A natureza da luz

A Astronomia vive quase que exclusivamente da luz captada dos objetos celestes. É através da luz por eles emitida, refletida ou absorvida que tiramos informações sobre os astros. Estrelas, como o Sol, emitem luz, enquanto que os planetas do sistema solar e seus satélites refletem a luz solar. A Lua, nosso satélite natural, também reflete a luz do Sol, sendo que sua aparência no céu, expressa pelas fases da Lua, depende da posição da Lua relativa ao Sol no espaço. A Lua também bloqueia a luz do Sol durante um eclipse solar. Analogamente, detetamos a presença de poeira no espaço entre as estrelas através da sua capacidade de também absorver a luz destas últimas. Outro exemplo de objeto que não emite luz, mas cuja presença é detetada pelo seu efeito sobre aqueles que a emitem é o buraco negro. Os vários candidatos a buraco negro na Galáxia são membros de um par ou sistema múltiplo de estrelas, as quais sofrem perturbação gravitacional devida a estes objetos.

Pôr do Sol

O Sol no horizonte.

Tendo em mente a íntima relação entre a Astronomia e a luz, é indispensável entendermos melhor o que é a luz, como forma de estudar Astronomia. A luz com certeza é uma forma de energia; a luz solar esquenta o ar e superfície da Terra, como todos sabemos. Sabemos também que a luz solar pode ser decomposta em diferentes cores, como no arco-íris. Sabemos ainda que o Sol é branco-amarelado quando está alto no céu, mas bem amarelo ou alaranjado no nascente e no poente (ver imagem acima). Estes exemplos cotidianos nos mostram que a luz é uma forma de energia em propagação e capaz de interagir com a matéria. Podemos reproduzir um arco-íris fazendo com que a luz do Sol atravesse um prisma, ou mesmo uma superfície de água com um espelho submerso. Na verdade, a luz se propaga na forma de ondas e as diferentes cores refletem variações nas propriedades destas ondas. A figura abaixo mostra uma animação representando uma onda em propagação. O exemplo mostrado não é o das ondas de luz, mas de ondas mais próximas de nossa experiência cotidiana: as ondas do mar.

Ondas de luz

Ondas em propagação.

O ponteiro acima conta o número de ondas que passam por qualquer ponto da figura. O número de ondas que passam por um ponto é o que chamamos de freqüência de onda. Geralmente a freqüência de uma onda é medida em número de ondas por segundo ou Hertz (Hz) e representado pela letra grega ν.

Outra forma de caracterizar uma onda é pelo seu comprimento, geralmente representado pela letra grega λ. A figura abaixo mostra que o comprimento de onda é a distância entre dois máximos ou dois mínimos da onda.

Ondas de luz

O comprimento de onda.

Note que o comprimento de onda multiplicado pelo número de ondas que atravessam um ponto por unidade de tempo nos dá a velocidade de propagação desta onda. Matematicamente, c = λ ν, onde c = 3 x 108 m/s é a velocidade da luz no vácuo. Como a velocidade da luz é fixa em um dado meio, a fórmula acima significa que quanto menor o comprimento de onda, maior a freqüência da onda e vice-versa.

Uma pergunta importante, que ainda não respondemos é: que forma de energia as ondas de luz carregam de um ponto a outro? Sabemos que as ondas na superfície da água levam energia mecânica da água. É o caso das ondas que se formam ao jogarmos uma pedra em um lago tranquilo; ou ainda o caso das ondas do mar que se quebram numa praia, que aumentam de tamanho quando um navio passa perto. No caso da luz, a energia por ela transportada não é mecânica, mas sim eletromagnética. Ou seja, são perturbações nas propriedades eletromagnéticas, mais especificamente nos vetores campo elétrico e campo magnético, que se propagam pelo espaço através da luz. Por isso, um sinônimo para a luz pode ser "ondas eletromagnéticas" ou "radiação eletromagnética". As figuras abaixo procuram mostrar a forma como variam os campos elétrico E e magnético B com a passagem da luz.

Ondas de luz

O campo eletromagnético.

Ondas de luz

O campo eletromagnético.

Notem que os campos elétrico e magnético oscilam em direções perpendiculares entre si e perpendiculares à direção de propagação da onda. Em resumo, podemos dizer que o fenômeno da luz é um fenômeno ondulatório, pelo qual energia associada ao campo eletromagnético se propaga por um meio, perturbando este campo ao fazê-lo.

A freqüência e o comprimento das ondas eletromagnéticas variam enormemente. A luz visível, à qual nossos olhos são sensíveis, tem comprimentos de onda no domínio 4000 < λ < 7000 Angstroms, onde 1 Angstrom = 1 A = 10-10 m. As ondas de luz visível são, portanto, extremamente pequenas. Como a velocidade da luz é conhecida, podemos calcular a faixa de freqüências correspondente, já que ν = c / λ. Logo, 4.3x1014 < ν < 7.5x1014 Hz. Nossos olhos distinguem ondas de luz visível de diferentes freqüências como cores diferentes. A luz violeta tem λ = 4000 A, enquanto que a luz vermelha, no outro extremo do arco-íris, tem λ = 7000 A. Note que há luz com comprimentos de onda tanto maiores quanto menores do que os limites da luz visível. A famosa radiação ultra-violeta, da qual a camada de ozônio nos protege, tem comprimentos de onda menores do que 4000A, em torno de λ = 3000A. Nosso olhos não captam esta radiação, mas nossa pele com certeza sofre com ela! Em comprimentos de onda ainda menores, chegamos aos raios-X e depois aos raios gama. Para além da luz vermelha, temos ondas infra-vermelhas, microondas e ondas de rádio. Todas fazem parte do mesmo fenômeno: a radiação eletromagnética.

Espectro

O espectro eletromagnético.

A figura acima resume os diferentes domínios das ondas eletromagnéticas, mostrando o que chamamos de espectro eletromagnético. O comprimento de onda decresce da esquerda para a direita, mostrando a seqüência das ondas de rádio até os raios gama. Os valores de λ, em metros, são dados. São também mostrados objetos de tamanho comparável às ondas de cada domínio. As ondas de rádio, usadas em telecomunicações (TVs, rádios, etc) têm dimensões comparáveis a objetos de nossa experiência cotidiana. Note que a luz visível é uma fração ínfima de todo o espectro eletromagnético.

A Tabela abaixo dá os valores aproximados em comprimento de onda, frequência e energia para regiões selecionadas do espectro eletromagnético.

Espectro de Radiação Eletromagnética
Região Comp. Onda
(Angstroms)
Comp. Onda
(centímetros)
Frequência
(Hz)
Energia
(eV)
Rádio > 109 > 10 < 3 x 109 < 10-5
Micro-ondas 109 - 106 10 - 0.01 3 x 109 - 3 x 1012 10-5 - 0.01
Infra-vermelho 106 - 7000 0.01 - 7 x 10-5 3 x 1012 - 4.3 x 1014 0.01 - 2
Visível 7000 - 4000 7 x 10-5 - 4 x 10-5 4.3 x 1014 - 7.5 x 1014 2 - 3
Ultravioleta 4000 - 10 4 x 10-5 - 10-7 7.5 x 1014 - 3 x 1017 3 - 103
Raios-X 10 - 0.1 10-7 - 10-9 3 x 1017 - 3 x 1019 103 - 105
Raios Gama < 0.1 < 10-9 > 3 x 1019 > 105

Objetos astronômicos formam categorias bem distintas quando consideramos a radiação eletromagnética por eles emitida. Estrelas, por exemplo, emitem o grosso da sua luz na região do visível ou do infravermelho. As estrelas mais quentes também emitem muita luz no domínio do ultravioleta. Considerando-se agora não apenas a luz visível, mas os demais domínios espectrais, deixa de ser verdade que planetas e satélites como a Lua não emitem luz. Estes objetos emitem radiação no infravermelho distante, já perto do domínio de microondas. Há alguns tipos de objetos, como determinados núcleos de galáxias, que emitem muita radiação tanto de alta energia (raios X) quanto em rádio. Rádio-galáxias, por seu turno, emitem o grosso de suas ondas eletromagnéticas no domínio rádio. Há também galáxias luminosas em outros domínios, como no infravermelho. Estas em geral são ricas em poeira aquecida por estrelas quentes e jovens, pois a poeira absorve a luz dessas estrelas e reemite no infravermelho. Ao longo deste curso, ficará evidente a grande diversidade de fontes astronômicas, com emissão de luz caracterizada por espectros das mais variadas formas.

 A tabela abaixo indica, para cada região do espectro, os objetos astronômicos que podem ser estudados com maior eficiência nessa região.

Comprimento de Onda Objeto Característico
Raios Gama Objetos compactos em colisão (estrelas de neutrons, buracos negros, ...)?
Raios X Estrelas de Neutrons
Ultravioleta Estrelas quentes, Quasares
Visível Estrelas
Infra-vermelho Estrelas Gigantes Vermelhas, Núcleos de galáxias
Infra-vermelho distante Proto-estrelas, poeira, planetas
Millímetro Poeira fria, nuvens moleculares
Rádio (cm) Hidrogênio neutro, pulsares

(Tabela extraida de http://instruct1.cit.cornell.edu/~tlh10/lec12.htm.)