BIOLOGIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NO CURRÍCULO DO ENSINO MÉDIO
(Biology technology, and innovation in high school curriculum.)
 
Antonio Carlos Rodrigues de Amorim
Faculdade de Educação/Unicamp
 
Resumo

  Com base em referenciais que propõem a contextualização do ensino das ciências centrada nas relações entre Ciência/Tecnologia/Sociedade e na convicção de que o professor tem papel fundamental dentro dos processos de inovação curricular, este artigo descreve e analisa diferentes elementos presentes na prática pedagógica de professoras da cidade de Campinas/SP, na perspectiva de traçar um panorama a respeito das relações entre Biologia e Tecnologia já existentes. Enfoca, bem detalhadamente, as concepções das relações entre Biologia e Tecnologia presentes em materiais didáticos utilizados ou produzidos pelas professoras, resultando-se em apresentação e discussão do abrangente espectro de possibilidades identificadas. Destaca, também, os enfoques da relação entre Biologia e Tecnologia - semelhantes ou não aos encontrados nos materiais didáticos - que puderam ser depreendidos das entrevistas das professoras, obtendo-se indicativos da existência de uma associação entre teoria e prática, onde os elementos teóricos (ciência) são hierarquicamente superiores aos elementos práticos (tecnologia), problemática que vem a se constituir em foco de atenção para a construção de propostas inovadoras para o currículo do ensino de Biologia, uma vez que as discussões em sala de aula a respeito da tecnologia - nos seus aspectos éticos, estéticos, mercadológicos, epistemológicos - representam importante caminho para dimensionar o conhecimento biológico na sociedade capitalista contemporânea.
Palavras-chave: biologia e tecnologia, inovação curricular, visões dos professores.
 

Abstract

 Based on frameworks that propose the contextualization of science education centered in the science/technology/ society relationships, and on the belief that the teacher has a fundamental role on the curriculum innovation processes, this paper describes and analyses different elements of the pedagogical practice of teachers of the city of Campinas/SP, in the perspective of outlining an overview regarding the already existing biology and technology relationship. It focuses in a detailed way the conceptions of the relationships between biology and technology present in the instructional materials used or produced by teachers, describing and discussing the wide range spectrum of identified possibilities. It also emphasizes the approaches to biology and technology relationships identified by interviewing the teachers, being them similar or not to those found in the instructional materials. Indicators of the existence of a problematic theory and practice association, in which the theoretical elements (science) are hierarchically superior to the practical elements (technology), were detected. This kind of association should constitute a focus of attention in the construction of innovative proposals for the biology curriculum, since science classroom discussions regarding technology – in their ethical, aesthetical, epistemological, and marketing aspects – represent an important path to dimension the biological knowledge in the capitalist contemporary society.
Key-words: biology and technology, curriculum innovation, teachers views.

 
Introdução

    Os aspectos relativos ao currículo para o ensino da Biologia têm sido objeto de nosso especial interesse no campo da pesquisa educacional. Estamos construindo uma trajetória teórico-prática, aprofundando e/ou ampliando aspectos que identificamos na nossa investigação de Mestrado(1), como por exemplo aqueles relacionados às interações entre teoria e prática (AMORIM, 1998), pesquisa e ensino (AMORIM, 1997a) e apropriação/produção do conhecimento científico (AMORIM & CURADO, 1997 c) em busca de elaboração de propostas que se vinculam à realidade escolar, na perspectiva de sua transformação.

      Neste artigo, descreveremos e analisaremos as diferentes possibilidades das inter-relações entre uma área científica - a Biologia - e a Tecnologia presentes nos materiais didáticos utilizados por professoras de escolas de Ensino Médio técnico-profissionalizantes e da modalidade Inciso III (antigo Colegial) da cidade de Campinas que participaram da nossa pesquisa de Mestrado. Temos também como objetivo comparar as concepções encontradas nos materiais didáticos com as detectadas em entrevistas dessas mesmas professoras. Com isso, apontaremos parâmetros que indicam alguns dos elementos característicos do trabalho das professoras em sala de aula, no que diz respeito à presença do contexto curricular para o ensino de Biologia centrado nas relações entre Ciência/Tecnologia/Sociedade (CTS). Conhecer o trabalho pedagógico do professor, propondo-nos a realizar investigações que sejam capazes de dimensionar nuances da sua prática pedagógica, sem enquadrá-la em critérios pré-definidos, significa uma forte linha norteadora para efetivação de inovações no contexto escolar - como no currículo, por exemplo.

      Para todos os professores que trabalham no Ensino Fundamental e Médio ou pesquisam a realidade desses níveis educacionais, é evidente a influência que o livro didático exerce no ambiente escolar, e com o qual alguns de nós, professores, travamos uma luta para nos livrarmos de uma dependência com bases histórico-culturais. Conjuntos de trabalhos, como os de BORGES (1982), CICILLINI (1992), FRACALANZA (1982, 1992) e FRAGA et alii (1994), são indicativos da relevância para investigar temáticas ligadas aos materiais didáticos, particularmente as que se referem à análise e discussão, por exemplo, dos conceitos de ciência, prática científica, teorias científicas e de diferentes ênfases para abordagem de conteúdos científicos propostos para a educação básica. Já os trabalhos de SANTOMÉ (1989) e FERNADÉZ (1989) não se referem a conteúdos científicos, mas, sim, quanto ao papel dos livros didáticos na organização do currículo, destacando o contexto da sua produção editorial e as suas funções de definidor tanto de um conjunto de saberes a serem transmitidos quanto de formas de progressão e organização desses saberes. É significativo, pois, consideramos, os materiais didáticos utilizados em aulas de Biologia como importantes representantes das fontes para apropriação do conhecimento científico por professores e alunos(2).

          No que se refere especificamente às discussões de um currículo centrado nas relações CTS, o trabalho de BYBEE (1991) esclarece e ressalta que, para a diferenciação da prática pedagógica com a inclusão de temáticas que vinculam o conhecimento científico e tecnológico ao contexto social, professores norte-americanos de ensino médio e superior consideram de importância fundamental a existência de materiais didáticos elaborados segundo as orientações CTS. Já, ao tomar o trabalho de BRAGAW (1992), ampliamos o espectro de determinantes para esta prática curricular inovadora. Este autor descreve entraves ligados à implementação do contexto curricular pautado nas relações CTS, além de materiais didáticos, tais como a estrutura da escola, a visão dos pais de alunos e outros participantes da comunidade com relação a um modelo tradicional de currículo escolar e os processos de formação de professores que não priorizam características como o estímulo à autonomia para organização do seu trabalho pedagógico e nem aspectos ligados à concepção crítica do professor como intelectual. Sensibiliza-nos para olhar a inovação como um processo entremeado por aspectos teóricos e práticos.

        Compromissados com toda a problemática que vem sendo configurada na literatura que versa a respeito de materiais didáticos, inovação curricular e prática pedagógica, pretendemos, com a descrição analítica das relações entre Ciência e Tecnologia, a realizar-se neste artigo, fornecer ao leitor um panorama quanto aos tipos de interação que se encontram mais presentes e quanto aos principais conteúdos dos livros didáticos e outros materiais onde se estabelecem tais relações. Acreditamos que uma análise detalhada das concepções presentes nos materiais didáticos seja fundamental antes da elaboração de quaisquer propostas de atividades que tentem ser incorporadas no currículo escolar. Mesmo num âmbito maior, se estivermos pensando em uma perspectiva de inovações no ensino de Biologia, que envolva elementos de uma discussão sobre as relações CTS, a análise de materiais didáticos poderá ser extremamente útil para não incorrermos em uma repetição e sedimentação das concepções já existentes e para as quais já existem alguns trabalhos que tecem críticas e expõem as limitações de suas abordagens(3).

          Já é perceptível, até este ponto do texto, que o presente artigo pretende apontar aspectos julgados importantes e necessários para futuras pesquisas e ações que tenham como perspectiva a inovação curricular no ensino de Biologia. Sendo assim, é importante que conceituemos o que estamos compreendendo pelas palavras inovação e currículo, pois norteiam as conclusões e propostas de ação presentes neste artigo.

          Recorrendo a SACRISTÁN (1989), que em seu trabalho aborda várias possibilidades para o entendimento do que seja currículo, aproximamo-nos da definição de que este é

"um lugar privilegiado para analisar a comunicação entre as idéias e os valores, por um lado, e a prática por outro, supondo uma oportunidade para uma integração importante para a teoria curricular. Valorizando adequadamente os conteúdo do currículo, considera-os como laço de conexão da cultura escolar com a cultura social. Mas a concretização de tal valor só ocorrerá em relação ao contexto prático em que se realiza, que por sua vez está multicondicionado por fatores de diversos tipos que se convertem em agentes ativos do diálogo entre o projeto e a realidade. Sendo expressão da relação teoria-prática em nível social e cultural, o currículo molda esta relação na prática educativa concreta e é, por sua vez, também afetado por ela" (p. 63/64, grifos do autor).
 
             Considerando o currículo nessa dimensão, a sua inovação requer também uma dinâmica de interações entre teoria/prática e reflexão/ação. Como defende RIOS (1996), a inovação compreende um compromisso conjunto de várias pessoas com o novo e uma promessa com o que precisa ser mudado, transformado . Significa, então, um processo de definição, construção e participação social. Implica em deliberação e planejamento, de modo a considerar os conteúdos e orientações dos processos educativos em um dado momento histórico, à luz de coordenadas ideológicas, sociais, econômicas e culturais do sistema. O que modificar, em que direção e como fazer devem ser amplamente debatidos e avaliados pelo "corpo social", através de fundamentação reflexiva, crítica e deliberada. (Escudero Munhóz citado por JORGE, 1996, p. 38).

 
Descrição dos Materiais Didáticos

         Dentre os materiais didáticos adotados, consultados ou produzidos pelas professoras, foram levantadas e serão aqui descritas cinco coleções de livros didáticos, organizadas em volume único ou em três volumes, além de três apostilas de aulas práticas ou teóricas, utilizadas por professoras das escolas técnicas. As apostilas apresentam um conteúdo bastante diferenciado dos livros didáticos adotados nas escolas com Ensino Inciso III. No rol de conteúdos(4), podemos identificar como tópicos que existem em comum entre esses dois universos escolares apenas: Microscopia; Morfologia e Fisiologia de Microrganismos (basicamente bactérias) ; Fermentação. Dentro do próprio universo das escolas técnico-profissionalizantes, as apostilas têm em comum os assuntos relativos às técnicas básicas de Microbiologia : coloração; preparo de meios de cultura; esterilização e assepsia; microscopia; preparo de lâminas; testes microbiológicos(5).

         A descrição analítica dos aspectos sobre as relações entre Ciência/ Tecnologia/ Sociedade encontradas nos materiais didáticos de Biologia do Ensino Médio teve como foco conteúdos referentes aos tópicos de SERES VIVOS (Reinos Monera, Protista e Fungi); GENÉTICA (devido à utilização de microrganismos em experimentos clássicos dessa área da Biologia, bem como dentro da Engenharia Genética cujos avanços têm sido destacados nos dias atuais, tanto que os livros já dedicam textos complementares ou capítulos específicos para sua discussão(6)); ECOLOGIA, com destaque à sua função de decompositores de matéria orgânica e a sua conseqüente participação em fenômenos de interesse social como a poluição de águas e em exemplos de interações com outros seres vivos, bem como no seu papel na ciclagem de nutrientes, particularmente na de nitrogênio; CITOLOGIA (discussão sobre técnicas citológicas , instrumentos e aparelhos - principalmente o microscópio - bem como nos tópicos que se referem a metabolismo celular, particularmente processos de fermentação) e também ORIGEM DA VIDA, pois aí poderiam encontram-se informações diversas do nascimento da ciência Microbiologia e são discutidos alguns de seus aspectos históricos. No caso das apostilas usadas pelas professoras das escolas técnicas, todo o conteúdo que elas apresentavam foi-nos objeto para a descrição das inter-relações CTS presentes. Passaremos, neste momento, a descrever, de forma comparativa, quais conteúdos estão presentes nos diferentes livros didáticos .

        Nas coleções com 3 volumes, guardadas as particularidades de cada uma, é possível estabelecer uma panorâmica geral quanto à distribuição dos diferentes conteúdos nos três volumes, onde já se verifica uma homogeneização dos tópicos trabalhados. Isso, para nós, pode ser considerado, em parte, como fator explicativo quanto à pouca diversificação em exemplos das possíveis inter- relações CTS ao compararmos um mesmo tema nas diferentes obras.

        Nessas coleções de livros didáticos, o primeiro volume destina-se aos conhecimentos da área de Citologia. Dentro dos tópicos presentes nos livros, pelo fato de ter sido aonde se identificaram as associações, de alguma maneira, à Microbiologia, foram importantes para este trabalho a Microscopia - técnicas, funcionamento e aperfeiçoamento de aparelhos, e sua relação com a ciência Citologia; o Metabolismo Celular, particularmente a fermentação; e Origem da Vida - basicamente a dualidade Biogênese x Abiogênese.

         Em uma das coleções de livros didáticos , ocorre uma diferenciação no padrão descrito anteriormente, pois não aborda tópicos referentes à Microscopia, e aqueles que se relacionam à Origem da Vida são discutidos no volume 3 da coleção - associado à Genética e Evolução. Todas as coleções apresentam textos complementares e outros tipos de apêndices, cujo conteúdo também foi objeto de nossa investigação nesta pesquisa, na perspectiva de identificarmos possíveis relações CTS.

        O segundo volume dessas coleções centra-se na discussão sobre Seres Vivos - morfologia, anatomia e fisiologia. Desse volume, atemo-nos à investigação sobre os conteúdos relativos aos microrganismos: vírus, bactérias, algas, protozoários, fungos. Sem dúvida, nesses conteúdos é que encontramos maior quantidade de informações nas quais identificamos as relações CTS. No entanto, em contraponto à quantidade grande de informações, encontra-se uma padronização acentuada entre os diferentes autores, o que não acarretou uma grande diversificação quanto às relações CTS encontradas. Particularmente para o segundo volume de uma das coleções adotadas, havia as informações presentes em textos complementares, que também foram consideradas.

         O terceiro volume dedica-se aos tópicos de Genética, Evolução e Ecologia. Para todas as coleções, em tópicos relativos à relação Homem- Natureza, particularmente, a respeito de poluição, fizeram-se alusões a microrganismos. Um outro tópico presente em duas coleções e que foi na pesquisa utilizado diz respeito aos Ciclos Biogeoquímicos, especificamente o ciclo de nitrogênio. Uma coleção de livros didáticos torna-se inédita nesse volume, pois traz um capítulo específico sobre Microrganismos e Biotecnologia, aprofundando-se em algumas questões que também são encontradas em outras coleções, mas apenas em textos complementares ou em pequenas citações nos próprios capítulos que compõem o corpo central do livro.

        As coleções de livros didáticos que se apresentam em volume único têm os conteúdos praticamente idênticos aos das coleções com três volumes; ao invés de em volumes, aqui são apresentados em unidades. As duas coleções de volume único, quando comparadas com as demais, inovam na seqüenciação do conteúdo, pois ambas iniciam com tópicos de Ecologia. Apesar de serem coleções em que o conteúdo é apresentado de forma condensada, isso não decorreu em pobreza quanto as interações CTS encontradas com mais freqüência quando comparadas com as coleções de três volumes. Consideramos que a ausência, nesses livros de textos, de leituras ou atividades complementares possa ser um dos interferentes para uma menor diversidade nas interações CTS exploradas pelos autores.

        Utilizamos, para esta pesquisa, um caminho metodológico para análise dos materiais didáticos que visava à detecção de indícios que nos permitissem verificar as relações entre Ciência e Tecnologia, tendo como base conclusões que publicamos em trabalho anterior (AMORIM, 1995a), a partir da investigação de dois livros didáticos de uso bastante amplo nas escolas da cidade de Campinas.

        Dependendo dos parâmetros de descrição que são derivados da investigação com livros didáticos, pode-se passar a falsa impressão de que não existe nada sobre o tema que se está investigando, principalmente se este for atual ou considerado inovador no tratamento que é dado aos conteúdos das Ciências. Esse representa um problema quando se analisa o contexto CTS no currículo de Biologia. O contato com os livros didáticos e trabalho de investigação com materiais didáticos que já realizamos foram imprescindíveis para construirmos um modelo que nos permitisse identificar as diferentes relações CTS, em seus gradientes mais diversificados, tanto as de um nível mais primário quanto as que possibilitam ter uma visão abrangente e uma contextualização da ciência e da tecnologia mais real, ligada a um específico tipo de sociedade, a capitalista.

 

Identificando as Relações entre Biologia e Tecnologia nos Materiais Didáticos

         No referente à descrição das possíveis interações entre a Ciência - Biologia- e a Tecnologia, lançaremos mão das quatro possíveis posições adotadas por Gardner (1994) , em seu artigo , ao analisar alguns currículos de Ciências. Adotar tal classificação é extremamente pertinente, no nosso ponto de vista, uma vez que reúne de modo conciso as diferentes interfaces entre Ciência e Tecnologia discutidas num plano teórico, por vários autores. Por outro lado, esta classificação foi construída para análise de material didático, o que vai ao encontro de nosso objetivo. É importante destacar que adotamos uma classificação que estamos julgando adequada, após ter sido feita toda uma investigação e descrição particularizada de cada um dos materiais didáticos. Representa, antes de tudo, uma possibilidade que consideramos interessante, para apresentar os nossos dados.

     Gardner (1994) deriva da análise de materiais didáticos utilizados em cursos de Ensino Médio e Superior na Inglaterra, quatro possibilidades básicas que não têm caráter de superioridade hierárquica ou de verdade uma sobre a outra. Denominamo-las:

 Possibilidade 1: a ciência precede a tecnologia - tecnologia como aplicação da ciência.

Possibilidade 2 : a ciência e a tecnologia são independentes.

Possibilidade 3 : a tecnologia precede a ciência - visão materialista.

Possibilidade 4 : a tecnologia e a ciência engajam-se em interações de mão dupla.

         Parece-nos possível associar essa organização elaborada por Gardner, quanto às possibilidades de interações entre Ciência e Tecnologia, com construções teóricas da área de Sociologia da Ciência, que se propõem a pormenorizar as relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. A discussão a respeito das relações entre Ciência e Tecnologia centra-se primordialmente na apresentação de duas perspectivas: o denominado modelo hierárquico e o modelo simétrico. Apresentaremos aqui, resumidamente, as principais características esses modelos. Maiores detalhes podem ser encontrados em AMORIM (1997b), FIGUEIREDO (1989) e KNELLER (1980).

        No modelo hierárquico, a função da tecnologia é elaborar as implicações práticas da pesquisa científica. A produção de um novo conhecimento seria, então, função da ciência: cientistas criativamente constroem novas hipóteses e teorias, e rigorosamente as avaliam através de observações e resultados experimentais. Nesse modelo, a tecnologia restringe-se a uma atividade rotineira de elaborar e realizar as "implicações" das teorias científicas. Tal atividade nada criativa dependeria da ciência básica. A existência e o progresso da tecnologia são apresentados neste modelo como dependentes de um conhecimento prévio construído pela ciência.

        Submetendo-se a tecnologia à ciência, em um modelo hierárquico, dificilmente se abordam as suas dimensões econômicas, políticas e ideológicas. Além de transpor, para a tecnologia, características tradicionalmente presentes nas concepções de ciências veiculadas nas escolas, como por exemplo o seu caráter neutro e a-histórico.

         A consideração de que a tecnologia não é mera aplicação da ciência é o argumento base do outro modelo sobre as relações entre Ciência e Tecnologia que vem sendo apresentado na literatura (modelo simétrico). Neste modelo, considera-se que além de depender da cultura científica, a tecnologia tem seus próprios recursos culturais, que lhe provêm a base principal para sua atividade inovadora. Novos tipos de instrumentos são desenvolvidos a partir de materiais mais antigos, ocorrendo de maneira similar o mesmo com maquinário, processos, procedimentos.

        A inovação tecnológica não advém automaticamente do desenvolvimento da ciência. Atualmente, devemos considerar a relação entre Ciência e Tecnologia numa perspectiva de interdependência. Da Ciência, a Tecnologia deriva os conhecimentos básicos das leis naturais relevantes; os instrumentos; as técnicas; o método científico de investigação com o estabelecimento de fatos por experimentos controlados(7), além da crença na utilidade da pesquisa. Da Tecnologia, a Ciência recebe nova instrumentação; problemas para solucionar; e prática no avanço da explicação científica - a Tecnologia pode ser encarada como o elemento da prática que dará ao conhecimento de Ciência, teórico, o caráter de veracidade.

         Para resumir essas idéias, lançamos mão de trecho do artigo de Gardner, ao afirmar que tecnologia é muito mais do que ciência aplicada; ela é uma expressão da cultura, as maneiras pelas quais os homens entendem o mundo e o seu espaço e as maneiras pelas quais eles transformam esse mundo. Ao se conceber tecnologia como aplicação da ciência negligencia-se a consideração das forças sociais. (GARDNER, 1993, p. 292)

     Neste momento, faz-se necessário apresentar, para garantir o entendimento dos quadros que se seguem neste artigo, as escolas com as quais trabalhamos na pesquisa e as respectivas denominações que lhes atribuímos. Sintetizamos os dados nesta seguinte tabela.

 

Escola
Categoria
Localização/Período
Curso
 
Pública
Particular
Centro
Periferia
Inciso III
Técnico
     
diurno
noturno
diurno
noturno
 
1
2
3
A
X
 
X
       
X
X
 
B
X
     
X
X
     
X
C
X
     
X
 
X
     
D
X
       
X
X
     
E
X
 
X
     
X
     
F
X
   
X
   
X
     
G
 
X
   
X
 
X
     
Cursos Técnicos: 1 - Habilitação Plena de Enfermagem

                            2 - Habilitação Parcial de Alimento

        3 - Habilitação Plena de Bioquímica            O olhar analítico, construído a partir da Sociologia da Ciência, permitiu-nos dimensionar a série de dados sobre as possíveis interações entre Ciência e Tecnologia, que são apresentados no Quadro 1, e que foram elencados a partir da leitura e análise dos materiais didáticos. Utilizamos, neste quadro e nos demais que apareceram no decorrer do artigo, as legendas LD, para indicar livro didático e AP, para indicar apostila.
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        Este quadro tem, para nós, uma dupla função: identifica quais os tipos de interações entre Ciência e Tecnologia são mais comuns, bem como aponta em quais assuntos ou conteúdos ocorrem tais abordagens. Optamos em indicar neste quadro apenas os números que representam cada uma das possibilidades (1, 2, 3 ou 4). Listamos também os temas onde predominantemente evidenciam-se tais relações entre Ciência e Tecnologia.

         À primeira vista, podemos notar o quanto a possibilidade 1 é predominante em relação às demais, o que nos leva a perceber a difusão dessa visão hierárquica, na qual a tecnologia é derivada do conhecimento científico, e situada em um plano inferior, sendo posterior e dependente da ciência. Apesar de não ser errônea essa idéia, a visão hierárquica é inadequada para descrever todas as relações que existem entre ciência e tecnologia. Deixa, também, transparecer uma super-valorização da ciência, quando comparada com a tecnologia.

         Comparando-se as escolas de ensino Inciso III e técnico-profissionalizantes, percebemos que para as primeiras prevalece a abordagem da relação entre Ciência e Tecnologia nessa perspectiva, embora ocorra também nas apostilas das escolas técnicas.

        No Quadro 2, são apresentados extratos dos materiais didáticos que fornecem ao leitor exemplos de algumas relações entre Ciência e Tecnologia encontradas por nós, dentro da perspectiva apontada pela possibilidade 1. Vemos, então, um exemplo que leva ao entendimento da tecnologia restrita a um princípio científico (como no caso do microscópio) ; um exemplo que conduz a uma percepção limitada dos objetivos da educação tecnológica (caso dos objetivos de aulas práticas de uma escola técnica) ; um exemplo da utilização de tecnologia no trabalho científico; um exemplo que trata com superficialidade a conversão de um conhecimento científico em tecnologia, dentre outros.

 Quadro 2 - Exemplos de Relações entre Ciência e Tecnologia

Possibilidade 1 - Ciência Precede Tecnologia
 
"A diferença entre os microscópios óptico e eletrônico é que neste último não é utilizada a luz, mas sim feixes de elétrons acelerados. As lentes do microscó-pio eletrônico não são de vidro, mas sim espécies de bobinas, chamadas de lentes eletromagnéticas." (LD - Escola C) 

"(...) os testes sorológicos (sangüíneos) baseiam-se na reação antígeno-anticorpo apresentada pelos seres vivos." (LD - Escola  E) 

"Biotecnologia é o conjunto de técnicas em que se usam as propriedades do material biológico para finalidades bastante diversificadas."(LD - escola D) 

"A Microbiologia, ciência que estuda os microrganismos, permite a familiari-zação necessária com esse grupo microscópico e oferece condições para o aprimoramento do conhecimento nos mais diversos campos da ciência, desde o estudo da citologia bioquímica e da imunização das populações, até os sofisti-cados estudos da engenharia genética e da exploração da vida no espaço." (LD - Escola F) 

"Algumas bactérias heterótrofas são largamente utilizadas na produção de io-gurtes, requeijão e queijos. Os iogurtes são produzidos mediante a fermentação do açúcar do leite, realizada principalmente por dois tipos de bactérias: o Lactobacillus bulgaricus e o Streptococcus thermophilus." (LD - Escola G) 

"(...) para estudar as células podemos usar métodos ópticos ou citoquímicos. Os primeiros permitem o exame morfológico dos componentes celulares, enquanto os segundos nos fornecem o conhecimento das suas estruturas."(LD - Escola C) 

"Preparar meios de cultura para desenvolvimento de microrganismos. Os meios já preparados serão colocados em placas de petri e em tubos de ensaio. " (Apostila - Escola A1) 
 

 

        A própria estrutura do texto dos materiais didáticos colabora para a sedimentação dessa visão hierárquica, haja visto que a menção a tecnologias aparece quando se quer demonstrar aplicação de conhecimentos sobre processos bioquímicos, genéticos e de hábitos de vida dos microrganismos, em indústrias de laticínios ou na fabricação de vinagres.

         Quanto à perspectiva de Ciência e Tecnologia serem Independentes (possibilidade 2) , no Quadro 1 só apontamos os aspectos que se associam à tecnologia, pois todos os materiais didáticos utilizados para coleta de dados nesta pesquisa, predominantemente enfocam o conhecimento científico, dando-lhe caráter de independência da tecnologia, apresentando uma história e método de trabalho próprios e com exemplos de descobertas consideradas importantes, citando os respectivos ilustres cientistas por elas responsáveis. Interessou-nos, aqui, apresentar as poucas ocasiões em que se conseguiu fugir desse tipo de abordagem, enfatizando alguns aspectos da tecnologia.

        As escolas técnico-profissionalizantes distinguem-se das demais no tratamento que dão à tecnologia, apontando suas particularidades e distinguindo-a do campo científico, por exemplo, pelos métodos diferentes que a tecnologia utiliza. Tal possibilidade de interação entre Ciência e Tecnologia encontra maior discussão nos cursos técnicos, particularmente na escola A2, através de assuntos mais comuns de serem encontrados nos livros didáticos - como no tema microscopia ou em assuntos específicos da área técnica como por exemplo exames microbiológicos da água e alimentos enlatados. No Quadro 3, o leitor encontrará extratos de textos a partir dos quais identificamos a perspectiva de independência entre Ciência e Tecnologia.

Quadro 3 - Exemplos de Relações entre Ciência e Tecnologia
Possibilidade 2 - Ciência e Tecnologia São Independentes

 
"(...) não adianta aperfeiçoar a parte óptica do microscópio, no sentido de obter aumentos cada vez maiores, sem se conseguir, ao mesmo tempo, lentes que permitam ver com nitidez os detalhes estruturais do objeto."(Apostila - Escola A1) 

"(...) Embora estas substâncias tenham sido isoladas inicialmente de filtrados do meio nos quais seus respectivos bolores ou bactérias haviam crescido, diversas foram posteriormente sintetizadas. Nos últimos anos, modificações químicas nas moléculas, através de biossíntese, têm-se revelado um método notável de aparecimento de novas drogas."(Apostila - Escola A1) 

"A rapidez das novas descobertas foi tal, que na atualidade são várias centenas de substâncias valiosas as que se obtém partindo de matérias-primas econômicas ou facilmente acessíveis, graças à exploração dirigida da polifacética surpreendente capacidade metabólica dos microrganismos."(Apostila - Escola A2) 

"As contagens viáveis e total são ambas algo tediosas e, para muitas finalidades, o crescimento bacteriano pode ser conveniente medido por um meio indireto: a determinação do grau de dispersão luminosa produzido por uma suspensão de células. Quando pequenos objetos tais como células bacterianas são suspensas homogeneamente num líquido, sua capacidade de dispersão de luz é proporcional, dentro de limites, à sua concentração. (...) A dispersão de luz pode ser adequadamente medida com dispositivos fotoelétricos especiais. O mais usado comumente (embora menos sensível) é o colorímetro, em que a intensidade relativa de um feixe luminoso e medida antes e após a transmissão através de um líquido(...) Um instrumento mais sensível é o nefelômetro, que mede diretamente a quantidade de luz dispersa. O aparelho registra a luz que se dispersa em ângulos retos com um feixe de luz passado através da suspensão."(Apostila - Escola A2) 

"Noções sobre funcionamento de equipamentos utilizados na Estação de Tratamento de Água; comparação com tecnologias utilizadas em outras estações do Brasil; volume de água tratado por dia; funcionários responsáveis pelas diferentes funções; como resolver problemas de ordem prática (lavagem de filtros, proteção das tubulações, sistemas auxiliares para fornecer energia elétrica no caso de um 'black-out'); origem de equipamentos, se nacionais ou importados. (Filme - Escola B)

 

        A interação entre Ciência e Tecnologia, na qual a segunda precede a primeira (possibilidade 3), é encontrada em número bem menor quando comparada com as anteriores. No caso das escolas de ensino Inciso III, o exemplo característico dessa possibilidade refere-se à importância do aperfeiçoamento do microscópio para o desenvolvimento da Citologia. Nas escolas técnico-profissionalizantes, notamos a existência de uma diversidade de exemplos, embora o anterior também ocorra. O Quadro 4 ilustra essas conclusões.

 

Quadro 4 - Exemplos de Relações entre Ciência e Tecnologia
Possibilidade 3 : A Tecnologia Precede a Ciência
 
 
"A natureza e a estrutura dos vírus só puderam ser conhecidas após a introdução da microscopia eletrônica com o emprego de técnicas de raios X e de análises bioquímicas." (LD - Escola E) 

 "Poucos anos depois da experiência de Redi, Anton Leuwenhoek (naturalista holandês) aperfeiçoou o microscópio, permitindo o desenvolvimento de um novo mundo, até então desconhecido pela ciência: o mundo dos micróbios." (LD - Escola F) 

"A história do estudo da célula é na realidade a história do microscópio. Os progressos feitos no conhecimento das células sempre estiveram diretamente ligados ao desenvolvimento dos instrumentos adequados a seu estudo."(LD - Escola D) 

"Com o advento do microscópio óptico, no século XVII, um novo universo foi descoberto: o universo das coisas microscópicas, de tudo o que não pode ser visto a olho nu. A Citologia, ciência que estuda a célula, teve, então, o seu início." (LD - Escola G) 

 "O aprimoramento de novas técnicas, bem como o desenvolvimento de novos métodos de fermentação para a produção de enzimas por microrganismos, conduziram esse importante campo de estudos à possibilidade da produção de novos sistemas enzimáticos que não poderiam ser obtidos de tecidos vegetais e animais. Pode-se afirmar, com toda segurança, que as enzimas de origem microbiológica são as que apresentaram um futuro bastante promissor." (Apostila - Escola A2)

 

        Se a possibilidade 3 aparece raras vezes no texto, a concepção de uma interação entre Ciência e Tecnologia em mão dupla (possibilidade 4) é praticamente inexistente nos materiais didáticos utilizados nas escolas de ensino médio - inciso III, e mesmo no curso técnico-profissionalizante oferecido nas escola A1 e B.

          Devemos destacar aqui o material didático utilizado pela professora na escola A2, que no item fermentação, explora em situações bastante diversificadas essa possibilidade de interação entre Ciência e Tecnologia, fato que não pode ser verificado apenas pela leitura do quadro. Pelo que o quadro apresenta, os materiais didáticos utilizados nas escolas A2 e D são os únicos que apresentam essa possibilidade de interação entre Ciência e Tecnologia, na qual elas são consideradas inter-dependentes. Entretanto, enquanto o livro didático da escola D cita apenas um exemplo (relacionado à Engenharia Genética), a apostila utilizada na escola A2 esbanja exemplos dentro do tema Fermentação, durante o qual os autores relacionam a escala da indústria e a da ciência; salientam quais são as modificações que o processo industrial necessita para utilizar os procedimentos característicos da ciência; discutem que problemas surgidos na produção industrial de fermentados são pontos de partida para o desenvolvimento de projetos de pesquisa na área científica. Trechos dos livros e apostilas que ilustram esses exemplos podem ser vistos no Quadro 5.

          De uma maneira geral, verificamos que o enfoque preponderante sobre as relações entre Ciência e Tecnologia identificados nos materiais didáticos tem relação estreita com a categoria de ensino nas escolas de ensino médio: se, por um lado, nas escolas de ensino inciso III, detectamos a possibilidade 1 como a mais encontrada, por outro lado as escolas técnico-profissionalizantes tendem a explorar mais as possibilidades 2 e 3 (no que diz respeito à tecnologia). Quer dizer, nas escolas técnico-profissionalizantes existem possibilidades apontadas pelos materiais didáticos de discutir sobre aspectos diversificados da tecnologia, que não simplesmente os que são derivados da ciência. Entretanto, também nessas escolas é identificado no material que utilizam uma certa despreocupação em explorar facetas variadas da produção do conhecimento científico, bem como aprofundar as informações dele derivadas.

 

Quadro 5 - Exemplos de Relações entre Ciência e Tecnologia
Possibilidade 4 - Tecnologia e Ciência São Inter-Dependentes

 
 
"Essa tecnologia permite isolar e modificar genes e eventualmente enxertá-los em células diferentes das de origem. Além do evidente avanço sobre o conhecimento de como funcionam os genes, essas técnicas permitem a produção de substâncias úteis à indústria e à Medicina."(LD - Escola D) 

"A pesquisa, evidentemente, afetará grandemente o desenvolvimento dos produtos futuros. Importantes pesquisas estão em andamento, envolvendo (1) o 'condicionamento' dos microrganismos para desempenharem tarefas especiais - a elucidação do código genético pode ser nisso um fator significativo - e (2) o uso de fontes mais baratas de carbono, particularmente hidrocarbonetos e gás natural, para biossíntese. O potencial completo dessas pesquisas está ainda para ser avaliado. Certamente, a perspectiva a longo prazo, para os processos de fermentação, é indubitavelmente brilhante." (Apostila - Escola A2) 
 
"O desenvolvimento industrial da produção da penicilina revelou-se, dentre os problemas tecnológicos envolvendo o emprego de microrganismos, como o mais difícil e complexo jamais empreendido. Em fermentações industriais anteriores, o produto final comercialmente valioso havia sempre sido um dos principais produtos metabólicos microbianos. A penicilina, ao contrário, é essencialmente um produto metabólico do fungo que a produz. Quando se iniciou o trabalho nos laboratórios americanos, os melhores rendimentos de penicilina obtidos com a linhagem original de Penicillium notatum, isolada por Fleming, eram quantitativamente insignificantes; a concentração final dessa substância do meio de cultura raramente excedia de 0,01 por cento. Muitos laboratórios atacaram, por isso, imediatamente, dois aspectos puramente microbiológicos do problema: o desenvolvimento de meios que possibilitassem melhores rendimentos de penicilina e o isolamento de novas linhagens de fungo, tanto de ocorrência natural como artificialmente induzidas por agentes mutagênicos, que dessem rendimentos intrínsecos do antibiótico mais elevados do que a linhagem de Fleming. Pelo trabalho conforme essas linhas, em poucos anos, os rendimentos da penicilina foram mais de cem vezes aumentados. Substitui-se o Penicillium notatum por certas linhagens de Penicillium crysogenun."(Apostila - Escola A2) 

"(...) a introdução da penicilina imediatamente estimulou a busca de outros antibióticos, que pudessem preencher essas lacunas da quimioterapia." (Apostila - Escola A2)

 

        Em contrapartida, mesmo de uma maneira distorcida, os materiais instrucionais utilizados nas escolas de ensino Inciso III deixam transparecer exemplos de história da ciência, método científico, concepção de ciência e cientista, a ciência institucionalizada etc, o que é bem menos rico nos materiais da outra categoria de ensino.

      Enquanto que nas escolas de ensino técnico-profissionalizantes a concepção de tecnologia transmitida pelos materiais instrucionais dimensiona-a, algumas vezes, como processos utilizados na indústria, laboratórios ou outros campos, com uma dinâmica própria, incluindo marketing, financiamentos, etc, nos livros didáticos utilizados nas escolas com ensino Inciso III a tecnologia é reduzida à sinonímia de técnica ou aparelho ou instrumento.

    Ao contrário do que ocorre nas escolas de ensino técnico, geralmente a tecnologia no material das escolas de ensino Inciso III é apenas citada no texto ou ilustrada , ocorrendo ocasionalmente a explicação de alguma técnica ou a descrição de um equipamento ou do seu funcionamento. Mais raro ainda é a sugestão para a execução de alguma dessas técnicas pelos alunos. Mesmo quando são apresentados aspectos relativos à tecnologia que fogem da possibilidade 1, eles têm uma disposição periférica na organização do texto do livro didático situando-se no fim do capítulo ou unidade, no fim do livro através de apêndices ou anexos , ou em quadros à parte do texto central, que e, geralmente, nem são explorados nos exercícios propostos pelos autores. Têm, portanto, caráter de ilustração.

 
Relações entre Biologia e Tecnologia no Discurso e na Prática das Professoras

      O nosso quadro de análise permitiu-nos verificar que há enfoques bastantes diferentes no que se refere à prioridade que se dá para o tratamento de aspectos da ciência (Biologia) ou para os da tecnologia nas escolas com cursos de natureza distintas, ou seja, Inciso III e profissionalizantes. Na busca de aprofundar o entendimento das práticas escolares relacionadas ao contexto CTS e identificadas principalmente pelas análises dos materiais didáticos e de um conjunto de 20 aulas(8) a que assistimos, realizamos entrevistas semi-estruturadas com as professoras, podendo, com isso, também analisar elementos presentes em seu discurso.

      Durante as entrevistas, dialogamos a respeito da formação profissional das professoras, dos objetivos do ensino de biologia, das relações CTS e de como são trabalhadas em sala de aula. Para este último aspecto, optamos pelo seguinte procedimento(9): a partir do relato de experiências concretas vivenciadas pelas professoras dentro da sala de aula ou em outras situações, fizemos, durante a entrevista, algumas interferências que acreditamos possibilitaram a coleta dos dados, elucidando aspectos citados ou desencadeando outros comentários. Tais interferências diziam respeito a:

a) levar as professoras a eleger situações de ensino-aprendizagem em que pudéssemos perceber as possíveis interações CTS estabelecidas, sem impor um tema pré-determinado.

b) exemplos de livros didáticos em que era possível estabelecer algumas interações entre ciência/tecnologia/sociedade - temas como microscópio, doenças (verminoses, AIDS e outras parasitoses), engenharia genética, biotecnologia, fermentação.

c) exemplos e dúvidas levados pelos alunos para a sala de aula, procurando nos informar sobre como os mesmos foram trabalhados pelas professoras e a natureza dessas dúvidas; se são sempre sobre o mesmo assunto, qual a sua possível origem.

d) atividades programadas que constavam no plano da escola e/ou planejamentos de ensino elaborados pelas professoras - visitas a fábricas, indústrias, estações de tratamento de água, parques ecológicos, laboratórios de pesquisa em institutos e universidades; além de projetos realizados dentro da própria escola, tais como reciclagem de lixo, sexualidade, feira de ciências. Para essas atividades, verificamos como e por quem era feito o planejamento e o que ocorria após a realização dos mesmos.

e) presença de aulas práticas, de laboratório - procurando evidências sobre a descrição do método de produção do conhecimento científico, a relação teoria e prática, os instrumentos utilizados em aulas de laboratório etc.

          Na ocasião das entrevistas, algumas professoras das escolas Inciso III até mostraram certo grau de estranheza pelo fato de querermos saber se havia em suas aulas alguma relação entre o ensino de Biologia e aspectos tecnológicos. Particularmente tal fato ocorreu em entrevistas com professoras para quem um dos objetivos mais fortes do ensino de Biologia era capacitar o aluno a passar no Vestibular. Como é raro ou inexistente qualquer enfoque sobre tecnologia em provas de Biologia do Vestibular, talvez seja essa uma das explicações possíveis para tal estranheza. Mesmo assim, essas professoras manifestaram sua concepção de tecnologia, como as demais que entrevistamos.
 
        Pelo que pudemos depreender da descrição dos materiais didáticos, a concepção de tecnologia encontrada mais comumente vincula-a ao conhecimento científico, do qual é dependente e exclusivamente sua conseqüência. Há uma grande diversidade de temas em que se expressa essa concepção - denominada por nós Ciência precede Tecnologia ou Possibilidade 1 . Mas será que no discurso, as professoras mantêm essa concepção como a predominante?

         Quando a abordagem de questões referentes à tecnologia não é comum e às vezes nem existe no trabalho em sala de aula das professoras, geralmente, no discurso, elas associam tecnologia à Biotecnologia, Engenharia Genética, que são temas presentes em alguns livros didáticos. Particularmente em edições mais recentes, os autores têm introduzido discussões, mesmo que primárias, sobre aspectos tecnológicos. Essa concepção do que é tecnologia, restringindo-a exclusivamente aos parâmetros científicos, é mais comum de ser identificada no discurso das professoras que trabalham nas escolas de ensino Inciso III e que não tiveram a possibilidade de fazer uma pós-graduação ou de trabalhar em outra área, que não o Magistério.

        Para as professoras que fizeram Mestrado , que trabalharam em Institutos de Pesquisa ou em Laboratórios de Análises Clínicas , a tecnologia é associada a testes, exames, aparelhos, instrumentos e procedimentos utilizados em laboratório. Mais uma vez, à semelhança do que os livros didáticos fazem com maior freqüência, as professoras restringem o conceito de tecnologia à concepção de técnica, aparelhos (microscópio) ou instrumentos, que estão enfocados sob dois pontos de vista: um primeiro associado com a utilização de tecnologias pela sociedade (testes e exames) e um segundo, atrelando a tecnologia como importante para a construção do conhecimento científico, haja visto que a ciência lança mão de instrumentos e aparelhos. Em ambos os casos, no discurso das professoras e nas aulas a que assistimos, ficou evidente que a ciência precede a tecnologia e que é a partir da aplicação do conhecimento científico que se cria tecnologia, o que vai ao encontro das informações contidas nos livros didáticos.

        Então, discurso e aulas de algumas professoras mostram que a tecnologia está presente nos cursos de ensino Inciso III para mostrar uma aproximação do conhecimento científico com a sociedade como um possível elo de ligação entre essas duas partes, mostrando a utilidade do conhecimento científico, evidenciando seu valor para confecção de testes e exames laboratoriais, por exemplo. Esses exemplos que envolvem tecnologia, são considerados mais próximos da realidade do aluno.

         Algumas características de tecnologia são utilizadas nas escolas de ensino Inciso III porque para as professoras representam uma lado mais "prático" daquele conhecimento científico, teórico, que algumas até denominam de "chato". Lançar mão de alguns aspectos da tecnologia mostra, de acordo com as professoras, a utilidade daquele conhecimento que os alunos devem aprender na escola, um vínculo maior com a realidade da sociedade, e a praticidade desse conhecimento teórico.

        Fávero nos indica que a tecnologia ocupa lugar de destaque como elemento mediador dessa passagem da teoria à prática, da ciência à ação. Nessa perspectiva, " ao tratar de aspectos tecnológicos, a ênfase recai na capacidade de planejamento, na racionalidade científica, na neutralidade da ciência, no eleger a teoria como forma privilegiada de 'guiar' e de 'orientar' a ação." ( FÁVERO, 1987, p. 528 ). Essa autora destaca que, dessa forma, infelizmente se reforça a dicotomia na relação entre teoria e prática, onde o elemento inovador, criativo, viria da teoria (conhecimento científico) cuja fidelidade aos seus parâmetros é que daria a relevância à prática (tecnologia) . Por isso, é que as explicações de exemplos de tecnologias que se julgam de importância na sociedade centram-se em mostrar que a compreensão de alguns dos conhecimentos científicos é que possibilitou que elas fossem construídas. Recorrendo-se à história das tecnologias, fica clara a percepção de que esta é uma concepção equivocada.

        Adotamos e assumimos conceitualmente que a participação dos alunos na sociedade seja considerada como prática social, definida por Vásquez como sendo "um tipo de atividade de grupos ou classes sociais que levam a transformar a organização e direção da sociedade." (VÁSQUEZ, 1990, p. 200)

        Sendo assim, as atividades desenvolvidas com os alunos deveriam se caracterizar como ações que objetivam a gerar mudanças, mas não apenas no plano idealizado. Qualquer discussão que envolva aspectos da história do homem, deve enfocar a história da teoria (saber humano) e das atividades práticas do homem. Estaremos adotando neste texto, para fins de análise, os conceitos de teoria e prática apresentados por VÁSQUEZ (1990) e que podem se identificados nestes dois trechos de seu livro: "A atividade teórica proporciona um conhecimento indispensável para transformar a realidade, ou traça finalidades que antecipam idealmente sua transformação, mas num e noutro caso fica intacta a realidade efetiva." (p. 203) e "Enquanto a atividade prática pressupõe uma ação efetiva sobre o mundo, que tem por resultado uma transformação real deste, a atividade teórica apenas transforma a nossa consciência dos fatos, nossas idéias sobre as coisas, mas não as próprias coisas." (p.210)

        Muitas vezes nos discurso ou trabalho em sala de aula, as professoras tentam reduzir o prático ao que é utilitário, ao que tem uma utilidade já encontrada dentro da nossa sociedade. O conhecimento teórico, dessa forma, é apresentado como útil ou verdadeiro, a partir do momento em que se consegue vislumbrar algumas de suas aplicações na prática. Os próprios materiais didáticos, ao apresentarem sempre exemplos na área médica, após a discussão sobre as características de morfologia e fisiologia de microrganismos, também tentam encontrar um caminho para valorização do conhecimento teórico, a partir de evidências de sua utilidade. Nos materiais didáticos passa-se a idéia de que, a partir do momento em que o conhecimento teórico foi considerado verdadeiro, ele pôde ter sua utilidade na prática: por exemplo, o entendimento do ciclo de vida dos microrganismos leva à elaboração de medidas profiláticas; a partir de estudos das características bioquímica, morfológicas e fisiológicas dos microrganismos é possível a obtenção de vacinas e medicamentos, dentre outros. TESSER (1986) afirma que o critério de verdade é a prática, e não os atributos da teoria como clareza, evidência ou outros aspectos. O conhecimento verdadeiro decorre não do objeto, mas da atividade prática transformadora, presidida por uma teoria crítica onde os termos sujeito-objeto não se opõem mas interagem.

        Já no universo das escolas técnico-profissionalizantes, falar sobre tecnologia não causa estranheza. Mas, em comum com as concepções encontradas com as professoras que trabalham no Inciso III, tecnologia aqui também é descrita como vidrarias, instrumentos, aparelhos (microscópio, autoclave), Biotecnologia, etapas de procedimentos laboratoriais(10). E mais, é bastante comum que façam a vinculação do desenvolvimento tecnológico ao científico, sendo a Tecnologia dependente da Ciência. Uma das professoras, entretanto, nos mostrou em pequena passagem de sua entrevista que o local para produção de tecnologias pode não ser necessariamente uma Instituição Científica : falou-nos sobre projetos numa área que hoje os cientistas chamam de Biotecnologia, e que ela já desenvolvia há mais de 10 anos em uma indústria.

         De uma forma geral, comparando-se com as informações descritas a respeito das concepções de Tecnologia e suas relações com a Ciência e Sociedade presentes nos materiais didáticos utilizados nessas escolas profissionalizantes, reconhecemos que existe um empobrecimento daquilo que foi encontrado no discurso das professoras e em aulas a que assistimos. Em ambos, as professoras restringiram-se em identificar Tecnologia como posterior à Ciência e cujas características do trabalho tecnológico são muito atreladas ao trabalho científico. No discurso das professoras das escolas técnicas, não é feita qualquer alusão às outras possibilidades que os materiais didáticos apresentam para a discussão das relações entre Ciência e Tecnologia. Por exemplo, as particularidades da Tecnologia que marcam a sua independência em relação à Ciência, ou mesmo a consideração de que essas duas instâncias sejam interdependentes. Tais possibilidades, entretanto, são apontadas em um número bastante considerável de exemplos nas apostilas que as professoras utilizam.
 

Algumas condições para o início de uma prática inovadora no ensino de Biologia

         Acreditamos que o movimento CTS dentro do currículo de Biologia preocupa-se em estimular a tomada de atitudes pelo aluno, levando-o a participar da Sociedade contemporânea no sentido de busca de alternativas para a aplicação da Ciência e da Tecnologia. Em nossa opinião, é necessário, primordialmente, que se redimensionem os conceitos de Ciência e Tecnologia, a fim de que não insistamos na manutenção de uma perspectiva da neutralidade desses elementos. Se, com o ensino de Biologia, gostaríamos de possibilitar ao nosso aluno uma transformação da realidade, é fundamental que não restrinjamos as abordagens das interações dos elementos Ciência e Tecnologia, entre si e com a Sociedade.

        A Tecnologia tem representado um elemento marcante dentro da sociedade contemporânea, tantos nas relações de trabalho quanto na vida cotidiana. Entretanto, ainda na atualidade, o ensino de Biologia centra-se na transmissão do conhecimento biológico produzido nas Universidades, eleito como verdade a respeito da interpretação da realidade. Ele é preponderante sobre qualquer outro tipo de conhecimento, inclusive o tecnológico. Numa forma mais hegemônica de conceber tecnologia, esta estaria atrelada à ciência, como sendo uma aplicação prática dessa. O que tem resultado dessa concepção? Uma certa neutralidade tanto do conhecimento científico como do conhecimento tecnológico, que são vistos como busca de melhorias para a humanidade, intervenção positiva no campo social, construção de um saber a respeito da Natureza, independente de aspectos econômicos, políticos, ideológicos.

        Talvez os seguintes fatos possam vir a contribuir, enquanto exemplos, para a discussão e reflexão nas nossas escolas sobre a positividade /neutralidade da ciência e tecnologia: clone de ovelha, Dolly , resultado secundário de uma pesquisa que buscava interpretar aspectos da embriologia e fertilização em mamíferos realizada por centro de pesquisa atrelado a interesses agropecuários? pesquisas sobre a Aids ,o encontro da cura , a comercialização dos medicamentos e a socialização da "descoberta científica/tecnológica", aspectos associados não apenas ao conhecimento ou à informação científica; aplicação e desenvolvimento de técnicas de hidroponia no Brasil e o movimento dos sem-terra na perspectiva de conquista de solo para plantio/cultivo; pesquisas e movimentos científicos sobre preservação da biodiversidade na botânica e zoologia versus ocupação de mananciais versus problemas de habitação; novas tecnologias de alimentos versus consumo versus fome etc, etc.

         Outros aspectos, que conduzem a uma discussão na direção que propomos, são apontados por AULER, STRIEDER & CUNHA (1997), quando citam temas como efeito estufa, destruição da camada de ozônio, poluição ambiental generalizada, chuva ácida, água potável, questão energética. Tais temas representariam problemáticas geradas ou potencializadas pela ciência-tecnologia (e acrescentaríamos dentro do contexto da sociedade capitalista atual) comprometedoras da nossa sobrevivência e dos demais seres vivos, se mantidos os atuais padrões de consumo.

         Na nossa opinião, mudar o enfoque para o conhecimento tecnológico abre a possibilidade de questionar o real valor do conhecimento científico para o progresso da humanidade, haja vista que na contemporaneidade as relações entre ciência e tecnologia ganharam uma enorme proximidade, chegando-se à quase impossibilidade de separá-las na prática. Porém, há grandes possibilidades, ainda, de o aprendizado de tecnologias significar o acesso a um repertório técnico, mecânico, que apenas permita ao cidadão "saber usar as máquinas" ou conhecer os princípios científicos usados como base para a construção das tecnologias, sem fazer uma avaliação mais crítica do impacto da tecnologia na organização de sua forma de viver. Ao se atrelar a educação ao trabalho, uma das propostas para o Ensino Médio, trazem-se novas necessidades de várias reflexões, que passariam pelo dimensionamento da Biologia no que diz respeito a seu papel nos sistemas de produção, nas formas de organização do trabalho, via biotecnologias, e em outras práticas cotidianas, que incluam, por exemplo, aspectos do campo da ética e da estética, destacáveis quando se dimensiona o trabalho como uma atividade humana de transformação, de mudança da natureza, a partir das diversas práticas sociais.

         Queremos deixar em evidência, devido à sua grande importância, como analisa GOUVEIA (1992) , que em todo e qualquer projeto de capacitação docente, de formação continuada - na atualidade, pólo principal para a inovação curricular - deve-se considerar a necessidade de os professores participarem do processo de mudança, num constante movimento de ação- reflexão- ação, permeado por uma teorização que redimensione a sua prática, que já é concreta, real, já existe. É o que eles pensam sobre essa prática ou o que fazem que constitui o ponto de partida e de chegada para a ocorrência de mudança.

         A pesquisa que realizamos não teve como objetivo uma intervenção na prática das professoras. Apesar de que, com os vários contatos que tivemos com as professoras, durante a coleta de dados, foi possível a discussão a respeito de diferentes aspectos da realidade escolar. As professoras encontraram em nós, muitas vezes, cúmplices de uma mesma situação, para a qual procurávamos soluções, mesmo que separadamente. Acreditamos, contudo, que os dados coletados e analisados neste artigo já nos permitem alguns indicativos que auxiliariam na construção de um projeto de inovação curricular, centrado no contexto CTS. As concepções das professoras e dos materiais didáticos sobre as relações CTS são, na nossa opinião, pistas que temos para a elaboração de qualquer proposta de atividades que abordem esse tema. Uma vez cientes das dimensões que são atribuídas para cada um dos elementos dessa trilogia e suas inter-relações, estaríamos incorrendo em menos perigo de reforçar apenas algumas das interações possíveis ou até mesmo reforçando as relações CTS mais lineares e que conduzem a uma menor criticidade do papel da Ciência e Tecnologia na Sociedade moderna.

         As evidências de que as professoras, em seu discurso e/ou prática, trabalham aspectos diferentes das relações CTS em sala de aula também podem nos fornecer pistas dos possíveis pontos para iniciar a discussão sobre a importância de tal abordagem e aonde geralmente conseguimos chegar com os enfoques que já são explorados em sala de aula, bem como as estratégias de ensino utilizadas.
 

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(1) O Ensino de Biologia e as Relações entre Ciência/Tecnologia/Sociedade: o que dizem os professores e o currículo do ensino médio? (volta para o texto)

(2) Quando analisamos os materiais didáticos, encontramos resultados que em muito se aproximas das discussões construídas por teóricos da socilogia do currículo relacionadas às formas pelas quais o currículo corporifica fundamentalmente um "conhecimento oficial" que expressa o ponto de vista de grupos socialmente dominantes - em termos de classes, gênero, raça, nação. SILVA (1996) ressalta que a educação, o currículo e a pedagogia estão envolvidos numa luta em torno de significados. Esses significados freqüentemente expressam o ponto de vista dos grupos dominantes. Com menos freqüência, eles são disputados e contestados por pessoas e grupos socialmente subordinados.(volta para o texto)

(3) Ver AIKENHEAD, G.S. (1990; 1992); AMORIM, A.C.R. (1997b) GASKELL, P.J. (1982); GARDNER, P. (1994); McCONNELL, M.C. (1992); SOLBES, J. & VILCHES, A. (1989). (volta para o texto)

(4) Para aprofundamento da análise e visando a permitir a exploração maior das relações CTS identificadas, escolhemos um tema do conhecimento da Biologia, que foi a Microbiologia. (volta para o texto)

(5)  Os testes descritos variam de acordo com a natureza do curso técnico. Então, para o curso de enfermagem, há uma preocupação com testes para identificação de microrganismos na urina, mãos, fezes, ar. Já para o curso de Alimentos, há destaque para os testes de identificação de microsganismos em alimentos enlatados, leite, picles etc. Os testes descritos e realizados na disciplina Microbiologia do Curso de Bioquímica têm características mais próximas às do curso de Alimentos. Então, descreve testes para análise microbiológica do leite, picles. Em todos os cursos há destaque para estudos microbiológicos de água. (volta para o texto)

(6) Recente lançamento de livro didático de Biologia tras, dentro da Unidade de Genética, capítulos denominados Engenharia Genética e Genética e Biotecnologia na Sociedade Contemporânea. Um dos livros adotados traz algumas discussões sobre Engenharia Genética dentro do capítulo Microrganismos e Biotecnologia. (volta para o texto)

(7) GRANGER (1994) discute que, na penetração das técnicas pelo conhecimento científico, ocorreu um fenômeno que denomina de normalização rigorosa das ações e dos produtos, condição indispensável para a baixa de custos e da produção de massa. O progresso das técnicas levou à descaracterização da produção de obras individualizadas, típicas do trabalho artesanal. Isso porque, "para poder aplicar os conhecimentos estabelecidos pela ciência, os técnicos devem selecionar cada vez mais os materiais de acordo com normas estritas, codificar os procedimentos, ordenar os ciclos de execução" (p. 37) (volta para o texto)

(8) Durante as aulas a que assistimos, procuramos registrar as situações proporcionadas pelas professoras, ao abordar os conteúdos, quanto pelos alunos, ao fazerem perguntas, que possibilitariam tratar de algum aspecto dentro das relações CTS. Tais informações foram objeto de diálogo durante a entrevista, instrumento principal de coleta de dados sobre o discurso das professoras. (volta para o texto)

(9) Para maior detalhamento, ver AMORIM (1995b). (volta para o texto)

(10)  É fundamental destacarmos a diferenciação, quanto às concepções de tecnologia, encontrada no discurso da profes-sora da escola A2. Quando, em nossa entrevista, perguntamos-lhe sobre tecnologia, citou-nos  o exemplo de processos fermentativos, para os quais eram utilizadas técnicas. Podemos identificar uma concepção mais abrangente de tecnologia, considerada como processo, utilizado inclusive em indústrias. Ao ler o  material didático elaborado por essa professora, percebemos que  introduz uma série de tópicos e assuntos  bastante diferentes dos en-contrados nos demais materiais, com ênfase em aspectos que não são comuns ao tratamento de assuntos ligados à Microbiologia, que não foram comuns, por exemplo, nos cursos que fizemos nessa área, mais voltados para os conhecimen-tos na área de Ciências Biológicas. Como explicação para essas diferenças encontradas, é possível que se relacionem a área de formação da professora que trabalha na escola A2, que é diferente das demais, pois fez curso de Química, e ao fato de que no início de suas atividades no Magistério desenvolvia também atividades profissionais em indústrias. (volta para o texto) 

 

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  IENCI@IF.UFRGS.BR
 

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