São Paulo, quinta-feira, 07 de março de 2002

 

 

SOCIEDADE

Encontro será iniciado hoje, na sede da Unesco

Conferência na França discute a participação da mulher na física

ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

O mundo da ciência é politicamente incorreto. Na física, então, nem se fala. Os homens dominam. As mulheres enfrentam toda sorte de discriminação. Com o objetivo de discutir e corrigir essa desigualdade universal, existente tanto nos Estados Unidos quanto na Índia, começa hoje, em Paris, a Conferência Internacional Sobre as Mulheres na Física.
Participam do encontro 300 cientistas de 65 países. Apenas 5% deles são homens. Os debates vão até sábado na Maison de l'Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), onde ocorreu ontem a entrega dos Prêmios L'Oréal para Mulheres na Ciência.
A conferência foi organizada por um grupo de trabalho criado pelo Iupap (União Internacional de Física Pura e Aplicada), entidade que congrega físicos e físicas de todo o mundo. Desde 1999, o grupo está estudando e coletando dados a respeito da situação das mulheres nesse ramo da ciência.
Quem comanda o grupo é uma física brasileira, Márcia Barbosa, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É ela quem vai fazer a palestra de abertura da conferência, à qual comparecem outras brasileiras, como Elisa Baggio Saitovitch, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Física.
"Nosso propósito é não apenas debater os problemas, mas tirar resoluções, que serão levadas aos governos dos diferentes países", diz Barbosa. Entre as propostas: tornar mais transparentes as regras dos concursos acadêmicos e dos centros de pesquisa; organizar conferências com um percentual relevante de mulheres; estimular os países a buscar formas opcionais de ensino, que não sejam masculinamente orientadas.
Barbosa enumera os principais problemas que afastam as mulheres da física: dificuldade de conciliar a carreira exigente com a vida familiar, o machismo da sociedade brasileira e o preconceito desenvolvido na escola. "Quando conto que sou física, as pessoas me dizem: "Mas como?". Elas imaginam alguém com um guarda-pó branco, mal vestido, descabelado. Você acha que, criando tal imagem na escola, uma garota de 15 anos vai querer fazer física?"
No Brasil, o número de mulheres no corpo docente de física das universidades chega a 15%. Não é um índice tão ruim, pois equivale ao da França e dos EUA. Na Alemanha, é de catastróficos 4%.
A batalha das mulheres não é só aumentar essa proporção, mas criar oportunidades de ascensão na carreira. "No Brasil, se contarmos quantas estão em posições de poder, como diretoras de instituto e chefes de comissões científicas, o índice não chega a 1%", diz.
A química e a biologia têm interessado mais as mulheres do que a física. Mas, mesmo naquelas ciências, a presença feminina não é muito significativa. "O pensamento abstrato da física atrai menos, mas por preconceito e falta de estímulo", diz a pesquisadora.