As estrelas que vemos no céu noturno estão centenas de milhares de vezes mais distantes de nós do que os astros do sistema solar (planetas e o Sol, este último também uma estrela). A estrela mais próxima (depois do Sol) está tão longe que a nave espacial mais rápida que já desenvolvemos levaria quase 100.000 anos para chegar até ela. Ainda assim, por curiosidade e ambição, queremos saber como as estrelas se formam, por que estágios passam e como deixam de existir. Como podemos aprender sobre objetos tão remotos e fora de nosso alcance? Este texto lhe transmite algumas idéias de como podemos aprender e o que descobrimos sobre as estrelas.
Contrariamente a outras ciências, a Astronomia é inteiramente observacional. Não podemos fazer experimentos em Astronomia. Não podemos manipular os objetos astronômicos e ver como se comportam. O primeiro passo para poder entender os astros é o de determinar suas distâncias a nós. Obviamente, não podemos usar uma fita métrica ou enviar uma sonda espacial e determinar o quão longe ela viaja até atingir uma estrela. Métodos como enviar sinais de radar e esperar pelo seu eco por reflexão também não funcionam pois: (1) estrelas são bolas de gás quente e não possuem um superfície refletora eficiente; (2) elas estão tão longe que um sinal de radar levaria vários anos para chegar e ser refletido de volta, mesmo para a estrela mais próxima.
Um método eficaz de se medir grandes distâncias vem sendo usado há milênios: observar um objeto a partir de dois pontos diferentes, determinando a distância ao objeto através do uso da trigonometria. O objeto, ao ser visto de pontos diferentes, parecerá mudar de posição com relação às coisas que estão ainda mais distantes e que compõem o fundo sobre o qual o objeto está projetado. O deslocamento angular, chamado de paralaxe, é um ângulo de um triângulo e a distância entre os dois pontos de observação, bem como a distância ao objeto, são lados do mesmo triângulo. Relações trigonométricas básicas entre os lados de um triângulo e os seus ângulos são então usadas para calcular todos os elementos do triângulo. Este é o método da paralaxe trigonométrica.
O lado do triângulo entre os pontos de observação, designado por B na figura acima, é chamado de linha de base. O ângulo p é o paralaxe da árvore e é proporcional à linha de base. Se o paralaxe p é muito pequeno para poder ser medido, devido à grande distância à árvore, então faz-se necessário aumentar a distância entre os dois pontos de observação, ou seja, aumentar a linha de base. Normalmente, seria necessário usar funções trigonométricas como a tangente ou o seno, mas se o ângulo p é muito pequeno, há uma relação mais simples entre o paralaxe p, a linha de base B e a distância d:
p(") = (206265 × B)/d,
onde o ângulo p na fórmula acima é medido em segundos de arco (1° = 60´ = 3600 ", a última unidade usada nesta igualdade é o segundo de arco). Quanto mais distante o objeto, menor seu paralaxe. Como os valores de p das estrelas são muito pequenos, o segundo de arco é a unidade mais conveniente para exprimí-los. A ponta de uma caneta esferográfica, se vista de uma distância igual ao comprimento de um campo de futebol, cobre 1" aproximadamente.
Como usar o paralaxe trigonométrico para medir distâncias às estrelas? Elas estão tão longe que se observássemos uma estrela de dois pontos opostos sobre a superfície da Terra, seu paralaxe ainda seria pequeno demais para ser medido. Precisamos de uma linha de base ainda maior. A maior linha de base que pode ser facilmente usada é o raio da órbita da Terra, que é também a distância da Terra ao Sol---uma unidade astronômica (UA) ou 149.6 milhões de quilômetros. A posição de uma estrela próxima com relação às mais distantes ao fundo é anotada duas vezes, usando dois pontos opostos na órbita da Terra (ou seja, em dias separados por seis meses). O paralaxe p será então a metade do ângulo total de deslocamento da estrela com relação aos objetos ao fundo (ver figuras abaixo).
As distâncias às estrelas são enormes, muito maiores do que a unidade astronômica. Assim sendo, faz-se necessária a utilização de uma unidade de distância maior. Definimos 1 parsec (abreviatura: pc) como sendo a distância a uma estrela cujo paralaxe é de 1" (usando-se uma linha de base B = 1 UA). Usando a fórmula acima, vemos que 1 parsec = 206,265 unidades astronômicas. A estrela mais próxima de nosso sistema solar está a 1.3 parsec. Para convertermos parsecs em unidades convencionais como quilômetros ou metros, basta lembrarmos o valor da unidade astronômica nessas unidades. 1 UA = 149.6 milhões de quilômetros. Logo, 1 pc = 3.1 trilhões de km! Em anos-luz, 1 parsec = 3.26 anos-luz.
Que unidade devemos usar para
expressar as distâncias estelares: o ano-luz ou o parsec? Ambas
são adequadas e comumente usadas pelos astrônomos.
Entretanto,
vale notar que se usarmos o parsec como unidade de distância e o
segundo de arco como unidade de ângulo, nossa fórmula que
relaciona as duas coisas se torna extremamente simples: p(")
= 1/d.
Paralaxes da ordem de 1/50=0.02"
podem ser medidos da superfície da Terra. Isso significa que
podemos determinar as distâncias de estrelas situadas a
até 50
parsecs do sistema solar. Se uma estrela está além deste
limite,
seu paralaxe é pequeno demais para poder ser medido, o que nos
obriga a usar métodos mais indiretos de
determinação de distâncias.
A distância média entre duas estrelas vizinhas é de
1 pc
aproximadamente, o que faz com que possamos determinar as
distâncias
de algumas milhares estrelas próximas através da medida
de seus
paralaxes. Recentemente, a missão espacial Hipparcos completou
seu trabalho de extender a base de dados de distâncias
paraláticas.
Instrumentos fantasticamente precisos foram instalados a bordo de
um satélite em órbita da Terra, evitando assim os efeitos
degradantes da atmosfera terrestre sobre as imagens astronômicas.
Foi então possível medir paralaxes para 118,000 estrelas
com
uma precisão de 1/1000 = 0.001 " (em torno de 20 vezes
melhor do que do solo)! Hipparcos mediu paralaxes para 1 milhão
de outras estrelas com uma precisão de 1/20".
Os triângulos que contêm a Terra, o Sol e uma estrela como vértices são muito mais alongados e finos do que os geralmente esquematizados nos livros de Astronomia. São tão finos que não precisamos nos preocupar com que distância estamos na verdade medindo com o paralaxe: a distância do Sol à estrela ou a distância da Terra à estrela. Observe o longo e fino triângulo mostrado acima. Levando em conta que este triângulo deveria ser mais de 4,500 vezes mais longo, mesmo para a estrela mais próxima, podemos ver que não faz diferença de que distância estamos falando. Os mais insistentes podem considerar os números da tabela abaixo.
distância do Sol à estrela mais próxima = | 267,068.230220 UA = | 1.2948 pc; |
distância da Terra à estrela mais próxima = | 267,068.230222 UA = | 1.2948 pc; |
distância de Plutão à estrela mais próxima= | 267,068.233146 UA = | 1.2948 pc! |
Sim, há de fato uma diferença ínfima entre as distâncias acima, mas em primeira aproximação, podemos dizer com segurança que as três são iguais.
unidade astronômica | parsec | paralaxe trigonométrica |
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Quando o método do paralaxe não é aplicável devido à grande distância à estrela, um método indireto chamado de Lei de variação de brilho pelo inverso do quadrado da distância pode ser aplicado. Este método se baseia no fato de que uma fonte de luz se torna mais fraca de maneira previsível à medida em que sua distância a um observador aumenta. Se sabemos a quantidade de luz que uma estrela emite, podemos então inferir sua distância a partir da medida do seu brilho. A quantidade de energia luminosa que uma estrela emite por unidade de tempo é chamada de luminosidade (geralmente representada pela letra L). Estrelas se tornam mais tênues se suas distâncias aumentam porque sua luminosidade L se espalha sobre uma superfície cada vez maior.
O "brilho" de uma estrela (chamado de fluxo) decresce com o quadrado de sua distância. O fluxo é a quantidade de energia que chega a uma área unitária (digamos, 1 cm2) de um detetor (por exemplo, nossos olhos, um filme fotográfico, um CCD) em um tempo unitário (digamos, 1 segundo). A energia de qualquer fonte de luz é irradiada radialmente em todas as direções. Assim, esferas concêntricas (centradas na fonte de luz) recebem a mesma quantidade de luz a cada instante.
A mesma quantidade de energia tem que passar por cada superfície esférica, independentemente de seu raio. Como a área de uma superfície esférica de raio r é 4pr2, o fluxo F de energia por essa superfície será dado por
F = L / 4pr2.
Isso porque L é a energia que atravessa toda a esfera por unidade de tempo, sendo F a energia por unidade de tempo e por unidade de área. Essa é a lei do inverso do quadrado! Aumentando a distância o fluxo decresce com o quadrado do mesma.
Colocado de outra forma, diminuindo o fluxo, a distância tem que aumentar com a raiz quadrada do mesmo. Se sabemos a luminosidade da estrela e medimos seu fluxo, então podemos determinar sua distância a nós.
fluxo | Lei de variação de brilho pelo inverso do quadrado da distância |
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