenta ele, referindo-se a mecanismos como os fundos setoriais e a Lei de Inovação.

A data final para apresentação das propostas fixada pelo edital é 30 de abril. Os selecionados serão conhecidos em 30 de junho e os projetos serão contratados a partir de 11 de julho. O CNPq está formando a comissão julgadora, que a exemplo do que ocorreu na primeira edição dos Institutos do Milênio, terá a participação de pesquisadores do exterior.

A experiência do instituto voltado para o estudo dos citrus.

Em abril de 2005 devem acabar os trabalhos de pesquisa da rede formada a partir do Instituto do Milênio de Integração de Melhoramento Genético, Genoma Funcional e Comparativo de Citrus.

A rede é relativamente pequena: congregou 48 pesquisadores fixos, todos com doutorado, integrantes do Centro de Citricultura Sylvio Moreira do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), da Universidade Estadual de Maringá, da Unesp, Universidade Federal de Lavras, Instituto Biológico e Unicamp.

Além desses cientistas, outras 700 pessoas, estudantes de iniciação científica e também de mestrado e doutorado, envolveram-se nos trabalhos.

O pesquisador Marcos Antônio Machado, do Centro de Citricultura do IAC, foi o coordenador da rede. Ele lembra que essa foi a única rede na área agrícola aprovada na primeira edição do Milênio.

As pesquisas foram centradas no estudo da laranja, da tangerina e do Poncirus trifoliata, uma 'parente' dos citrus.

'Selecionamos estudar a laranja pela importância que ela tem para a economia nacional. No caso da tangerina e do Poncirus, a seleção se baseou na resistência que ela apresenta a doenças que afetam a laranja', explica.

O grupo focou três áreas: melhoramento genético para resistência a doenças, o estudo do genoma desses três citrus e estudo dos genomas dos seus patógenos mais comuns e prejudiciais.

Esse instituto permitiu a montagem de uma rede no Estado de SP para estudar o melhoramento genético. A rede está sendo avaliada agora. O genoma das três espécies - laranja, tangerina e Poncirus - estão praticamente concluídos e abrigados em um banco de dados com mais de 200 mil seqüências expressas, sendo o maior banco de dados de seqüenciamento de citrus do mundo, segundo Machado.

O genoma funcional de patógenos é uma continuação dos projetos que seqüenciaram o genoma das bactérias Xilella fastidiosa, causadora da doença do amarelinho, e Xanthomonas axonopodis pvs, responsável pelo aparecimento do cancro cítrico.

A bactéria causadora do amarelinho provoca o entupimento dos vasos responsáveis por levar água e nutrientes da raiz para a copa da planta. O cancro cítrico provoca lesões nas folhas, frutos e ramos e a queda dos frutos e folhas, prejudicando a produção.

A bactéria Xanthomonas é de fácil disseminação - um de seus vetores é o homem -, altamente contagiosa e resistente.

Além das duas bactérias citadas, os pesquisadores da rede estudaram o genoma funcional do vírus Guinardia citricarpa, causador da doença tristeza. Assim como a Xilella, esse vírus também bloqueia os vasos condutores de seiva, matando as plantas por inanição.

Outro objeto de pesquisa é o patógeno responsável pela leprose, doença provocada por um vírus transmitido pelo ácaro Brevipalpus phoenicis e que causa perdas de produção e redução da vida útil das árvores afetadas. O grupo estuda, ainda, o genoma de dois fungos, causadores das doenças mancha preta e gomose.

O fungo causador da mancha preta, apesar de não alterar o sabor da fruta, causa o surgimento de manchas escuras que tornam o produto impróprio para o mercado de fruta fresca.

A gomose provoca apodrecimento dos pés de citrus, afetando a base do tronco ou raízes, podendo também atingir sementes, folhas, brotos novos e frutos.

Machado considerou a experiência do Instituto do Milênio muito positiva, tanto que já prepara um novo projeto para concorrer no edital lançado em fevereiro último.

'No primeiro edital, nossa proposta era mais ampla. Queríamos também fazer o genoma funcional da laranja, mas por conta dos recursos disponíveis serem menores, priorizamos fazer o genoma', conta.

O projeto todo, incluindo o genoma funcional da laranja, precisaria de investimentos da ordem de R$ 7 milhões, mas foi disponibilizada a metade desse valor pelo CNPq.

Além da participação no novo edital, os pesquisadores da rede estão organizando um fascículo da Genetics and Molecular Biology, revista científica da Sociedade Brasileira de Genética, que falará apenas sobre citrus, com artigos relatando as pesquisas desenvolvidas no âmbito da rede formada pelo Institutos do Milênio.

Os pesquisadores trabalham com a perspectiva de conseguir a aplicação dos resultados de suas pesquisas em um prazo de aproximadamente dois anos.

'O grande potencial está no campo, no desenvolvimento de novos híbridos, melhorados geneticamente. O processo de transferência de conhecimento e tecnologia na agricultura é um pouco mais demorado, estamos lidando com culturas perenes e a aceitação de novas variedades é vagarosa', destaca. Os pesquisadores pretendem fazer uma espécie de linha de montagem com plantas geneticamente modificadas.
(Inovação Unicamp, 17/3)