Instituto de Física da UFRGS: 1959 - 2004

Página-index

Mapa do site

Comissão Organizadora


Principais Financiadores

Crônicas & Depoimentos

Esta página e todo o site IF 45 anos, estão completamente abertos às contribuições de colegas do IF e de outras instituições. Esperamos contar com a colaboração de todos para o enriquecimento do site. Gostaríamos de publicar crônicas e depoimentos que tenham a ver com a história do Instituto. Por favor, enviar contribuição para o endereço eletrônico do

Nota Introdutória


Tradução, com pequenas adaptações, de Introductory Note, de Darcy Dillenburg e Gerhard Jacob, publicada no livro Current Topics in Nuclear Physics and Quantum Field Theory - Festschrift for Th.A.J.Maris, editado por D. Dillenburg, G. Jacob, P. Kitching, C. Vasconcellos. Porto Alegre: Editora da Universidade (1994).

Em 1958 foi decidida a criação de um Instituto de Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tendo como principal objetivo ministrar o ensino de Física em toda a Universidade.

Como freqüentemente é o caso nos países em desenvolvimento, tal decisão foi tomada em base puramente administrativa por burocratas do governo federal: era parte de um plano mais ambicioso de "Educação para o Desenvolvimento", através do lançamento de Institutos em várias áreas científicas distribuídas por diversas Universidades de todo o Brasil, para proporcionar ensino em disciplinas básicas comuns à formação de diferentes profissionais. Mesmo a partir dessa concisa descrição é fácil de compreender que o plano, como um todo, foi um grande fracasso, pois a maioria das Universidades não estava científica e academicamente preparada para estabelecer tais Institutos.

Uma das poucas exceções foi a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde o Instituto de Física teve rápido sucesso em realizar pesquisa em nível internacional. Duas razões podem ser apontadas para tal sucesso: a) O Instituto, que se desenvolveu a partir de um pequeno Centro de Pesquisas Físicas iniciado na Universidade em 1953, tinha como linha mestra de sua política de pesquisa um desenvolvimento rápido mas orgânico. b) O novel Instituto conseguiu desde logo assegurar a colaboração de Theo Maris, ativo e promissor físico alemão, então na Universidade Estadual da Flórida, que veio inicialmente para ficar um ano em Porto Alegre e está aqui até hoje.

É a segunda razão que nos diz respeito mais especificamente aqui. Mas umas poucas palavras sobre o Centro são de importância contextual. Sua criação resultara do forte empenho de um pequeno grupo de pessoas em iniciar pesquisa em Física na Universidade e assim ir além da formação de professores para o ensino médio, única função do Departamento de Física à época. Tal aspiração representava, qualitativamente, um radical afastamento da tradição de formação profissional da Universidade. O principal sucesso do Centro acabou sendo a criação de um bom laboratório de eletrônica, integrado por uns poucos engenheiros e estudantes que gravitavam em torno de Gerard Hepp, engenheiro eletrônico holandês que permaneceu por vários anos no Instituto de Física em Porto Alegre. As tentativas de trazer físicos visitantes estrangeiros não prosperaram à época, e nenhum trabalho científico foi publicado.

Quando o Instituto de Física sucedeu o Centro, estava claro que visitantes por longo prazo seriam essenciais para obter qualquer sucesso em pesquisa. Uma busca realmente global foi encetada, via correio, visando a encontrar um físico experiente que pudesse dirigir pesquisa em Física Nuclear. Em 1959, Marcos Moshinsky, que havíamos conhecido no Brasil no ano anterior, organizou a primeira Escola Latino-americana de Física, na Cidade do México. Lá soubemos, através de um dos participantes dos Estados Unidos, que Theo Maris, físico nuclear teórico da Universidade da Flórida, desejava trabalhar por algum tempo na América do Sul. Ele havia colaborado, como teórico, em experiências realizadas na Universidade de Uppsala. (Isso parecia ideal, pois se pensava que pesquisa experimental em Física deveria ser iniciada o mais rápido possível, e a espectroscopia nuclear havia sido escolhida como ponto de partida).

Assim, o Reitor da Universidade foi persuadido a convidar Theo Maris a vir para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul por um ano, com a tarefa principal de dar início à pesquisa em Física.

Antes de prosseguir com a chegada de Theo a Porto Alegre, é oportuna uma breve descrição de sua carreira acadêmica.
Theodor August Johannes Maris nasceu em Wert, Holanda, em 3 de janeiro de 1920. Após concluir a escola média, ele foi para a Alemanha, onde estudou Física na Universidade de Munique. Obteve seu Ph.D. summa cum laude em 1954 com a tese "Über die Statistische Auffassung der Entropie in Nicht-Stationären Prozessen", orientada por F. Bopp. Em Munique ele também encontrou sua futura esposa, Wiltrud, e também lá nasceram suas duas filhas mais velhas, Elisabeth e Eva Maria.

De Munique, Maris mudou-se para a Suécia, primeiro para o Instituto Nobel, em Estocolmo (1954), depois para o Instituto Gustaf Werner de Química Nuclear em Uppsala (1956), onde havia um acelerador de prótons de 185 MeV (considerada naquela época uma máquina de alta energia). Em 1958 ele foi para o Instituto de Física Niels Bohr, em Copenhagen. Em Uppsala Maris propôs a investigação da chamada reação quase-livre próton - próton, na qual um próton incidente arranca um próton nuclear que se comporta como se fosse quase livre; essas reações (p,2p) são especialmente adequadas para investigar a estrutura de camadas dos núcleos, em particular as camadas internas. Além de propor os processos quase-livres e de interpretar e analisar teoricamente os resultados, Maris participou também ativamente das experiências propriamente ditas, adquirindo assim valiosa experiência para sua atividade subseqüente no Brasil.

Nesse trabalho inicial Maris já evidenciava seu modo original de pensar e sua alta capacidade em Física.

De Uppsala ele foi como Pesquisador Associado para a Universidade Estadual da Flórida, onde prosseguiu seus trabalhos na interpretação teórica de reações nucleares, particularmente no que tange à forma e aos parâmetros do potencial ótico a ser utilizado na análise de ondas distorcidas. Quando os físicos nucleares experimentais da Universidade Estadual da Flórida resolveram instalar um acelerador Tandem Van de Graaff, Maris decidiu afastar-se por um ano para escapar da balbúrdia causada no Departamento devido à construção da "grande" máquina.

E assim retornamos ao ponto interrompido acima, a saber, com a aceitação por Theo do convite do Reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul para iniciar a pesquisa no Instituto de Física.

Maris chegou a Porto Alegre inesperadamente. Embora soubéssemos, naturalmente, que ele estava por vir, esperávamos por algum tipo de mensagem antecipada. Deve-se observar que naquela época as conexões telefônicas com o Brasil eram difíceis e telegramas do exterior (via Western Union) demoravam um dia para chegar. Sem se dar conta dessas dificuldades, Theo telegrafou e tomou o avião com toda a família, chegando a Porto Alegre em 4 de outubro de 1959, à noite. Ninguém o estava esperando no aeroporto. Assim, a família tomou um táxi e foi passar a noite em um hotel de terceira categoria. Quando o telegrama chegou no dia seguinte uma procura frenética foi iniciada até ele ser encontrado (ainda dormindo profundamente, é óbvio). Ele foi acordado, transferido para um hotel melhor e começou imediatamente a trabalhar no Instituto. É claro que no estágio de desenvolvimento de então havia muito poucas pessoas que podiam colaborar com ele, e por isso ele referia a si mesmo ocasionalmente como "um cachorro inteiro para apenas algumas poucas pulgas".

Nos anos subseqüentes Theo desempenhou um papel crucial na criação daquilo que um administrador científico norte-americano denominou um dia "the nicest, most coherent Physics Institute in Latin America".

A Física Nuclear Teórica foi, naturalmente, a área inicial de pesquisa, e o primeiro artigo teórico apareceu já em 1960. Apenas três meses após a chegada de Theo foi organizado um encontro de físicos brasileiros de São Paulo e Rio no Instituto para discutir modos e meios de iniciar pesquisa também em Física Nuclear Experimental.

Uma proposta foi a de enviar estudantes interessados e promissores a São Paulo por um ano, para adquirir treinamento fundamental na área de espectroscopia nuclear. Theo apresentou uma contraproposta, qual seja: começar trabalho experimental aqui, e imediatamente, da seguinte maneira: em não mais do que seis meses reproduziríamos por nós mesmos em Porto Alegre a bem conhecida medida da correlação angular gama-gama em 60Co. Uma garrafa de champanha foi apostada com os colegas de São Paulo. Três meses depois, o grupo que iniciou o trabalho experimental conseguiu realizar a experiência usando uma mesa de correlação angular de madeira (!): tínhamos ganhado a champanha. Foi necessário muito mais tempo e esforço, naturalmente, para produzir o primeiro trabalho experimental (agora com uma mesa de aço, obviamente!), mas em 1963 ele veio à luz. No laboratório de correlação angular os teóricos colaboraram pondo a mão na massa e também deram apoio formulando novas abordagens para a compreensão do assunto.

O resumo histórico acima, além de revelar o entusiasmo com que todos trabalhavam juntos naqueles tempos pioneiros, indica ainda uma política fundamental que foi sempre seguida para criar rapidamente um centro de pesquisa de alto nível: concentrar os recursos humanos localmente tanto quanto possível. Theo costumava dizer que "para iniciar um fogo deve-se reunir as achas de lenha, não dispersá-las". Embora naturalmente muitos tenham saído para o exterior para obter seus doutorados, para estágios de pós-doutorado ou para realizar períodos mais curtos de treinamento, buscava-se, tanto quanto possível, desenvolver imediatamente programas de doutorado no Instituto, necessariamente em nível internacional.

Quando Theo chegou ele já estava se preparando para entrar em nova área de pesquisa, a Teoria Quântica de Campos. Logo ele estava orientando vários estudantes e colegas nessa área. Sua principal idéia era investigar simetrias espontaneamente quebradas na Eletrodinâmica Quântica e, especificamente, formular a teoria atribuindo massas de origem puramente eletromagnética ao elétron e ao múon e, portanto, iniciando com massas nuas nulas para essas partículas. A conseqüência óbvia dessa abordagem é que não existe escala de massa (ou comprimento) em tal formulação da Eletrodinâmica Quântica e só faz sentido calcular razões de massa para partículas com interação puramente eletromagnética. O problema da razão de massa elétron-múon permanece em aberto até hoje.

O envolvimento de Theo nessa nova área não impediu seu contínuo interesse em espalhamento quase-livre. A nova proposta para investigação das camadas nucleares internas através do espalhamento quase-livre elétron-próton, reações (e,e´p), foi feita ainda em 1962.

Ao mesmo tempo ele ajudou a promover a abertura de novas áreas de pesquisa em Física Teórica e Experimental no Instituto. Embora um fluxo de visitantes estrangeiros fosse essencial para isso, ele desempenhou freqüentemente um papel fundamental em termos de motivação e, especialmente, na condução de programas de estudo sob forma de seminários. Em cada sessão dos seminários era determinado um assunto para o encontro seguinte e o palestrante sorteado entre todos os participantes no início dele, prática que ocasionalmente gerava protestos devido ao trabalho duro que demandava de todos: um visitante estrangeiro que desejava participar como ouvinte até murmurou sombriamente sobre violação da liberdade acadêmica; de fato, essa era a forma favorita (e única!) de Theo ministrar aulas. Comentando um pouco o parêntesis anterior: enquanto o trabalho individual com estudantes recebia a atenção ilimitada de Theo, aulas formais não era sua modalidade preferida para ensinar Física. Além disso, qualquer forma de trabalho administrativo era sempre um fardo insuportável que ele definitivamente evitava. Entretanto, isso não deve ser interpretado como falta de interesse pelo desenvolvimento dos aspectos administrativos e políticos do Instituto como um todo. De fato, Theo dedicava muito de seu tempo fazendo o que ele chamava sua "contribuição à administração", a saber, convencer seus colegas de seus pontos de vista sobre as políticas de pesquisa a serem seguidas no desenvolvimento do Instituto, deixando a execução de eventuais medidas necessárias a outros. E essa forma de contribuição foi freqüentemente muito importante. Apenas um exemplo: ainda que ele não considerasse fazer senão Física Básica, ele sempre defendia que no Instituto deveria haver pessoas dedicadas à Física Aplicada. Citando uma de suas recentes declarações: "Afortunadamente, em Física (e, em geral, na maior parte das ciências) temos a situação de que nossa compreensão da natureza pode ser útil para melhorar o padrão de vida da comunidade em geral. Essa possibilidade de aplicar a Física é a justificativa para o trabalho em Física Fundamental feito atualmente por muitos cientistas em escala avultada e enormemente dispendiosa. Ter atividades em Física Aplicada é, portanto, em minha opinião, interessante não apenas por si mesmo e para a comunidade como um todo, mas é também condição necessária para a própria existência da moderna Física Fundamental. Portanto a Física Aplicada deveria ser apoiada pelos pesquisadores em todos os campos da Física".

Como deve estar claro a essa altura, a visita de um ano de Theo e Wiltrud transformou-se gradualmente em uma estada permanente, exceto por uns poucos interlúdios de um ano no exterior. Eles tiveram uma segunda geração de filhos nascidos em Porto Alegre: Christian, Angelica e Sylvia. Como as duas irmãs mais velhas (alemãs) já estavam chegando à adolescência na época e, portanto, eram capazes de cuidar de seu irmão e irmãs menores (brasileiros), Wiltrud e Theo costumavam dizer: "Temos a sorte de possuir baby sitters embutidas em nossa família".

Uma série de três ofertas de cátedras (Rufe) em Universidades alemãs ameaçaram repetidamente a permanência de Theo no Brasil, mas, presumivelmente, seu sucesso em estabelecer um novo Instituto de pesquisa parecia-lhe mais atraente do que trabalhar em um país desenvolvido. Ele achava que pessoas competentes podiam desempenhar um papel muito mais importante num país em desenvolvimento, onde elas não seriam apenas "mais uma engrenagem na máquina". Seu relativamente gradual comprometimento com uma estada permanente no Brasil pode ajudar a explicar porque ele ainda não fala português muito bem; outra pista para esse mistério provém do fato de que em holandês seu sotaque é alemão, em alemão é holandês e em inglês ele possui ambos, alemão e holandês!

Um indicativo do sucesso de Theo como diretor de pesquisa é o fato de que, dez anos após sua chegada, a lista de publicações do Instituto abrangia cerca de 70 artigos, quase metade deles com seu nome. Evidência para o reconhecimento internacional de seu trabalho científico é o resultado de um levantamento realizado pelo Institute for Scientific Information (Londres). De acordo com aquele levantamento, cobrindo o período 1973-1978, o artigo de Física do Terceiro Mundo mais citado no Primeiro Mundo foi "Quasi-Free Scattering and Nuclear Structure, em Reviews of Modern Physics [vol. 38 (1966) p.121].

Em 1986 Theo tornou-se cidadão brasileiro e membro titular da Academia Brasileira de Ciências.

Em 1990, após sua aposentadoria, a Universidade concedeu-lhe o título de Professor Emérito. Mesmo assim, Theo ainda está trabalhando regularmente no Instituto, prosseguindo com sua nova formulação da Eletrodinâmica Quântica e orientando estudantes pós-graduados, detentor agora de uma bolsa sênior do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Através da Festschrift (referência ) seus amigos, colegas, antigos estudantes e colaboradores desejam expressar sua admiração por sua inquebrantável dedicação à Física e sua gratidão pelo privilégio de ter compartilhado de parte dela.

Topo da página

Breve Histórico do Instituto de Física

C.A. dos Santos
Publicado no Spin n. 169, 4-11/3/1994.

O Instituto de Física da UFRGS, fundado em 1953 como Centro de Pesquisas Física e adotando em 1959 a atual denominação, tem, através de seus cursos de graduação e de pós-graduação, dedicado grande parte de seus esforços ao desenvolvimento de pesquisa científica e à formação de profissionais e especialistas de reconhecido bom nível.

Com 78 professores e 115 alunos de pós-graduação, o IF-UFRGS publica anualmente mais de uma centena de artigos em revistas internacionais.

Com conceitos A atribuídos pela CAPES aos seus cursos de Mestrado e de Doutorado, o IF-UFRGS é considerado um centro de excelência nacional.

Desde a sua criação o IF-UFRGS vem se dedicando a assuntos de ponta. Inicialmente concentrados na área de Física Nuclear, logo depois os interesses foram se diversificando em sub-áreas de Física da Matéria Condensada, e ultimamente tem-se observado uma tendência cada vez maior para a abordagem de problemas com motivações tecnológicas. Assim, sem abandonar sua vocação para a pesquisa básica, o IF-UFRGS vem paulatinamente se capacitando para o exercício profissional na interface entre ciência e tecnologia.

Para o bom desempenho das suas funções, o IF-UFRGS conta hoje com uma estrutura das melhores no país. A biblioteca é considerada a segunda em acervo na área, sendo reconhecidamente uma das mais bem estruturadas. Para a área experimental dispõe-se dos seguintes laboratórios: altas pressões, astrofísica, difratometria de raios X, espectroscopia Mössbauer, filmes finos, implantação iônica, materiais magnéticos, microeletrônica, ótica e espectroscopia laser e radiação.

Os serviços de apoio técnico (mecanografia e oficinas de eletrônica, mecânica, vácuo e vidraria) são de excelente qualidade.

As facilidades computacionais nos coloca, dentro do país, como uma das mais bem servidas instituições de ensino e pesquisa. Além do acesso ao supercomputador CRAY II, que é usado não apenas pela UFRGS, mas por várias outras universidades brasileiras, dispõe-se aqui no IF-UFRGS de uma rede de estações de trabalho, do super minicomputador VAX 4000/300 e de inúmeros microcomputadores 286, 386 e 486. A propósito, o IF-UFRGS tem reconhecida tradição em informática, sendo considerado o berço da indústria dessa área no Rio Grande do Sul.

Topo da página

Mapa do site Site do IF-UFRGS Editor do site IF 45 Anos ©2004 Instituto de Física - UFRGS



Made with 1st Page 2000 - Professional tools for real minds.